capítulo do livro "Nos Tempos do Bar Rex"
de Antonio da Cunha Penna
Uma das formações do Guaianazes Clube, a primeira agremiação indaiatubana de basquete e vôlei.
Em pé: (?), Joab José Pucinelli, Luiz Augusto A. Mello, Clóvis Civolani e Romeu Zerbini.
Agachados: Alberto Ernesto G. Pucci, Synésio Martini e José de Campos.
O prédio que, entre outras destinações, fora também sede do E. C. Primavera abrigaria (como Bar Rex) a sede do Guaianazes Clube que, no período de sua fundação (1948), usava o endereço do Bar e Hotel Candelária. O novo bar com freguesia constituída quase que exclusivamente de jovens, afinava-se mais com o recém-fundado clube.
Para contar a história dessa interessante agremiação, cito palavras do médico e cronista indaiatubano Edgard Steffen, um dos fundadores do Guaianazes:
(...) Indaiatuba era pequena. Minúscula. Nenhuma diversão, além do futebol e das festas familiares. Raramente um baile com o “Bando da Lua” de Hermenegildo Pinto (Gildo) no Salão do Mome, ali na Candelária. Com a construção do salão do Indaiá Clube pelo Luiz D’Ercoli, atrás do Bar de seu irmão Olívio, a situação melhorou um pouco. Passamos a ter um baile, mensal, entrada paga, sempre animado pelo conjunto do Gildo Pinto. Raramente, alguma orquestra de outra cidade. Nas férias, algumas domingueiras com rádio-vitrola.
Nosso grupo de adolescentes, como todo bando, reunia-se num dos bares em torno de garrafa de refrigerantes do tipo Tubaína e Maçãzinha, bebidas ainda não sufocadas pelas importadas “Colas”. Cerveja, “casco verde”, somente após os dezoito de idade. Éramos de profissões variadas. Barbeiro (Clovis Civolani), lojista (Chaim Miguel Ferreira), marceneiro (Olívio “Russo” Silvério), operário (José Baroni), escriturário (Geraldo Baptista), bancário (Antônio Reginaldo Geiss), comerciante (Lino Martinuzzo). Eu, o único estudante. Liguto (Luis Augusto do Amaral Mello), à época, não estudava nem trabalhava. Nas férias, Odilon Ferreira (trabalhava e estudava) e José Emygdio “Zito” Zoppi (universitário de Engenharia em São Paulo) e outros jovens, parentes de famílias indaiatubanas, juntavam-se ao grupo.
Além da idade, talvez andássemos juntos por falta de vocação futebolística. O Geiss, mesmo sem grandes habilidades futebolísticas, participava também do grupo dos craques do Primavera, como o alfaiate Lula (João Rubens Guidolin), o bancário José Maria “Nego” Delboni, o office boy da Caixa Econômica Estadual Laércio Milani. Frequentavam os mesmos bailes que a gente, mas pertenciam à elite futebolística, graças ao E.C. Primavera, celeiro de craques. (...)
Quando começaram a falar num clube de voleibol e bola-ao-cesto, entramos com corações e mentes no projeto. Não sei bem quem começou. Lembro-me de minha irmã Lucia, diploma universitário em Educação Física, tentando formar um time feminino de vôlei, numa improvisada quadra no próprio campo do Primavera. Outro, foi o Zito Zoppi que, nas férias incentivava o pessoal a fundar um clube. Certamente o alfaiate João Nunes Beccari, meu irmão Oscar Steffen e Mario Candello estavam envolvidos no projeto. “Seu” Nunes e Oscar haviam participado do Bandeirantes, time de basquete que existiu durante certo tempo em nossa cidade. A cor azul e branca escolhida para uniforme do Guaianazes deve ter sido memória-saudade do antigo Bandeirantes.
Lembro-me de termos organizado um baile, no Salão do Mome na Rua Candelária, animado pelo Bando da Lua, em prol da fundação do Clube. Também do Livro de Ouro. Saímos com ele à cata de doadores. A maioria dos abordados não apostava na viabilização de um clube de voleibol e bola-ao-cesto em nossa cidade. Outra lembrança: gente que nós dávamos como certo a contribuição, negar; em compensação, outras pessoas que abordávamos quase por obrigação (pré-julgávamos a negativa) assinaram o Livro de Ouro e contribuíam com satisfação. (...)
Nos anos quarenta foi uma luta para localizar terreno apropriado para nossa quadra de basquete. O comerciante Eduardo Ferreira (pai do Chaim e do Odilon) chegou a nos oferecer dois locais: um descartado pela localização (Bairro Santa Cruz) e outro, bem urbano, ao lado da capela de Santo Antônio, era menor que o necessário. Já nem me lembro quem conseguiu que a Prefeitura permitisse o uso do quintal da antiga sede do grupo escolar Randolpho Moreira Fernandes, ao lado esquerdo da Matriz, à época transformado em sede da Banda e depósito da Prefeitura. Houve uma exigência: o prefeito exigiu que se pusesse placa “Quadra de Esportes Prefeito Jacob Lyra”*.
Quebrou bem o galho. Deu até para construção de pequeno vestiário. Os dois times, tanto os locais como os visitantes, usavam o mesmo vestiário. Nunca houve uma briga ou discussão. Enchia-nos de satisfação achar que vôlei e basquete eram esportes de gente civilizada. Hoje, sei que a esportividade e a civilização não se prendiam àqueles esportes, mas àqueles anos em que a violência não fazia parte de nossas vidas.
Certa noite, nosso grupo foi à Redação do “O Indaiatubano”, na Rua Pedro de Toledo. Já não me lembro se para inserção de notícia sobre o projeto de fundação do Clube ou para pedir ao Athayde Puccinelli que assinasse contribuição no Livro de Ouro. No caminho íamos discutindo o nome a ser dado à agremiação. Ouve quem sugerisse Kalistenio (?) Cestobol Clube, Esporte Clube Indaiatubano, entre outros. Não agradou a ninguém. Durante o encontro com o jornalista, alguém mencionou a falta de nome. — Por que vocês não o chamam Guaianazes? Por quê?, retrucamos — Porque os guaianazes eram grandes guerreiros, pontificou Athayde. Não creio que ainda existam atas da sua fundação, mas, nessa noite, nasceu o nome oficial do Guaianazes Clube. (...)
A falta de documentos obriga-nos a revolver o recôndito de nossa memória para contar, com falhas e imperfeições e até injustiças (por nomes e trabalhos omitidos) do Guaianazes de curta vida e saudosa memória. Quem se dedicou com afinco a treinar e disciplinar aqueles jovens estouvados atletas de amadorismo quase infantil, foi o saudoso João Nunes Beccari. Quantas vezes deixou sua alfaiataria da Rua Candelária para treinar e orientar os jovens aspirantes a cestobolistas. Também muito importante a participação, em período menor, de um jovem alto que vinha passar temporadas em casa de sua família na esquina da Cerqueira César com o Largo das Caneleiras. Silvio Montanarini era homônimo de seu tio que jogava no Floresta e na seleção brasileira de basquete. Durante algum tempo, Montanarini nos ensinou fundamentos de basquetebol moderno: arremesso (bola partindo do tórax), passe (quicado no solo para dificultar a interceptação), drible (apontar para um lado, rodar e sair pelo oposto), além de posições, rebotes e corta-luz.
Foi Montanarini que trouxe seu tio e outros craques do Floresta e da seleção brasileira (Massenet, Alexandre, Eugênio) para reforçar o Guaianazes em jogo contra a Associação Atlética Ituana. Começamos jogando e, para variar, perdendo para o bom five ituano. Tivemos a honra de sermos substituídos por craques que haviam alcançado a medalha de bronze nas Olimpíadas de Londres (1948).
Carpe diem. Tempus fugit. Gozem os dias. O tempo foge - reza a máxima latina. Adolescentes amigos, na pequenina terra dos Indaiás, pudemos curtir cada dia de nossa juventude. O Guaianazes foi um dos instrumentos. (...)
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* Quando o Ginásio Municipal de Esportes foi inaugurado (década de 1980), recebeu o nome de Ginásio de Esportes Dr. Clain Ferrari, assim que foi possível alterado para Ginásio de Esportes Indaiatuba. Na época andei sugerindo que fosse rebatizado como Ginásio de Esportes Guaianazes, em homenagem à extinta agremiação. Guaianazes reapareceria mais tarde como nome da companhia que faz o nosso transporte público, porém sem reportar à agremiação. (Nota do autor)