"Ciganos" - obra de George Morland - óleo sobre tela - 36 x 47 cm - 1800 -
(The Hermitage (St. Petersburg, Russia)
"Cigana com filho" - obra de Amedeo Modigliani - óleo sobre tela - 116 x 73 cm - 1918 -
(Galeria Nacional de Art, Washington, EUA)
"A Cigana Adormecida" - obra de Henri Rousseau- óleo sobre tela - 129,5 x 200,7 cm - 1897
(Museu de Arte Moderna, Nova York, EUA)
A
historiografia considera – pelo menos essa é, até agora - a fonte mais antiga
encontrada - que os primeiros ciganos chegaram no Brasil em 1574 quando João Torres, sua
mulher e filhos foram degredados para o nosso país.[1]
Desde então, as relações entre esses ciganos e os demais membros da sociedade,
por terem se diferenciado bastante, no tempo e no espaço, não foram tranquilas[2] e a
presença deles, substancialmente até o fim do século XIX e início do século XX,
incomodava por demais as autoridades, como aconteceu na Indaiatuba do Major Alfredo Camargo Fonseca, do
Tenente José Tacnlér-Tancredi e do Boticário Chiquinho.
Sendo ágrafos, a história dos ciganos ficou registrada,
em grande parte, pelas autoridades policiais que os categorizavam como
‘perturbadores da ordem’ ou por memorialistas e escritores literatos, que na
maior parte das vezes os descreveram com filtros subjetivos de juízos de valor,
como sujos, trapaceiros, ladrões ou então elementos incivilizáveis, inúteis à
sociedade, supersticiosos, corruptores dos costumes, vândalos, enfim, uma
anomalia social e racial[3].
Perseguida, essa etnia estigmatizada foi massacrada na II Guerra Mundial ao
lado de muitos homossexuais, negros, deficientes e judeus.
Após a Proclamação da
Independência, as elites brasileiras que "pretenderam estabelecer um reordenamento físico das cidades, higienizar
as vias públicas e excluir dos centros urbanos todos os indivíduos que não se
adequaram à nova ordem"[4],
passam a intensificar a repressão a populações marginalizadas como a dos
ciganos, que no entender desse novo caráter nacional em formação, era uma
ameaça ao “processo civilizatório”. Nesse período, as diligências policiais
feitas nos encalços dos ciganos resultavam em sangrentos confrontos.[5]
O confronto registrado em Indaiatuba
nesse ano de 1896 não fugiu à regra. Vários jornais da Província de São Paulo
narraram a “invasão dos ciganos que infestaram vários locais no interior do
estado”, gerando grande movimento de tropas e importantes diligências feitas
pelo D. Xavier de Toledo afim de acabar com as maltas de ciganos.
As autoridades de Indaiatuba e Campinas pediram
reforço policial à polícia da província “a fim de evitar o saque que estava
iminente por aquela terrível gente”. Consta que a força pedida pela autoridade
de Indaiatuba, “chegando àquela vila, conseguiram pôr em debanda um grupo de
ciganos, que portavam carabinas winchester”. Mas não sem antes travar-se um tiroteio entre
as forças comandas pelo alferes Aymoré e seus 30 comandados e o grupo de
ciganos[6],
calculado em 400 pessoas que haviam vindo de Itu onde já haviam amedrontado a
população”[7],
(outra fonte informa que eram 50 ciganos[8])
entre homens mulheres e crianças, estando a maior parte montadas em ‘magníficos
cavalos’. As forças armadas da Província perseguiram
...
os malfeitores... foram os menos ágeis presos por um sargento do destacamento
de Indaiatuba, estando no meio deles um velho em cujo poder foi encontrada a
quantia de 800$. Quantia esta que lhe foi entregue pelo Dr. Chefe de Polícia,
depois de ter provado que lhe pertencia aquele dinheiro. [9]
O delegado de polícia de Campinas também recebeu força do 1º batalhão da
Província de São Paulo, que reunida à força local, formou um contingente
aproximadamente de oitenta homens, que conseguiu capturar os ciganos fugidos de
Indaiatuba, “arrecadando” deles, seis cavalos.
Bom, não é necessário ser um
especialista em linguística ou um expert em interpretação de textos para ver o
que as fontes dizem: por ser um grupo previamente estigmatizado, foram
recebidos à bala, os mais velhos e frágeis foram capturados, seus pertences apreendidos
(e depois vergonhosamente devolvidos) e seus cavalos tomados. Não consta nas
fontes nenhum tipo de reação violenta por parte das vítimas.
Esta história de discriminação
não chegou ao seu final. Os grupos ciganos ainda são pouco conhecidos e acabam
negligenciados pelos governos dos territórios onde vivem[11].
[1] COELHO. F. A., Os
ciganos de Portugal. Lisboa, Dom Quixote, 1995. (Original: 1892).
[2] TEIXEIRA. Rodrigo Corrêa. A História dos Ciganos no Brasil – Núcleo de Estudos Ciganos,
Recife, 2008. Disponível em http://www.dhnet.org.br/direitos/sos/ciganos/a_pdf/rct_historiaciganosbrasil2008.pdf (Original como tese de mestrado na Universidade
Federal de Minas Gerais).
[3]TEIXEIRA (2008).
[4] FRAGA F. Walter. Mendigos,
moleques e vadios na Bahia do século XIX, São Paulo, HUCITEC; Salvador,
EDUFBA, 1996.
[5] TEIXEIRA (2008).
[6] Jornal O
Commércio de São Paulo de 19 de dezembro de 1896 - Hemeroteca da Biblioteca Nacional.
[7] Jornal Minas
Geraes – 22 de dezembro de 1896 -
Hemeroteca da Biblioteca Nacional.
[8] Jornal O
Commércio de São Paulo de 19 de dezembro de 1896 - Hemeroteca da Biblioteca Nacional.
[9] Jornal Gazeta
da Tarde, 27 de dezembro de 1896 - Hemeroteca da Biblioteca Nacional.
[11] Difusão da história e
cultura ciganas é arma na luta contra o preconceito, Texto publicado em “Sociedade”, USPonline, por Gabriela Malta Felix em 2 de dezembro de 2013.
Esta e outras histórias de Indaiatuba você encontra no livro abaixo:
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