Introdução
"Tudo se iniciou com o descobrimento de uma quantidade enorme de terra, durante uma transação, que não constava na escritura (2). Esta terra foi então pleiteada pelo município e também pelas partes envolvidas no descobrimento das terras excedentes. E estranhamente o prefeito, em nome do município, abre mão da posse desse excedente. Mais adiante, a própria prefeitura, em outra administração, implanta a infraestrutura sem ônus para o loteador."
- A prefeitura deveria ter cedido a área?
- Ela própria não poderia/deveria ter executado o loteamento?
- Se assim o fizesse, não visando o lucro máximo, mas a um custo mínimo para o comprador final, não teria colaborado com uma relevante parcela da população em condições de vulnerabilidade habitacional?
- O que podemos aprender com esses fatos?
- No que esses fatos implicam nas exigências que temos que fazer como cidadãos hoje em dia?
- Deve o poder público beneficiar o capital privado?
- É a História uma ciência prática?
Cronologia, Política de Relações e Evidências
- A Imobiliária Rosa dos Ventos e a Imobiliária Intermark compram a Fazenda Engenho D´Água e descobrem, ao fazer o levantamento topográfico, que havia excedentes de terra com relação à área inicial.
- O antigo proprietário da fazenda Engenho D´Água - Hermann Binder - era possuidor de 197,93 alqueires devidamente registrados, mas na área havia mais 96,29 alqueires, ou seja, quase 1/3 (um terço) da propriedade.
- As imobiliárias entraram com um pedido de posse do excedente no Fórum local quando o prefeito ainda era Romeu Zerbini. No final da sua gestão, Romeu prepara uma Ação Discriminatória requerendo a posse dessa terra para a Prefeitura (como deve ser), mas não envia esse documento para o Fórum.
- Na data supra (07/11/78), Clain Ferrari, que já era prefeito (primeiro mandato, de 01/02/77 até 31/01/83), deu entrada no Fórum local com uma Ação Discriminatória contra as imobiliárias e demais ocupantes da área denominada como "terras devolutas" reivindicando o direito da prefeitura sobre essas terras.
- O primeiro passo dado no sentido de aprovar o loteamento foi essa lei que alterou o perímetro urbano de Indaiatuba, incorporando os 96,29 alqueires questionados e a área que era considerada rural, da Fazenda Engenho D´Água (passando de INCRA para IPTU).
- Cinco dias após a promulgação da lei que alterou o perímetro urbano incorporando a até então "terra devoluta" é promulgada uma lei que autoriza o "acordo" entre a Prefeitura e a Imobiliária.
- O acordo era simples: a prefeitura, em firma reconhecida pelo prefeito, abriu mão dos 96,29 alqueires para a Imobiliária, em troca de 242 metros quadrados (10 alqueires paulistas) uma área desmembrada da fazenda Fazenda Engenho D´Água doada para a prefeitura.
- Detalhe: o Memorial Descritivo foi protocolado no dia 06 de novembro de 1978, um dia antes da proposta de ação discriminatória, o que se leva a concluir que o acordo de doação de área de 10 alqueires há havia sido previamente acordado.
- Concretiza-se o acordo entre a Imobiliária Intermak e a Prefeitura, uma troca de 92,29 por 10 alqueires.
- Em 02 de dezembro de 1979 é formada na cidade de Campinas, a sociedade entre Ana Maria Costa Ferrari, esposa do prefeito Clain Ferrari e o Sr. Elias Jorge Nordi Jorge, proprietário dos 96,29 alqueires excedentes da Fazenda Engenho D´Água.
- Esta sociedade era denominada "Morada do Sol Empreendimentos Imobiliários S/C Ltda. e tinha como objetivo a prestação de serviços de administração e execução de loteamentos, bem como a sua promoção.
- Do total de 294,62 alqueires (Fazenda + Terras Excedentes) 144,38 alqueires foi destinado ao loteamento que formou o Jardim Morada do Sol.
- Essa lei (veja aqui) alterou o perímetro do Distrito Industrial até então determinado pela lei municipal 1254 de 15 de agosto de 1973 (altera em 23 de setembro de 1977). O antigo perímetro do Distrito Industrial era mais um obstáculo a era ultrapassado para a implantação do loteamento na área em questão.
- Nessa data é assinado, em Campinas, o documento que autoriza a instituição de um loteamento em terras da Imobiliária Intermark Ltda. pelo Sr. Elias Jorge Nordi Jorge.
- Nessa data o Serviço Autônomo de Água e Esgotos (SAAE) assina documento que certifica que os alqueires situados entre a Avenida Iseki e Rodovia Santos Dumont não eram abastecidos pela rede de água e esgotos, mas estava contida nos planos de expansão.
- O SAAE fez a obra de distribuição de água e coleta de esgotos do bairro (em vez do loteador, conforme a lei). Mesmo com a rede, a água chegava com muita dificuldade; a rede não possuía reservatórios em quantidade aplicável. A crise de abastecimento no bairro diminuiu quando o Engo. Wanderley Peres inovou, instalando booster - primeiras bombas pressurizadoras de nossa cidade.
- Na mesma data, o Departamento de Obras e Viação da Prefeitura Municipal de Indaiatuba assina que não havia diretrizes de uso de solo para a área.
- CETESB concede licença para o loteamento com o compromisso era que a loteadora fizesse as obras de infraestrutura no prazo máximo de 3 anos, com exceção dos braços de iluminação, que teriam prazo de 6 anos.
- Outro compromisso era o caucionamento do loteamento, uma garantia que a infraestrutura seria feita.
- A loteadora não cumpriu o compromisso de executar a infraestrutura; quem o fez foi o SAAE e a prefeitura, na gestão do prefeito José Carlos Tonin (1983/1988).
- Assim que Clain Ferrari reassume o cargo (1989/1992) o então Secretário de Planejamento, o Engenheiro Fábio Roberto Barnabé, descauciona os lotes.
- Prefeito Clain Ferrari assina o decreto 2.081 autorizando a execução do loteamento Jardim Morada do Sol. Essa data é comemorada como a "Fundação" do bairro. Oito mil terrenos de 10x25m foram vendidos através de dois contratos: (1) Cr$ 75.000,00 - Setenta e cinco mil cruzeiros, em setenta prestações fixas, sem juros ou acréscimos para pagar o lote e (2) Cr$ 133.000,00 - Centro e trinta e três mil cruzeiros, para pagar a infraestrutura, totalizando Cr$208.000,00. (Os detalhes do contrato de compra e venda você poderá ler, em breve, neste link).
Conclusão
Créditos e Referências
(1) Este texto foi feito com base no trabalho "Loteamento Jardim Morada do Sol Indaiatuba" apresentado em 1989 para a disciplina Planejamento Urbano II ministrada pelo professor orientador Wilson Jorge pelos alunos Carmen Lúcia Scheneider David, Carmen Silvia Machado Echelar, Claudio Alexandre do Amaral Sampaio, Daniela Ripper e Regis Annoni na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade de São Paulo (USP).
(2) Em seu depoimento para a Fundação Pró-Memória de Indaiatuba, Hélio Milani faz um apontamento de grande importância[1]: o Major conhecia cada palmo de terra de Indaiatuba, para tudo quanto era lado. Infelizmente, após sua morte, o maior impacto sofrido foi o avanço das cercas (os mourões entardeciam em um lugar, mas amanheciam em outro). A década de 1940 foi um período em que pessoas avançaram descaradamente em terras supostamente devolutas, em terras da Prefeitura, não apenas por desconhecimento, mas por maldade, ganância e arrogância. – Na época do Major, ninguém tinha topete para fazer isso, pois apanharia com a cinta (e mais tarde com a bengala) dele. – Essa frase de Hélio Milani ilustra bem o fim de uma época, a época do Major Alfredo. A época do Coronelismo da Terra dos Indaiás.
[1] MILANI. Hélio. Hélio Milani (depoimento 1996, 2001, 2005), Indaiatuba. Fundação Pró-Memória de Indaiatuba, 1996, conteúdo citado no livro "História de Indaiatuba na Perspectiva Biográfica de Antônio Reginaldo Geiss".
As informações contidas nesta cronologia possuem referências em documentos inventariáveis, entre eles: Autos de Ação Discriminatória (07/11/1978), Lei Municipal 1645 de 6 de dezembro de 1978, Lei 1656 de 11 de dezembro de 1978, Memorial Descritivo de área doada à municipalidade pela Imobiliária Rosa dos Ventos e Imobiliária Intermark em 6/11/1978, Lei Municipal 1723 de 5 de setembro de 1979, Cópia do Instrumento Particular de Constituição da Sociedade Civil denominada Morada do Sol Empreendimentos Imobiliários S/C Ltda. de 2 de dezembro de 1979, Cópia de contrato de venda e compra de terreno do Jardim Morada do Sol - Imobiliária Intermark de 2 de maio de 1989, Exemplar de Contrato de Compromisso entre a Imobiliária Intermark e o Cartório de Imóveis da Comarca de Indaiatuba, Memorial Descritivo elaborado pelo engenheiro Oscar Aparecido Beseggio, devidamente aprovado pela Prefeitura Municipal de Indaiatuba do loteamento do Jardim Morada do Sol, Compromisso de Execução de Obras de infraestrutura assumido perante a Prefeitura Municipal de Indaiatuba, Licença de instalação o loteamento emitido pela CETESB em 4/2/1980, planta do loteamento elaborada pelo engenheiro Oscar Aparecido Beseggio aprovada em órgãos competentes, Solicitação de negativa de ônus para a municipalidade de Indaiatuba solicitada pela Imobiliária Intermark para a Prefeitura de Indaiatuba referente a gleba de 3.468.654,76 metros quadrados, Declaração do SAAE certificando que as glebas que compunham o Jardim Morada do Sol não eram abastecidas por rede de água e esgotos, mas que "estava contida nos planos de expansão da autarquia" assinada por Dr. Pedro Claudio Salla em 11 de dezembro de 1979, Certidão emitida pela Prefeitura de Indaiatuba atestando não se opor a implantação de loteamento, assinada pelo Engenheiro Atílio Zanotello, Alvará do Departamento de Obras da Prefeitura de Indaiatuba de 21/3/1980 autorizando a execução do loteamento, Lei 2168 de 17 de outubro de 1985, Decreto 2081 de 19 de março de 1980 que aprovou o arruamento e loteamento denominado "Jardim Morada do Sol" assinado por Clain Ferrari, Lei Federal 6766 de 19 de dezembro de 1979, Plano de Desenvolvimento Integrado de Indaaituba 1968 Jorge Wilheim, relatório da Comissão Especial de Inquérito Resolução número 3 de 15 de junho de 1981 da Câmara Municipal de Indaiatuba e outros.
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