quinta-feira, 31 de janeiro de 2019

ROMEU DOS BONECOS

Por Arnaldo Forti Battagin, janeiro de 2019



Estimulado pela curiosidade de minha amiga Euzemira Magda Pinto Villares, a quem trato carinhosamente como Magda Ferrari pela sua ascendência materna dos Ferrari , de Rafard -SP, decidi investigar sobre o Romeu dos Bonecos , que com nostalgia, me lembro ainda criança de suas apresentações em Capivari no final dos anos 50 e início dos anos 60 do século passado.

Descubro que seu nome era Romeu Rodrigues Pedroso, nascido em Indaiatuba -SP em 1.3.1923 , filho de Simão Rodrigues Pedroso e Benedita Rodrigues e se radicou em Capivari ainda jovem.

Casou -se em 1950 com moça capivariana, Odete Aparecida Rodrigues, filha de Benedito Rodrigues, o Dito Borges e de Ida Bego, de ascendência italiana. Dito Borges, de grata lembrança, zeloso jardineiro das praças centrais capivarianas era o terror da criançada dos anos 60 que insistia em pisar na grama e nos canteiros bem cuidados e fazia isso só para atormentar o jardineiro.

O casal teve os filhos Rosivaldo, Rogerio, Roberto, Romeu Junior e Rita e viveram em Capivari por muitos anos e alguns de seus filhos retornaram à Indaiatuba e o Roberto se radicou, depois no Rio de Janeiro.

Romeu dos Bonecos era artista nato, ventríloquo notável, sempre acompanhado de seus bonecos Justo e Sonera. O Justo era branco e palmeirense e o Sonera, negro e corintiano. Ambos faziam a alegria da criançada e também dos adultos. Os bonecos “faziam a alegria” pois Romeu dava vida e personalidade a eles.

Em 1939, Cornélio Pires, conhece Romeu, por ocasião de uma visita à Capivari. Cornélio, natural da vizinha Tietê, já era famoso por seu passado de escritor, jornalista, folclorista, poeta e cantor paulista. Conhecido como o "Bandeirante da música caipira", seu trabalho de pesquisa e promoção da cultura "caipira", ocupa um lugar de destaque pelo seu pioneirismo e desenvoltura na abordagem desse tema Cornélio tinha fundado a Cia de Teatro Ambulante de Cornélio Pires e convidou Romeu , então com 16 anos , a participar da trupe, que percorria não somente o interior paulista mas todo o Brasil.

Em seu livro “Tipos Notáveis de Popularidade”, Antonio da Cunha Penna, de onde extrai essa foto que ilustra o texto, relata que Cornélio ficou impressionado com a habilidade de Romeu em beber água e fazer o boneco falar . No próprio livro de Cornelio Pires, Coisas d’Outro Mundo, há uma referência a Romeu. A sociedade durou vários anos, com o patrocínio exclusivo da Cia Antártica Paulista, tendo se apresentado desde o Carandiru até no Teatro Municipal de São Paulo.

A Companhia seguiu realizando espetáculos por todo o interior do Estado de São Paulo, até o falecimento de Cornélio em 1958. Romeu dos Bonecos volta então a se apresentar sozinho.

Anos antes , em 1945 esteve na Itália no final da Guerra ,trabalhando no setor administrativo de FEB. Foi depois de sua volta ao Brasil e da morte de Cornélio que foi acometido pelo alcoolismo, mas fazia suas apresentações em seus momentos de abstinência.

Luciano Rodrigues, seu sobrinho e afilhado conta que que ele ia à feira e pegava uma sardinha da banca e perguntava a ela há quanto tempo estava lá e se estava ainda boa ao que a sardinha respondia coisas que o feirante não apreciava e isso e gerava alguns transtornos e muitas risadas.

Em 1988, como relata Antonio Penna, Romeu dos Bonecos fez uma apresentação para Moraes Sarmento no Programa A Cidade Faz o Show .

Sarmento se impressionou com a competência do artista e no saguão do Hotel Alvorada, divertiu a equipe de gravação com seus bonecos. Numa oportunidade o boneco Sonera começou a se dirigir a um espectador boquiaberto que assistia à exibição e quando o boneco põe em dúvida a masculinidade dele, o espectador vai a ignorância e por pouco o boneco e seu dono não saem ilesos do episódio.

Geraldo de Almeida informa que ele saia em caravanas com o Romeu quando Luiz Quagliato Filho era candidato a prefeito. Essas caravanas percorriam os sítios e as fazendas das redondezas e Romeu fazia a alegria das crianças da época.

Um outro episódio atribuído a Romeu dos Bonecos mas não confirmado diz respeito a um homem que trazia a carroça com muito peso ,puxada por um boi O Romeu na voz do boi diz :"eu estou cansado, com fome, com sede, trabalho muito".

O dono do animal se espanta e o ventríloquo repete a brincadeira . O dono do animal fica com a consciência pesada Quando entrega o suprimento diz que não trabalharia mais e conta o ocorrido Daí, surge a famosa frase . ! A terra em que o boi falô"!

Contam também que Romeu chegou a atingir um grau elevado na maçonaria.

Com o declínio de suas apresentações tentou de tudo para sobreviver, tendo sido pedreiro, encanador, mecânico, dono de bar em Capivari e Indaituba. Mas o vício foi se tornando expressivo, ficou internado na Clíinica de Repousos Indaiá . Em 1993, numa entrevista para a Tribuna de Indaiá assim se expressa “Eu sou alegre, sou humorista, mas minha vida foi se tornando um inferno, fui perdendo o sono , sentindo profundo tédio, um vazio que nem a bebida preenche . Se eu não acreditasse em Deus, já tinha dado um tiro na cabeça”

Faleceu no ano de 2000 em Indaiatuba ao 77 anos e deixou um sucessor, seu filho Romeuzinho, o novo Romeu dos Bonecos .

Romeuzinho era servente de pedreiro e trabalhava para meu irmão Eduardo Battagin. Morava nas obras em que ajudava a construir até que meu irmão fez construir uma casinha com quarto e banheiro para ele morar, próximo do Estádio Ronaldão. Romeuzinho herdou a habilidade do pai como ventríloquo e nas horas vagas começou a fazer suas apresentações. Numa delas meu irmão convidou o prefeito da época, o Borsari , que se impressionou com seu talento, assim como Cornélio Pires tinha se impressionado com o pai de Romeuzinho.

Foi contratado pela prefeitura de Capivari para fazer apresentações nas escolas e também como auxiliar de eletricista. Contudo herdou não apenas o talento do pai como ventríloquo, mas também a afeição pela bebida. S

ua carreira foi curta, tragicamente interrompida por ter sido atropelado e morto na Avenida Enio de Camargo, com sua bicicleta quando retornava do Restaurante Formigão, na Rodovia do Açúcar.

Quando ele morreu sua mãe e um irmão procuraram meu irmão, procurando as chaves da casinha em que morava mas como ele não tinha orientou a procurar um chaveiro e assim os bonecos Justo e Sonera foram resgatados.

Atualmente os bonecos estão de posse do filho Roberto, no Rio de Janeiro. Eles contudo não tem o sotaque carioca pois estão mudos.

Em Capivari ambos os artistas nunca foram homenageados, mas em Indaiatuba, existe uma praça com o nome Praça Romeu dos Bonecos, criada com a Lei Municipal 4814 de 19.1.2005

Nada mais Justo: o nome de um dos seus bonecos

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