sexta-feira, 5 de agosto de 2022

Sacy Indaiá

Texto de Maria Luisa da Costa Villanova
Historiadora pós-graduada em arqueologia

22 de agosto - sabe que dia é este? É o dia do folclore, aliás, agosto é, ou já foi, o mês do folclore, mas apesar de algumas escolas ainda comemorarem, nossos mitos brasileiros estão sendo esquecidos, ou até, digamos, substituído por folclores de outros países.

Folclore é o conjunto de manifestações da cultura popular que são típicas de um determinado povo, simboliza e apresenta grande importância na identidade deste povo, de uma nação. 

A palavra tem origem no inglês, em que "folklore" significa sabedoria popular. A palavra é formada pela junção de folk (povo) e lore (sabedoria ou conhecimento).

Extremamente rico, nosso folclore possui influências da cultura europeia, africana e indígena, um resultado da diversidade cultural existente no Brasil.

O folclore brasileiro só ganhou força no Brasil a partir do século XX, mas as pesquisas remontam ao século XIX. Isso foi possível graças à influência do Romantismo, corrente artística e literária que teve grande importância no Brasil. Essa corrente esteve associada com movimentos nacionalistas e procurava ressaltar elementos da cultura nacional.


Essa ideia foi reforçada com o Modernismo, corrente artística e literária que esteve em evidência, no Brasil, no começo do século XX. O movimento modernista tinha ideais ufanistas (nacionalismo exagerado) e idealizava o interior do Brasil como local da verdadeira brasilidade.

 

O estudo do folclore passou a ser visto como uma forma de valorizar a cultura nacional. Autores como Amadeu Amaral, Silvio Romero, Mario de Andrade, Arthur Ramos e Monteiro Lobato, ganharam notoriedade nesse campo de conhecimento.

 

Com origem oral, passada de geração para geração, cada figura passou por transformações, mudanças, “atualizações” e continua se transformando.


Como anda seu conhecimento sobre folclore brasileiro? Vamos fazer um teste rápido: pense em cinco personagens do nosso folclore.

Pensou?

Mula sem cabeça, boitatá (do tupi-guarani (mbói = cobra,| tatá = fogo), curupira (com os pés virados para trás), saci pererê, caipora (do tupi-guarani caapora, que significa "habitante do mato"), Iara ou Uiara ("senhora das águas", na língua tupi-guarani), boto cor de rosa, acredito sejam as mais conhecidas, mas vamos tomar cuidado, o lobisomem, o ser que foi amaldiçoado com a licantropia (ato de transformar-se em lobo em noite de lua cheia) por exemplo, conhecido no mundo todo, foi trazido para o Brasil.

Acredito que de todos os personagens do nosso folclore, o mais conhecido mesmo seja o saci, o menino de uma perna só, que também possui influência indígena, seu nome vem do tupi-guarani Yaci-Yaterê, porém, por ser negro e ter perdido a perna numa luta de capoeira, pode ter também origem africana, já a carapuça e o cachimbo, fazem parte dos mitos europeus.

Pelo que estudei, ele era retratado como um pequeno curumim endiabrado que tinha duas pernas, tez morena e um rabo típico dos demoniozinhos. Através da influência da mitologia africana, o Saci se transformou, como os negros lutavam capoeira, o Saci passou a ser retratado como um negrinho que ao lutar perdeu uma perna. Da mesma influência afro, veio o seu cachimbo, denominado pito pelos nossos negros, e herdou dos europeus o gorro vermelho. Não esqueçamos que ele é um profundo conhecedor de plantas e ervas medicinais. Controla e guarda os segredos do feitio e da aplicabilidade de todas as plantas e ervas da floresta.

Os Sacis nascem em brotos de bambu, lá onde cantam os ventos. Ali eles vivem por sete anos até aprenderem a fazer redemoinhos, vivem por mais setenta e sete anos a fim de atentar a vida das pessoas e dos bichos.

Depois de todo esse tempo de diversão eles morrem e viram uns cogumelos venenosos para mais uma vez "passarem a perna" nas pessoas que, por acaso, se atreverem a comer os cogumelos.

 

Por isso, fiquei muito feliz quando fiquei sabendo de um “sacyólogo” chamado Rudá K. Andrade, pesquisador de sacys e codiretor do documentário Somos todos sacys.

“Pois o Pererê é fruto da mesma árvore que alimenta as aventuras mais emocionantes do homem: a imaginação, mãe das magias, santa criatividade que ilumina nossa travessia. Banhado pela força das águas em queda, o sacy é a manifestação cósmica de nossa fantasia. Cachoeira de quimeras que nutre a alma” Rudá K. Andrade (sacyólogo)

Isso, sacy com Y (que parece mesmo um sacysinho).  Sacy é uma palavra de origem tupy-guarany “çaa cy” ou “olho de mãe”

Foram catalogados pelo ‘Centro de Estudos da Irmandade dos Sacys Livres’, com descobertas e teorias sobre a diversidade sacysística, 77 sacys, além do conhecido Sacy pererê, reconhecido em todo sudoeste brasileiro, existe o Sacy uai sô de Minas Gerais, o Sacy lombola das Regiões Nordeste e Sudeste, o Sacy lítico encontrados na Serra da Capivara (PI), Minas, Bahia, Paraíba e Mato Grosso, Sacy siriri do Pantanal (MT), Sacy frevi de Olinda (PE), o Sacy mi do Bairro da Liberdade na capital Paulista, mas também encontrado no interior de São Paulo, entre outros.

Sendo ou não um sacyólogo, a verdade é que nesse mundo atual com tantos falsos mitos, cultivar os verdadeiros é muito bom, e o Saci com seu redemoinho, tem espalhado brincadeira, espiritualidade, despertado consciências, identificação e reconhecimento em todas as regiões do Brasil e até pelo mundo afora. Fiquei pensando se também já não existiu (ou existe) o Sacy indaiá, que se alimentaria com pipocas e indaiás, mas aí apareceu o problema, onde eles encontrariam indaiá? Nossa terra de “muito indaiá” já não os tem mais, ou se tem é muito pouco, apesar de algumas tentativas de replanta-la.

Seria ótimo termos o nosso Saci Indaiá. Não seria interessante jogar a culpa nele porque o feijão queimou, ou um objeto não é encontrado, ou pelos brinquedos estarem fora do lugar ou misturados?

O que quero aqui levantar, é que no mundo atual, com tanta tecnologia, seria muito bom um pouco de tempo para a imaginação e a fantasia, relembrar nossa cultura, nossos tão ricos mitos, esse universo popular tão esquecido.

 

O SACI E A CAVALHADA
Óleo sobre tela de R. Cippichia
Fonte: Revista do Brasil - São Paulo, ano II - novembro de 1917, n.23 - página 411
disponível em  "Sacis Históricos"


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