Eliana Belo Silva
Coluna Semanal "Identidade Indaiatubana" - Jornal Exemplo -
03/06/2016
O menino da porteira “Do Outro Lado”
Quando Indaiatuba era apenas uma pequena cidadezinha formada apenas em volta do Largo da Matriz, Largo da Cadeia (atual praça Prudente de Moraes) e Largo das Candeias ou Largo das Caneleiras (atual Praça Rui Barbosa ou “praça dos peixes”, o leito ferroviário da Sorocabana delimitava esse centro urbano, dividindo-o com o “Outro Lado”, os que moravam no Bairro Santa Cruz, que era, na época, o que hoje chamamos de periferia.
O Outro Lado foi sendo urbanizado por casebres que tomaram, aos poucos, parte da antiga propriedade do Coroné Belchior, cujo limite começava logo ali, no Buraco da Estação, onde mais tarde, bem na frente e extremamente alinhado com a Matriz Nossa Senhora da Candelária, seria construído o Hospital Augusto de Oliveira Camargo.
Foi em partes das terras do Coroné Belchior que o Major Alfredo Camargo Fonseca que foi prefeito de Indaiatuba por mais de 30 anos, após comprar uma parte desmembrada, instalou o primeiro sistema de captação de água do nosso município: era uma bomba, instalada ali naquele laguinho que hoje está urbanizado, que transportava água até uma caixa d´água na atual Praça Prudente de Moraes e dali, o precioso líquido era distribuído para 8 torneiras públicas. A captação era feita no então chamado Córrego Belchior ou Córrego Municipal.
A origem do Bairro Santa Cruz
Mas qual a origem do Bairro Santa Cruz, que todos chamavam de “Outro Lado”?
A origem é uma história triste, que muitos indaiatubanos comparam e apelidaram como a “história do menino da porteira indaiatubano”, em alusão à famosa música interpretada por Sérgio Reis e que virou Drama nas telas do cinema em 2009.
Quem documentou essa história em uma crônica, imortalizando a memória popular, foi a memorialista e professora Sylvia Teixeira de Camargo Sannazzaro que inicia sua narrativa justamente informando que “era muito comum as pessoas antigas, os moradores dali, ao se referirem a esse lugar, dizerem: lá da outra banda, ou lá do outro lado [da linha do trem].
Em seguida ela narra como esse nome, nascido naturalmente e que poderia ter permanecido como identificação original do logradouro se transformou dada à tragédia com um menino. Vejamos.
“Nesse tempo, parte destas terras do Belchior passou a pertencer ao coronel Teófilo de Oliveira Camargo, que ali formou uma chácara de residências e, além de alguma plantação, mantinha sempre umas vacas leiteiras. Devido à proximidade com a cidade e ar puro que se respirava nas manhãs frescas, era um hábito salutar, muito cultivado pela nossa gente, fazer um passeio matinal à chácara do coroné e saborear o delicioso leite gordo e puro, tirado na hora, aos copos com açúcar ou conhaque. Certa feita, aconteceu que uma dessas rezes, um tanto historienta, desapareceu da chácara, do pastinho. Foi então iniciada a sua busca pelos arredores, o que deu muito trabalho, e após dias seguidos de procura foi ela encontrada pelo Martinho, um menino negro, filho de um empregado do coronel. Não sabemos como explicar o porquê da raiva do animal. Sabe-se apenas, que a vaca quando vinha sendo trazida de volta para a chácara, já bem nas proximidades, investiu contra o menino, enterrando o chifre em seu ventre. O coitado do Martinho morreu!”
Martinho sempre ficava esperando o seu pai, que vinha da lida com o coroné, trepado na porteira da propriedade e aquele dia, os dois, tanto o coronel como o pai, estranharam sua ausência.
Comovido com a dor do pai que se estendeu em extrema comoção por todo o lugarejo, o coroné encomendou uma lápide no Cemitério de Taipas, onde até hoje se lê “saudade de seu patrão”, ao mesmo tempo em que ordenou que uma cruz fosse cravada no local exato do acidente, evocando uma prece por intenção da alma do menino Martinho.
Depois de um tempo, a professora Sylvia conta que o coronel fez uma ermida no mesmo lugar, exatamente onde na época, era a confluência da antiga estrada de Itu com a entrada da fazenda Barnabé (atual Jardim Morada do Sol). Daí em diante o povo passou a chamar o lugar de bairro Santa Cruz.
Os arredores da capela em homenagem à Martinho tornou-se um local de acampamento e de refúgio de leprosos em uma época em que esses doentes eram extremamente estigmatizados. Eles armavam barraquinhas brancas nas imediações e ali permaneciam dias seguidos. Por medida sanitária, a Capela de Santa Cruz não foi conservada, mas a perda do menininho ficou registrada para sempre na memória dos indaiatubanos.
.....oooooOooooo.....
.
Nenhum comentário:
Postar um comentário