domingo, 23 de setembro de 2012

O Crime do Poço - Capítulo 11

Foi assim que, no dia seguinte, terça-feira dia 10 de dezembro (1) , o conhecido Leonardo Simione embarcou para Itu com a recomendação e o dinheiro suficiente para telegrafar toda e qualquer novidade das estações onde parasse, “uma à uma”, isto até Piracicaba. Chegando a Indaiatuba, apressou-se a comunicar que Domenico não estava ali, e assim por diante, até chegar a Piracicaba.

Modesto lia, com o coração apertado, cada notícia que chegava, mantendo-se praticamente o dia todo indo e vindo com as mensagens na mão a fim de manter Dona Vincenza informada. Pode-se imaginar qual foi a intensidade do choque quando, naquela início de noite, recebeu o último telegrama de Leonardo, que dizia:


Modesto,
Em Piracicaba, ninguém tem notícias de Domenico.
Ele não se encontra aqui.
Leonardo Simione

Com aquelas poucas letras, terminava a ilusão...

A ilusão de que o filho, ocupado demais com os negócios, tivesse deixado de escrever.

As imagens do sonho voltavam mais forte na sua memória, ilustrando o coração atormentado, alimentando a aflita sensação de tristeza.

Uma casa em Indaiatuba...

Não agüentava mais tamanho tormento: pegaria o primeiro trem que saísse para Piracicaba decidido a encontrar o filho, fosse como fosse.

E assim foi que, no primeiro trem que saiu da estação do Brás, rumou para Piracicaba Modesto De Luca, naquela quarta-feira, 11 de dezembro de 1907.






Estação do Brás, sem data.
Foto cedida por Wanderley Duck para o site www.estacoesferroviarias.com.br


As poucas horas que o trem demorou a chegar a Piracicaba, pareceram um século ao pobre Modesto, cheio de tristes presságios. Na estação de ferroviária, encontrou a esperá-lo o Leonardo Simione e juntos foram ao Hotel Bela Vista, onde Domenico deveria estar hospedado. A dona do hotel não teve dúvida em contar-lhe que a última vez que tinha visto o menino, fora no dia de sua chegada de São Paulo e que de lá, depois de lida uma carta procedente de Indaiatuba, o filho tinha seguido para aquela cidade, a fim de acertar um negócio.

Ao ouvir “...uma carta procedente de Indaiatuba...” seu coração gelou. Teve a impressão de que sua consciência o abandonara, “apagando” todas as suas sensações e aniquilando sua capacidade de pensamento lógico. Retornou daquele estado de temporária ausência com a freqüência cardíaca alterada e com a sensação de perigo iminente.

Lembrou dos detalhes daquela maldita casa descrita por Vincenza, que falava do sonho como se estivesse de fronte a uma gravura concreta e palpável. Sinais transformavam-se em certezas. Sentia náuseas.

Uma casa em Indaiatuba...

Mas mesmo assim a certeza não estava totalmente confirmada, pois eu seu coração de pai havia ainda uma esperança... Ele tinha que confirmar o que parecia óbvio... Talvez tivesse ainda alguma possibilidade. A vida concreta descortinava a perda, a incerteza; mas sua vontade, movida pelo amor de pai, negava o que a realidade insistia em mostrar... Afinal... Havia ainda aquele seu amigo, o Atílio Colli...

Ele havia escrito que o filho estava bem em Piracicaba.

Devia ir até a casa dele, porque talvez o filho lá se encontrasse e seu transtorno teria fim. Mas foi inutilmente; ali também o filho não estava, como também o Colli, que naqueles dias tinha viajado para São Paulo e a mulher dele nada sabia.

Só restava ir à polícia e denunciar o desaparecimento. O delegado de Piracicaba o recebeu com gentileza e prometeu que tudo faria para ajudá-lo; disse também que providenciaria a prisão de Colli, o qual tinha lhe remetido uma falsa notícia. Também se comunicaria com os delegados das cidades vizinhas a fim de procurar o jovem desaparecido.

Nessa altura, Modesto estava exaurido. Sua esperança, já tão tênue, esvaia-se a cada minuto, por mais que ele tentasse agarrá-la. Mas não tinha mais argumentos, nada mais sustentava a tendência de seu espírito para considerar como provável a realização do que mais ele desejava: encontrar o filho bem.

A casa em Indaiatuba...

As informações relativas ao pesadelo de Vincenza insistiam em atormentá-lo. De algum lugar escondido de sua mente vinha a certeza de que tudo aquilo continha uma alta dose de realidade. A certeza de que tudo era uma premonição crescia em seu coração. Ele não podia mais conter uma a certeza de que encontraria o filho morto na cidade de Indaiatuba, assim como revelara aquele sonho terrível.

Enquanto isso em Indaiatuba, os amigos chegavam de São Paulo com suas compras. Em seu depoimento, Giovane Brentam, 40 anos, italiano, negociante, disse que fora naquela tarde comprar açúcar e, no momento em que o sino da matriz Nossa Senhora da Candelária marcava seis horas da tarde, passou na barbearia de Antônio, quanto esse lhe contou com ostentação o quanto ele havia gasto em São Paulo, “... e Adão também”. Disse também, em juízo , que conhecia Antônio e Adão há muito tempo, jogava cartas com eles, mas como só perdia dinheiro, estava tentando deixar o hábito. Já de Eugênio, declarou não ser amigo, pois "...ele é vagabundo e não paga as contas.” E que naquela mesma noite, por volta das sete horas iniciaram-se várias rodadas de carteado na venda de Adão, aberta exclusivamente para eles. Estavam lá: Adão, Antônio N., Eugênio C., Luiz Guimarães, Vicente Gaudini e ele, Giovane. Que os últimos perderam muito dinheiro, pois se deixaram seduzir pelas altas apostas chamadas pelos três primeiros, que estavam com muito dinheiro, quantia que, mais tarde, veio saber que havia sido retirada do menino Domenico em abominável latrocínio.

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[1]  As informações deste capítulo são advindas da Tribuna de Indaiá de 1º de janeiro de 1961 e dos autos do processo.


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