Na sexta-feira dia 17 de junho, a Torcetex, empresa familiar de Indaiatuba, completou 60 anos confraternizando com autoridades, clientes, fornecedores, familiares e amigos.
(veja imagens do evento aqui)
Comemorar
o sexagésimo aniversário de uma organização de caráter privado, ainda mais
tendo esses anos transcorridos em nossa cidade que tanto admiramos por seu
caráter acolhedor, é fato raro.
E é
justamente sobre esse caráter de longevidade, impregnado de memórias pessoais
de caráter corporativo, econômico,
tecnológico, social e de outras
naturezas que venho traçar um resumo dessa história de sucesso, história essa
que teve início muito antes de 1956, quando a Torcetex adquiriu seu registro
formal com essa Razão Social e que, desde então, vem se consolidando no mercado
interno e externo, através da qualidade de seus produtos e serviços
principalmente caracterizados pela inovação.
No embrião
da criação dessa empresa encontra-se o memorável e saudoso José Pedro Cardoso
da Silva, avô paterno no atual Diretor da Empresa, o Sr. Plínio Cardoso da
Silva, carinhosamente conhecido e rememorado no imaginário dos indaiatubanos
como “Dr. Cardoso”
Dr. José Pedro Cardoso da Silva
José Pedro Cardoso da Silva nasceu em
Mogi Mirim, filho do casal Candido Cardoso de Almeida e Silva e Justina
Carolina de Almeida e Silva que, além dele, teve mais dois filhos: Candido
Cardoso da Silva (que faleceu em Indaiatuba no dia 7 de março de 1932) e Maria
Cardoso da Silva (que foi professora em Caconde).
José Pedro
Cardoso da Silva formou-se médico em 2 de abril de 1921, em uma cerimônia onde
curiosamente, de 37 formandos, apenas uma era mulher: a Dra. Carmen Escobar
Pires.
O início
da carreira e a experiência em gestão hospitalar
Depois de
formado, exerceu a carreira como médico e em 20 de março de 1927, estava
presente na inauguração da Santa Casa de Araçatuba, que na ocasião se chamava
Hospital Sagrado Coração de Jesus, fundado por representantes da comunidade
araçatubense, com o objetivo de oferecer atendimento médico e hospitalar de
gratuita para doentes carentes.
Ali atuou não só como médico, mas como
integrante participativo da viabilização técnica e funcional do hospital,
participação esta advinda de seu temperamento de liderança e profundo senso de
técnicas de gestão, o que mais tarde o faria, além de médico, empresário e
político, tendo sido prefeito de Indaiatuba por duas gestões.
Médico no
HAOC
Com base
nos registros consultados, não foi possível determinar exatamente o ano correto
em que Dr. José Cardoso mudou-se para Indaiatuba; sendo possível, no entanto,
afirmar que ele medicava em nosso município e ao mesmo tempo também em
Araçatuba.
Certeza
temos que o primeiro hospital de nosso município estava sendo acabado de ser
construído, ou estava em seus primeiros meses de funcionamento quando Dr.
Cardoso veio para cá, e como médico, conheceu a mulher mais importante de nossa
história municipal até hoje: D. Leonor de Barros Camargo - na ocasião em que
ela e seu marido Augusto de Oliveira Camargo (que havia ficado doente em 1921)
decidiram, no final da década de 1920, mais precisamente em 1928 iniciar a
construção as suas custas daquele que
seria o Hospital Augusto de Oliveira Camargo, o HAOC.
Aproximadamente
um ano após a decisão do casal, no dia 1º. de junho de 1929, a pedra
fundamental foi lançada e em 1933, no dia do aniversário do Sr. Augusto o
hospital foi inaugurado. Com a experiência que tinha na implementação do
hospital em Araçatuba, com sua relevante formação e pelo jeito admiravelmente
cortês que na verdade eclipsava um empreendedor e político perspicaz e
perseverante, não foi difícil ganhar a confiança de D. Leonor, que segundo
relatos, o tratava maternalmente, como o filho que não teve, ouvindo seus
pareceres e conselhos para a operacionalização dos primeiros anos do nosso
HAOC.
Vida
médica e constituição da família
O próprio
Dr. Cardoso conta, em documentos manuscritos
feitos por ele e doados generosamente por Plínio Cardoso da Silva para o
Arquivo Público da Fundação Pró-Memória de Indaiatuba, que ele veio para
Indaiatuba quando ainda trabalhava em Araçatuba, e aqui, com a esposa
indaiatubana Sarah Walsh da Costa, teve suas três filhas e filho.
Sarah era
filha do casal Elisa Walsh da Costa e do farmacêutico Francisco Xavier da Costa, que há anos fazia oposição política ao Major Alfredo Camargo Fonseca,
que dirigiu Indaiatuba no poder executivo por 30 anos, 04 meses e 38 dias. Major Alfredo foi um dos pioneiros
republicanos desse nosso país e dirigia nossa cidade nos moldes (mês que
variáveis) do Coronelismo da República Velha.
Durante tudo o período em que morou aqui, afirmava que, embora fosse ficar em Indaiatuba
por pouco tempo, pois iria embora para educar os filhos em outra cidade com
melhores recursos educativos, não iria permanecer inerte perante os problemas
que julgava públicos.
O despertar do homem público
Dr. Cardoso sofreu forte influência do sogro Chiquinho Boticário (dono da
saudosa farmácia Candelária) e de Scyllas Sampaio, sendo um político atuante,
tendo sido prefeito por duas vezes, intercalando o cargo com o próprio Scyllas.
De início, envolveu-se na Revolução de 1932, que na verdade não foi uma
Revolução e sim uma guerra civil paulista arrasada pelo Governo Vargas e
correligionou-se ao grupo que fazia oposição ao Major Alfredo que, dentro de
sua maneira de governar, era querido por grande parte da população que o tomava
como padrinho, protetor ou parceiro.
Um cidadão atuante
Não são
poucos os relatos que confirmam que D. Leonor tratava José Pedro como o filho
que não teve. Embora a mansão que o casal Oliveira Camargo tinha em
Higienópolis, em São Paulo, fosse frequentada pelo médico sanitarista, cientista e bacteriologista Carlos
Chagas, é muito provável que a aproximação de D. Leonor e Dr. José Pedro tenham
fortalecido a intensão do casal de, além de inaugurar um hospital, prover a
cidade de uma rede de abastecimento de água e de um prédio escolar moderno, nos
moldes republicanos.
É bastante adequado inferir que Dr. Cardoso tenha influenciado fortemente D. Leonor com o argumento que, se quisesse mesmo mudar mais ainda a vida da comunidade, era necessário prover um espaço onde a Educação fluísse melhor e estabelecer meios de infraestrutura adequada, ou seja, a presença da água encanada no cotidiano das pessoas era imprescindível.
É bastante adequado inferir que Dr. Cardoso tenha influenciado fortemente D. Leonor com o argumento que, se quisesse mesmo mudar mais ainda a vida da comunidade, era necessário prover um espaço onde a Educação fluísse melhor e estabelecer meios de infraestrutura adequada, ou seja, a presença da água encanada no cotidiano das pessoas era imprescindível.
Essas ideias cidadãs advinham da Universidade de São Paulo,
onde José Pedro havia se formado: a
ideia de que a saúde pública não dependia apenas de um local apropriado de
tratamento como o moderníssimo HAOC, mas sim de prevenção. As consequências que
tais ideias e longos diálogos entre mãe adotiva e filho intelectual tiveram, já
sabemos: D. Leonor – ou mais adequadamente o casal – construiu não só o HAOC,
mas também o prédio do novo grupo escolar, o Grupo Escolar Randolfo Moreira
Fernandes e financiou o primeiro sistema de abastecimento público de água que
levava o precioso líquido para dentro das residências: o sistema de bombeava
água da Represa do Coppini (atual Museu da Água) para a caixa d´agua que está
na esquina da Rua 24 de maio com a Avenida Presidente Vargas, próximo à
Rodoviária.
O embrião da TORCETEX
Registros documentados nos remetem a afirmar que José Pedro
Cardoso da Silva iniciou sua vida como empreendedor praticamente no mesmo
período em que exercia a medicina em nossa cidade através de um inicialmente e
pequeno negócio de beneficiar algodão.
O algodoeiro é uma
planta nativa brasileira e desde a invasão de Cabral já se narrava o cultivo
delas por indígenas para os mais diversos fins. Desde sua formação como bairro
rural de Itu e caminho de tropeiros, Indaiatuba já tinha plantações de algodão,
evidência comprovada nos testamentos de seus primeiros fazendeiros de
cana-de-açúcar e depois de café. De início, o produto era utilizado para
produzir rústicas roupas de escravos e sacos para exportar produtos agrícolas,
sendo que os tecidos utilizados por outras classes eram, na sua maioria,
importados da Europa.
Mas a cotonicultura consolidou-se no Brasil de forma mais
relevante apenas após o fim da Primeira Guerra Mundial. Com certeza, com a
perspicácia de empreender, Dr. Cardoso percebeu o crescimento iminente do
negócio e viabilizou uma indústria de beneficiamento de algodão em nosso
município. E acertou em cheio: na vizinha Campinas já tínhamos, a partir de
1924 o Instituto Agrônomo estudando técnicas diversas para esse cultivo.
Em 1929, após a crise do café, o Estado de São Paulo expandiu
a cotonicultura,
a ponto de na década de 30, despontar como grande produtor de algodão no País,
iniciando uma nova fase do algodão no Brasil. A primeira instituição bancária
de nossa cidade, o chamado Banco Agrícola de Indaiatuba importou sementes de
algodão em 1933 impulsionando ainda mais a produção por aqui. E Dr. Cardoso
estava atento à essa tendência: em
1 de abril de 1934, a USINA INDAIATUBA de sua propriedade emite o Pedido
de Compra número 1, adquirindo 81 sacos de algodão.
Dois anos depois, em 1936, a Usina Indaiatuba muda de nome, e
passa a se chamar, na Junta Comercial, “José Cardoso da Silva” ainda no
ramo de Beneficiadora de Algodão tendo início suas atividades no dia 1º. de
março de 1936, na Rua 11 de Junho onde funcionou, de início, com dois
descaroçadores. 1934, foi instituída uma lei no Estado de São Paulo, tornando
privativa do Estado a produção e distribuição de sementes de algodão. Em 1939, a própria prefeitura municipal, sob a
gestão do Prefeito Sebastião Nicolau, anunciava que forneceria aos interessados
sementes para plantar algodão:
Outra
tendência que Dr. José Cardoso soube avaliar como oportuna foi o crescimento da
sericicultura, a tal ponto que logo a seda substituiria o algodão como foco principal
em seus negócios. A sericicultura chegou no Brasil com D. João VI mas tomou
impulso pelos mesmos motivos que o algodão, após a grande guerra e
principalmente para abastecer as indústrias da Inglaterra. Até que em 1935 o
governo de São Paulo criou uma Seção exclusiva para incentivar a produção de
ovos do bicho-da-seda e de prestar assistência técnica aos produtores e em 1941
passou a existir o Serviço de Sericicultura do Estado de São Paulo e jornais
anunciavam que 46 prefeituras haviam se disponibilizado a produzir amoreiras
para o bicho-da-seda, entre elas, Indaiatuba sob a gestão entusiasta do
prefeito Sr. Miguel Nicolau para com essa produção, que no mesmo ano confirmou
já ter plantado 6000 amoreiras. Nesse contexto de valorização da sericicultura,
Dr. José Pedro montou a Fiação de Seda São Pedro.
Desde a Usina Indaiatuba montada em
1934 até a finalização da Fiação São Pedro, foi um período em que a atual
TORCETEX estava sendo gerada.
Em 1956, no mesmo prédio da rua 11 de junho onde funcionara
seus negócios desde a primeira Usina Indaiatuba até a Fiação de Seda São Pedro,
nascia a Torcetex. O local funcionou como um incubadora dessa importante
empresa que está aí até hoje, já com a quarta geração assumindo a gestão de
parte dos processos. Suas antecessoras e a própria Torcetex, em uma Indaiatuba
pequenininha que girava em um pequeno centro urbano e com riqueza produzida em
quase sua totalidade no campo, ofereciam uma rara oportunidade
para as trabalhadoras e trabalhadores urbano.
De lá para cá a história foi de crescimento e consolidação de
uma organização produtora de fios e tecidos de palha para os variados segmentos
de mercado com imensa diversidade de tramas e cores.
Mas especificamente sobre os produtos e serviços imaginados,
criados e aplicados na decoração de ambientes, móveis, sapatos, bolsas e outros
acessórios da moda, o Renato, que me sucederá, tem mais propriedade para
explanar.
Carlos Eduardo Cardoso da Silva, filho doDr. José Pedro Cardoso da Silva
Há uma rua no Jardim Esplanada com o nome dele.
Carlos Eduardo foi proprietário da Indústria Cordonyl Cordões de Nylon Ltda, localizada na Rua Professor Adalberto Nascimento, 353 em Campinas
Dr. José Pedro Cardoso da Silva (4º da fila da frente, da esquerda para direita)
Crédito da imagem: Cesar Cardoso, originalmente publicada no Dinossauros de Indaiá (grupo do Facebook)
Década de 1930, segunda candidatura do Dr. Cardoso
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