quinta-feira, 9 de fevereiro de 2023

HISTÓRIA DA ARQUITETURA POPULAR DE INDAIATUBA


Um passeio pela arquitetura tradicional indaiatubana e a busca pelas referências utilizadas, do vernacular paulista ao início do modernismo.


Chamamos de ARQUITETURA VERNACULAR, a produção que caracteriza uma região ou local, através das condições sócio-econômicas disponíveis, como matéria prima, técnicas de construção e até mesmo cultura.  Podemos dizer que nossa arquitetura indaiatubana, utilizada na criação do povoado de Cocais, cujo marco mais importante é a construção da Matriz da Candelária em 1838, reflete o Vernáculo do interior paulista. Pouquíssimos produtos ou matérias primas disponíveis, senão as que o local fornecia; poucas ferramentas disponíveis senão as que podiam ser transportadas em lombo de burro, desde Santos, até Itú, através do Caminho do Lorena, e de Itú para Indaituba através das trilhas que chegavam na região do Burú.  O que aqui abundava eram o barro e a madeira, o que aqui se possuía eram poucas ferramentas de corte, e essa carência de recursos acaba por ser representada na singela arquitetura local, que ainda pode ser observada na parte mais antiga do Casarão Pau Preto, que representa nossa mais fiel arquitetura vernacular e que reflete a tenacidade do indaiatubano em constituir um povoado.

 




Imagens: Sede da Fazenda Pau Preto e Igreja da Candelária de Indaiatuba, exemplares de arquitetura em Taipa.


Com o surgimento de uma economia mais estruturada, ainda que agrícola, e a independência administrativa da cidade, veio a necessidade de demonstrar este progresso, através de edifícios mais elaborados. No séc. XIX e no início do séc.  XX, haviam pouquíssimas publicações especializadas em arquitetura, todas importadas, e a linguagem dos prédios era reproduzida através de projetos de profissionais que viajavam para a Europa e voltavam com suas impressões; ou de prédios que eram implantados, pelo governo, igreja ou por produtores locais, para atender a funções de uma cidade em estruturação, ou receber equipamentos importados como o caso da Tulha do Casarão Pau Preto, cujos detalhes construtivos acabavam por servir de referência para a produção local de pequenas edificações e passam a dar formato a nova cidade em desenvolvimento.

Para esta arquitetura e época em especial, não é correto usar a expressão “Copiar” ou “Cópia”, pois toda a arte do Século XIX e início do XX, chamada de ecletismo, adota “referências” e cria composições através do uso dos elementos históricos de culturas ancestrais como a grega, romana, gótica ou bizantina. Portanto é mais apropriado e nada pejorativo, dizer que determinados prédios foram “referência” para o projeto de determinada obra. Este processo criativo foi rompido apenas com o aparecimento do modernismo, no Brasil, a partir de meados do século XX.

Podemos indicar que alguns prédios foram de enorme referência para nossa produção local, e que apareceram na cidade vernacular colonial, imperial, limpa e austera, como que alienígenas com formas arrojadas e adornos que representavam a modernidade e a tecnologia de um novo tempo.  A Casa de Câmara e Cadeia, os túmulos ecléticos dos familiares de D. Leonor Barros de Camargo no cemitério de Taipas, a estação ferroviária ou a Tulha do Casarão Pau Preto, são algumas das produções "importadas" na cidade e que acabaram por adicionar elementos europeus na arquitetura vernacular de Indaiatuba.

Casa de Câmara e Cadeia -  1888


 Casa de Câmara e Cadeia -  1888


Túmulo de uma tia de D. Leonor da Barros Camargo (do HAOC -  1889 – Cemitério de Taipas



 Tuia do Casarão Pau Preto



 Tuia do Casarão Pau Preto



Tuia do Casarão Pau Preto


Estação Ferroviária de Indaiatuba - inaugurada em 1880

Estas importantes construções foram inspiração para muitos construtores locais que passam a aplicar em seus edifícios elementos deste novo repertório à disposição, e que representam, nesta época, a modernidade, progresso e prosperidade, em resumo - STATUS.


 


Neste conjunto edificado junto a Praça Rui Barbosa, antigo Largo das Caneleiras, pode-se observar detalhes em alvenaria que tiveram como referência o entalhamento estilizado e Alvenaria Inglesa da Tulha do Casarão Pau Preto.







Neste último exemplar, é curioso ressaltar a utilização do “porão” que é um espaço livre, perdido e ventilado através de aberturas, entre o solo e o piso do pavimento térreo, que elevava a edificação do solo da cidade e que foi obrigatório, depois da epidemia de febra amarela do final do século XIX até a descoberta do mosquito como causa da doença. Durante este período era constatado que áreas mais úmidas tinham mais incidência de febra amarela, e a medida era paliativa. Posteriormente, com novas legislações higienistas, no início do sec. XIX, feitas para combater a tuberculose e a febre amarela, acabaram por ser proibidas as alcovas, que eram cômodos sem janelas típicos do vernáculo paulista, chamados também de quartos de meninas. Foram instituídos os recuos frontais, laterais e de fundos em edificações para proporcionar espaços mais ventilados, e muitas construções passam a serem deslocadas do alinhamento do passeio público mudando com isso o aspecto da cidade. 

Com a chegada do Modernismo na cidade, com o prédio do Correio de 1940 e posteriormente com a Prefeitura Municipal (ambos em projetos não puramente modernistas), a arquitetura popular seguiu tomando alguns de seus ícones como referência, mesmo sendo esta prática uma das oposições do movimento modernista, constituindo um paradoxo curioso. Levou ainda algum tempo até que obras que se baseiam em espaço contínuo, abstração e racionalismo pudessem romper a cultura provinciana do início do séc. XX e produzir obras realmente modernistas na cidade, mas isso já é outra história.

 

Prédio da Prefeitura Municipal



Prédio do Correio



O curioso paradoxo de algumas construções populares na cidade, que utilizam elementos presentes em um prédio modernista, para “COMPOR” sua fachada, indicando que algumas práticas demoram muito tempo para serem superadas, e algumas jamais serão.

 Platibanda da Prefeitura, considerado um prédio modernista, reproduzida em prédio da época.

 



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