sábado, 22 de fevereiro de 2025

1a. Sessão Ordinária da Câmara Municipal de 2025

 HISTÓRIA DO TEMPO PRESENTE

1a. Sessão Ordinária da Câmara Municipal de 2025


Eliana Belo Silva

 

I- INDICAÇÕES

Na primeira sessão ordinária da Câmara Municipal de Indaiatuba houve a apresentação de 152 Indicações. Desse total, 15% foram de sugestões que chamarei, para fins didáticos, de um grupo denominado INOVAÇÃO, ou seja, são ações que não são aplicadas em nossa cidade ainda e que os vereadores estão sugerindo e/ou reivindicando. As demais Indicações apresentadas - também para facilitar o entendimento dos textos que aqui publicarei nesta coluna semanal - são as que pertencem a um conjunto denominado CONTINUIDADE e/ou ZELADORIA, ou seja, são ações que os vereadores sugerem que o prefeito tome ações junto às Secretarias e/ou Departamentos Municipais, para que façam mais (gestão de produtividade) ou de forma melhor e mais rápida (gestão da qualidade).

As áreas que foram mais citadas pelos vereadores foram Obras (47), Trânsito (29), Serviços Urbanos e Meio Ambiente (19), Saúde (15), Segurança (13) e Educação (11).

DESTAQUES

  • Para a Secretaria de Educação, uma Indicação de Inovação destacou-se das demais: ela foi protocolada pelo Prof. Sérgio e solicita a implantação de um Programa Férias sem Fome para os alunos das escolas municipais cujas famílias estão no Cadastro Único, ação que terá que ser feita em conjunto com a Assistência Social conforme o próprio vereador detalhou aqui. A Secretaria da Educação ainda recebeu - entre outras -  reinvindicações de melhorias na climatização das salas de aula.
  • Outra Indicação que, se atendida envolverá a Assistência Social, foi a IND 64 apresentada pelo vereador Hélio Ribeiro, que solicita estudo de viabilidade para a criação de um Polo de Assistência e Apoio Socioeducativo Infantil (PAASI) no bairro Parque Campo Bonito. Sugestão que, se atendida, é de grande impacto para nossa cidade, uma vez que o PAASI atende crianças entre 6 a 11 anos de famílias em vulnerabilidade social, trabalhando o contraturno escolar, oferecendo atividades esportivas, culturais, artesanais e de lazer. 


"Se a educação sozinha não transforma a sociedade, sem ela tampouco a sociedade muda". 
Paulo Freire


  • A maior parte das Indicações para a Secretaria de Obras e/ou para o Departamento de Trânsito foi a respeito da quantidade de buracos nas vias públicas. As matérias protocoladas pelos vereadores pedem pontualmente que a operação Tapa-Buraco atenda endereços específicos, exceção feita pelo vereador Du Tonin, que reivindicou uma solução mais sistêmica e continuada (leia aqui) a esse problema que já é reincidente na cidade, principalmente causado pela má qualidade do processo de asfaltamento, mas justificada pelas autoridades como "problema advindo das chuvas."
  • Após a morte de dois motociclistas assassinados por conta do uso do cerol, nove matérias foram protocoladas para que essa tragédia seja evitada futuramente. Embora já existam duas leis municipais sobre essa prática, ambas de autoria do ex-vereador Arthur Spíndola (leia aqui e aqui), os vereadores, pressionados pelos óbitos que aconteceram com poucos dias de diferença, solicitaram mais rigor em várias ações que já são previstas nas leis e que não deveriam ser passíveis de cobrança, caso as leis fossem cumpridas pelos responsáveis com o rigor requerido



Nenhuma das vítimas recebeu Moção de Pesar na Câmara Municipal, 
mas aqui estarão sempre lembradas.

  • Ainda sobre o uso ilegal, ilegítimo, violento e assassino do cerol, é relevante registrar a matéria protocolada pelo vereador Othiniel Harfuch, que pede que o prefeito viabilize a distribuição gratuita de antenas corta-pipa para os "motoqueiros" (palavra dele). Ora, o mesmo vereador aprovou, no final do ano, o Orçamento Municipal para 2025 e no mesmo não há previsão orçamentária para isso. Por consequência, para essa matéria não ser classificada de oportunista e simplista, no mínimo ele deveria expor de qual linha orçamentária ele sugeriria a transposição de valores para atender a essa demanda. Embora, por esse motivo o atendimento à essa sugestão seja praticamente inviável para o prefeito Custódio, seria uma boa solução se ele (prefeito) atendesse ao pedido desse vereador que, na gestão anterior foi Líder de Governo e defendia incontinenti qualquer questionamento da Oposição, desqualificando-as, partindo até para ofensas com o uso de qualificativos depreciativos pessoas para os então vereadores da Oposição Du Tonin e Ana Maria dos Santos (que teve seu microfone cortado inúmeras vezes). Aguardemos se o prefeito Custódio será grato a ponto de viabilizar essa quase impossível solicitação.
  • Embora quantidade não signifique necessariamente qualidade no que tange às Indicações, registro que o vereador que mais protocolou Indicações foi o vereador Du Tonin, seguido pelo professor Sérgio.
  • Por último, vale registrar que os vereadores protocolaram Indicações para beneficiar os funcionários públicos, com destaque à Segurança e Saúde no Trabalho (vereadora Clélia dos Santos) e aumento do vale alimentação (Alexandre Peres). Mas de Inovação de impacto foi a Indicação do vereador Cebolinha que, inclusive subiu no púlpito para defender verbalmente, a sugestão de cuidados mais adequados quanto à Saúde Mental dos servidores com ações preventivas.
  • (continua...)

segunda-feira, 17 de fevereiro de 2025

Rua Antônio Zoppi

 



Antônio Zoppi nasceu no dia 23 de outubro de 1904, filho do imigrante italiano Cesari Zoppi e da senhora Teodora Cerqueira Leite e faleceu no dia 6 de abril de 1961 em sua residência, após ser confortado pelos santos sacramentos da Igreja Católica, onde sempre frequentou. Teve os filhos Gentil Zoppi, casado com Alayde Zoppi, Maria Mercedes Zoppi Bonito, casada com Rubens Bonito e Waldyr Zoppi, casado com Anita Zoppi.


No centro da imagem, Césare Zoppi e esposa. Os demais são os dez filhos: os homens Themístocles, Antônio, Rêmulo, Vitório e Homero e as mulheres: Duilia, Itália, Leonor Fausta e Ercília.
Antônio Zoppi é o de terno branco.


Foi construtor como o pai e, entre suas muitas obras em Indaiatuba, destacam-se o Cine Rex e o Cotonifício Indaiatuba.

Em 1996, o memorialista Nilson Cardoso de Carvalho escreveu que ... "presenciou o desmonte de uma de suas obras, que foi o prédio do Cotonifício Indaiatuba; quanta dificuldade e sacrifício para derrubar as formidáveis paredes internas, as colunas e vigas de concreto, o mesmo acontecendo no Cine Rex, também uma obra sua, pois era um dos principais projetistas-construtores de Indaiatuba, e não só construiu indústrias como também uma infinidade de residências."

Construção do Cine Rex, obra feita por Antônio Zoppi

Como vários membros da família Zoppi, Antoninho, como era chamado, tinha "uma vocação musical que cultivou desde menino". Quem afirma isso é Arquimedes Prandini, que conta ainda que "ele aprendeu música com o saudoso maestro Esterlino Minioli com a idade de treze anos e, após um ano, já tocava sax na Corporação Musical Internacional. Essa banda tocava num cinema de zinco chamado Cine Teatro Íris, que ficava onde mais tarde seria o Hotel Savioli, na Praça Prudente de Morais.

Hotel Savioli, ficava do lado esquerdo de onde atualmente é o Bradesco (Cine Rex) na Praça Prudente de Morais.

Cine Rex, construído por Antônio Zoppi e, do lado esquerdo, o Hotel Savioli


Os filmes que passavam no Cine Teatro Íris eram mudos, então uma banda musicalizava a obra ao vivo. Conta Prandini que "o músico tinha que tocar de ouvido porque o cinema era escuro e naturalmente não havia luz para ler a música e o Antoninho, nesse ponto era grande, pois era capaz de tocar dois dias seguidos sem repetir uma só música só de ouvido.

Em 1930 deixou de existir o cinema mudo e o Antoninho foi tocar na Corporação Musical 7 de Setembro cujo mestre era o grande músico Paschoalino Boffa. Nesse tempo começou a tocar trombone de harmonia, depois gênis e por fim tocava todos os instrumentos, exceto baixo e clarinete.

Lembro-me de que na família havia cinco irmãos e quatro eram músicos de banda: um é o senhor Themístocles, violinista e cantor; Rêmulo tocava o primeiro trombone, Vitório o primeiro pistão, Homero o primeiro clarinete e o Antoninho o primeiro bombardino. Os quatro faziam parte do canto.

Em um concerto que a nossa banda realizou na cidade de Itapira, o Antoninho fez um perfeito solo de gênis na música clássica 'Eva', arrancando calorosos aplausos de uma enorme assistência. Outra ocasião, na cidade de Salto, terra de grandes músicos, ele chamou a atenção de uma multidão que assistia um concerto com a nossa Banda ao executar, no bombardino, um solo quando da execução da ópera 'Aída": foi grandemente aplaudido.

O Antoninho gostava de tocar na procissão do enterro da Sexta-feira Santa e muitos ainda lembram se que seu irmão Rêmulo fazia com seu trombone, o canto; e o Antoninho o contracanto naquelas marchas fúnebres que que emocionavam qualquer cristão - por mais duro de coração que fosse.

Foi merecidamente presidente da Corporação Musical Sete de Setembro. Mas em 1942 por necessidade de extrair os dentes, nunca mais soprou um instrumento e assim também nunca mais tivemos o prazer de ouvir e sentir na alma aqueles acordes maviosos que saíam da alma daquele grande indaiatubano. Mas não parou nisso. Dedicando-se ao jornalismo amador saiu-se esplendidamente. [...] Era um grande humorista, inventava as piadas às vezes de improviso e quando saía com as suas era um estrondo, arrancando risadas do mais sisudo ouvinte."


quarta-feira, 12 de fevereiro de 2025

Os primeiros automóveis

Pelo ano de 1913 apareceu, em Indaiatuba um moço dentista cujo nome era Odilon. Morava em um velho prédio onde atualmente (1961) se acha o Hotel Candelária. Este dentista tinha um automóvel e esta foi a primeira vez que nós vimos esse tipo de veículo.

Aquele belo carro era de fabricação europeia e pintado em vistosa cor vermelho vivo. O sistema de direção era na direita, e o câmbio ficava por fora. Coisa difícil era fazer funcionar o motor. Tinha se que arranjar uma turma de crianças para empurrar o carro na Rua da Palha. Quando dava a primeira explosão, todos subiam no automóvel, mas logo parava novamente. Isto se repetia por muitas vezes. Um dia, após ser muito empurrado e ter ameaçado funcionar por muitas vezes, começou a fazer um calor abrasador. Odilon, que estava na direção, saltou do carro e abriu a tampa do cofre do motor. Nós vimos, então, que o cabeçote estava vermelho como brasa, pois o dono esquecera-se de pôr água. Naquele momento houve grande confusão quando o dono saiu gritando que iria explodir. Foi um salve-se que puder.

Em 1915, Zuzuca, filho de Nhá Felícia Doceira, ganhou dez contos de réis na “União Mútua”, e assim pôde comprar, também, um automóvel do mesmo tipo, se bem que a marca era Motobroque. A cor, porém, era aquela mesma de vermelho sangue. Com este carro, fazia algumas viagens e, certa vez, quando tinha que passar pela ponte de Itaici, Zuzuca mandou todos os ocupantes do veículo descerem, temendo que a ponte não resistisse ao peso do carro.

Logo a seguir, em 1916, apareceu um moço com um Ford de bigode. Este era o homem mais falado de Indaiatuba, porque era motorista. Para grande orgulho dos rapazes, estes podiam alugar, em quatro pessoas, o Ford, por dez mil réis a hora, e assim subiam a rua Candelária e desciam a rua 15 de novembro. Isto era uma grandeza para os rapazes, que depois ficavam a narrar o grande fato.

Por essa ocasião, para se fazer um estilingue, existia uma borracha preta quadradinha chamada “tripa de mico”, mas era vendida aos pares, por um preço muito alto e nem todos os moleques podiam comprá-la.  Foi aí que Eduardo Miguel Ferreira, que gostava muito de crianças, passou a aproveitar velhas câmaras de ar para cortar e vender muito barato à criançada. Para alguns meninos pobres, ele dava de graça. Por essa razão, a casa do Eduardo estava sempre cheia de garotos que queriam ter o seu par de tiras de borracha. E tudo isso porque o maior prazer dos moleques era caçar passarinho e até quebrar vidros de casas.

Mais tarde, apareceu por aqui e hospedou-se no Hotel Bela Vista de propriedade de Hemetério Rodrigues, um moço que tinha também um Ford de bigode. Este tipo de automóvel era provido de duas marchas. Quando a primeira não conseguia puxar, o jeito era descer e ajudar empurrando o carro.

No ano de 1920, Tico de Nhô Teco, um moço filho de um fazendeiro proprietário da fazenda Monte Branco (que mais tarde chamaria Fazenda Santa Alice, de propriedade de Rafael Cintra Leite) cujo nome era Felipe de Almeida, comprou outro Fordinho e o colocou na praça, mas logo vendeu-o para Francisco Boselli. Boselli era proprietário do Hotel Bella Jardineira e tinha dois cavalos pretos de rabos cortados, os quais puxavam um trole que servia para levar e trazer viajantes de Itaici. Vendeu os animais e comprou um Ford novo, por seis contos de réis.

Em 1921, Germano Stahl, que viera do sítio, vendeu o carro de boi comprou um Ford de um moço de Itu, e assim aprendeu a dirigir o carro. Foi aí que muita gente começou a vender carros de boi, carroças etc., para comprar caminhões e automóveis. Domingos Gaspar tinha um Chevrolet conhecido por melindrosa e com o correr do tempo foram aparecendo os últimos tipos como a Ramona, Cabeça de Cavalo, Pé de Bode... carros americanos que aqui surgiram eram denominados com esses nomes populares.

 O primeiro mecânico de automóvel que apareceu aqui foi Dito Giorgi; algum tempo depois, muitos outros aprenderam com ele a andar sujos de graxa.

Enfim, eis o que se pode chamar de uma grande dor de cabeça: um homem comprar um caminhão ou carro de passeio velho.

Para quem não tem o que fazer é até uma distração...

 

Primeira bomba de gasolina de Indaiatuba - década de 1930

Augusto de Oliveira Camargo (de chapéu) e a esposa Leonor de Barros Camargo em veículo perto do HAOC na década de 1930




Década de 1940





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Texto de Antônio Zoppi, originalmente publicado no jornal "Tribuna de Indaiá" da edição do dia 19 de fevereiro de 1961.


segunda-feira, 10 de fevereiro de 2025

Calçadas de Indaiatuba: elemento arquitetônico, político e de conflitos

 Eliana Belo Silva

 

[...] mesmo numa cidade perdida nos confins da história ou da geografia há pelo menos uma calçada ou praça que é de todos e não é de ninguém. (Raquel Rolnik, 2004, p.20)


SOBRE A FUNCIONALIDADE DAS CALÇADAS

   Neuza Zattar, em seu texto “Calçadas: espaços públicos ou privados?” propõe um estudo sobre a natureza das calçadas, demonstrando, em um discurso jurídico, após o estudo das leis na cidade de Cáceres, no Mato Grosso, que as calçadas são apropriadas pelos cidadãos que, amparados pelas leis, fazem seu uso privado, em fenômeno que ela define como invasionismo. A definição advém de inúmeros casos nos quais vê-se que as calçadas deixaram de ser um passeio público e passaram a servir aos interesses privados a tal ponto de interditar o acesso aos pedestres.

    O invasionismo citado pela autora foi, durante muitos anos, denunciado pelo Padre Xico no jornal indaiatubano Tribuna de Indaiá, quando ele era articulista semanal e insistentemente reivindicava providências sobre a ocupação dos passeios públicos por mesas e cadeiras de bares e restaurantes. A autora citada define o conceito como a presença de equipamentos "permitidos ou legais (postes de iluminação e de trânsito; telefone público [orelhão], hidrômetros), entre outros; e equipamentos não permitidos ou ilegais (os mobiliários comerciais, jardins, entulhos, plantação, publicidade, comércio ambulante), e outras funções imputadas às calçadas, que estabelecem limites ou interdição à passagem do pedestre". 

    Há, pois, uma tensão entre os que disputam os espaços para passeio e fins particulares e/ou comerciais e considerando a multiplicidade dessas funções, a autora ainda afirma que "a referência do invasionismo não é fixa, não é estável, e muda conforme a relação que o pedestre estabelece com a interdição material e simbólica que se interpõe em seu caminho".

        Considerando esta "instabilidade", o Arquiteto e Urbanista Charles Fernandes, reconhecido por ser um estudioso do espaço indaiatubano e sua ocupação, pontua que "os passeios públicos, são o limite em degradê do público e do privado na cidade. Fazem parte, e são propriedade do sistema viário público, mas sua manutenção e construção são responsabilidade do proprietário do lote. Acomoda mobiliário urbano público, mas também é usado como acesso dos lotes, recebe lixeiras, rampas para garagens, pode ser utilizada em estabelecimentos como área de atendimento."

Zattar também ainda cita Aldaísa Sposati, que defende que 

"a calçada é o espaço que interliga vizinhos, amigos e conflitantes, em usos e ocupações. Daí dizer que a calçada não é compreendida somente como espaço físico, geográfico ou ambiental, mas como espaço simbólico que significa pela sua história, pela conviviabilidade e conflitos entre vizinhos, passantes e ocupantes e pela demarcação de um território que é público pela localização na espacialidade da cidade, e privado pela re-funcionalidade que lhe é atribuída."


SOBRE UM POUCO DE HISTÓRIA

    A história das calçadas em Indaiatuba foi objeto de registro, pela primeira vez, em texto escrito pelo memorialista Antônio Zoppi, que era construtor e privilegiou os métodos construtivos em sua análise, conforme texto escrito e publicado 1960:

“Há mais de cinquenta anos [portanto, início do século XX], as calçadas de Indaiatuba eram feitas com lajes vindas de Itu [varvito]. Tais pedras variavam no tamanho e, após a cintadas as juntas entre elas, eram enchidas com cimento. Havia pessoas que entregavam essas lajes na soleira de suas residências. Acontece que este tipo de pedra é de fácil desgaste; então, não foram mais aproveitadas para a soleiras, nem para a calçadas. Estas começaram a ser feitas de tijolos cimentados, roletados e riscados, imitando lajes.

Devido ao calor abrasador do sol de verão, as calçadas cimentadas dilataram-se e naturalmente abriram-se fendas, ficando fácil para as águas pluviais penetrarem.

No ano de 1924, quando meu pai [o construtor Césare Zoppi] construiu o prédio para a Empresa de Força e Luz de Jundiaí, o engenheiro quis que a calçada defronte ao prédio fosse feita com ladrilhos de cimento de doze quadros e assentados com argamassa mista. O mesmo ocorreu no ano de 1945, quando eu construí o Cine Teatro Rex. Como eu tinha visto em Rio Claro ladrilhos de cimento de nove quadros, coloquei defronte do cinema o mesmo tipo de ladrilho. Mas é necessário compreender que estes ladrilhos foram adquiridos em Campinas. Mais tarde, ao asfaltarem as ruas da cidade, foram colocadas guias de granito com nível diferente do já existente. Quer dizer: as calçadas ficaram estragadas.

A Câmara Municipal aprovou uma lei que regulamentava a construção de calçadas para serem feitas com ladrilhos de cimento de nove quadros e cujo serviço era feito pelos construtores e fabricantes de ladrilhos da cidade. Mas a ignorância e a falta de competência dos fabricantes de ladrilhos implicaram na confecção dos ladrilhos, os quais eram feitos não se observando um processo especial, e sim tais ladrilhos eram feitos comumente. Ora, o efeito se fez surgir quando, com o calor solar, os ladrilhos soltavam-se da argamassa. Talvez os fabricantes não soubessem que existe a dilatação dos corpos com o calor; podemos admitir isto, então, a culpa cabe somente a eles porque os ladrilhos feitos em Campinas também sofriam a dilatação, é lógico, mas não se destacavam da argamassa. O exemplo marcante dessa afirmativa são as calçadas feitas defronte à Empresa de Luz e Força e do Cine Rex que, para serem demolidas, foram necessárias picaretas o que não alcança não acontecia com as calçadas feitas de ladrilhos de Indaiatuba: estes com simples tropeção, já saíam.

O mais bonito é que a Prefeitura, em vez de mandar um técnico no assunto examinar a causa de tudo, isso obrigar os fabricantes a manufaturarem os ladrilhos com a mesma técnica de Campinas, e continuar as calçadas com o mesmo tipo de ladrilho, achou que aqueles ladrilhos não serviam para a calçada e ideou fazer com pedrinhas de basalto o que se chama de mosaico português. Eu creio que “portugueses” no outro sentido da palavra, foram esses que acharam de modificar o tipo da calçada. Será que não tinham um pouco de massa cinzenta, para ver que se faria uma mistura de tipos e tirar-se-ia a estética? Bem já que veio “de cima” tinha que ser feito; mas quem de Indaiatuba poderia fazer essa calçada?

Não havia ninguém aqui que soubesse executar aquele mosaico e o remédio foi trazer gente de outras localidades. Com tanto serviço para fazer, começou a concorrência entre muitos daqueles que vieram para Indaiatuba unicamente para assentar essas pedrinhas. Mas nem todos que vieram eram honestos e a concorrência de preços incidiu sobre o trabalho. Usou-se a má fé, e os serviços executados deixavam muito a desejar...

Isto não é nada se considerarmos que quando requeremos uma ligação de água domiciliar, a caixinha de ferro onde será colocado o registro e que deve ser assentada na calçada, nós pagamos, mas a falta de fiscalização e coisas mais, faz com que muitas calçadas fossem feitas e, a caixinha de ferro, nem por sonho...

Uma boa iniciativa do atual prefeito [Alberto Brizola] foi facilitar, a todos os proprietários, para que eles fizessem calçadas; para isso ordenou que se fizesse um orçamento por metro quadrado de um tipo de calçada de concreto, como se faz em São Paulo; este tipo é muito mais barato que as pedrinhas portuguesas. Bom até aqui; porém não ficou nessa: eis que apareceram os “empreiteiros” entre aspas, porque de empreitada não entendem nada - e se puseram a fazer calçada de tijolos cimentados; mas não de tijolos cimentados, roletados e riscados como antigamente; mas sim de tijolos cimentado imitando os ladrilhos de nove quadros. Não podemos negar que fica bonito. mas esperemos o correr do tempo...

Enfim, Indaiatuba merece o que tem. Em tipos de calçada, é campeã. Se tudo isso for erro, errar é humano; mas não tanto assim...”

 



Calçadas de Indaiatuba (1): As duas fotos acima (2025) respondem à pergunta proposta por Antônio Zoppi em 1960

 

SOBRE POLÍTICAS PÚBLICAS 

A organização de um espaço híbrido entre o público e o privado deve ser escopo de ordenação para manter os cidadãos nos limites de seus deveres públicos. Embora pareça ambíguo, pois em nossa cidade  ela seja conceitualmente um passeio público, a responsabilidade pela execução é do proprietário do lote, fazendo, com que muitas vezes, ela seja tratada como "propriedade privada", urge que requisitos legais e regulatórios disciplinem o uso, reduzindo as instabilidades.

Mesmo com leis que exigem a acessibilidade nas calçadas sendo editadas desde a década de 1980 nas esferas federal e estadual, Indaiatuba ainda não possui uma Lei Municipal consolidada específica para tal fim. Charles Fernandes pontua que há sim, alguns regramentos que devem ser considerados: a norma ABNT NBR 9050, por exemplo, que estabelece critérios e parâmetros técnicos a serem observados quanto ao projeto, construção, instalação e adaptação do meio urbano e rural, e de edificações quanto às condições de acessibilidade, que embora não resolva uma as demandas aplicáveis aos passeios públicos, pode ser complementada, em certa parte, com o Plano Diretor de Mobilidade Urbana de Indaiatuba, que sugere (mas não normatiza) diversas soluções para tornar os passeios universalmente acessíveis, enxergando o pedestre em posição equalitária aos outros modais de transporte. Fernandes ainda complementa que é necessário "criar um dispositivo legal que entenda os passeios públicos de forma mais ampla, enxergando toda a sua relação com a cidade, as pessoas, a mobilidade, o meio ambiente e o desenvolvimento econômico e social."


Os vereadores da Câmara Municipal não possuem alçada para apresentar Projeto de Lei com esse escopo, sendo essa responsabilidade de cunho exclusivo do Prefeito. Mesmo assim, os vereadores locais já pautaram o assunto inúmeras vezes, apresentando a necessidade através de Indicações protocoladas e apresentadas no Plenário. De acordo com o que pode ser consultado no site da Câmara Municipal, todo o conjunto de trabalho dos vereadores neste sentido, está parado na Secretaria de Relações Institucionais e Comunicação, ou ainda: não é possível consultar se tramitou ou não a partir dali e quais foram as atitudes tomadas.


Confira abaixo as matérias dos vereadores apresentadas no ano passado (2024) sobre o tema:

Implantar um programa para a padronização das calçadas do município com base no princípio de acessibilidade universal.

Autoria: ALEXANDRE CARLOS PERES

Realizar fiscalização quanto aos padrões adotados nas calçadas do município.

Autoria: ANA MARIA DOS SANTOS

Realizar estudos técnicos e tomar providências quanto à acessibilidade das calçadas em nossa cidade, visando garantir o trânsito seguro e acessível para todos os pedestres, especialmente pessoas com deficiência (PCD) e mobilidade reduzida.

Autoria: ANA MARIA DOS SANTOS

Realizar estudo de viabilidade e aplicar as ações decorrentes para incluir a calçada no Projeto Arquitetônico de novas obras.

Autoria: EDUARDO TONIN

Intensificar a fiscalização para construção de rampas de acessibilidade nas calçadas de diversos bairros.

Autoria: SÉRGIO JOSÉ TEIXEIRA



Calçada de Indaiatuba (2): É para atravessar na faixa ou não?
Esta é uma cena comum quando o sistema viário tradicional das cidades se depara com novas necessidades, como por exemplo, cruzamentos em vias antigas que possuem curvaturas que proporcionam pouca visibilidade. A faixa de pedestres  RECUOU, para que o veículo possa ter maior visibilidade sem invadir seu domínio. A faixa é elevada para proporcionar área acessível ao pedestre, sem degraus. No entanto, outra lei, obriga a esquina a ter rampas acessíveis, neste caso, levando  o pedestre direto para via, fora da faixa. Em cidades que possuem projetos ARROJADOS para acessibilidade, é  usado o piso dos passeio na faixa de pedestre, para que se perceba que a prioridade de uso daquela área é do pedestre. (Imagem e parecer de Charles Fernandes).

terça-feira, 4 de fevereiro de 2025

Rua Padre Francisco Eduardo Paes Moreira

"Lá pelo ano de 1913, chegou em Indaiatuba um padre português de nome Francisco Eduardo Paes Moreira. Vinha substituir o Cônego Oscar Sampaio Peixoto, um moço muito alegre e divertido, pois gostava de brincar de barra-manteiga com as crianças ao lado da igreja. Porém, havia ficado pouco tempo quando chegou o novo padre.

A casa paroquial era um prédio muito antigo, feito de barrote então em estado precário. O o padre Moreira, pouco tempo depois de sua vinda, fez amizade com meu pai (1), pois eram vizinhos. Não tardou para que fosse feito um contrato para construção de uma casa paroquial nova. Em 1914, isto teve início, com a derrubada da velha casa e a construção da outra.

A nova casa era enorme, com vários dormitórios; no lado do quintal construíram-se muitas arcadas, seguindo-se o sistema romano. Mas eis que surge um imprevisto: faltou dinheiro e o acabamento da casa forçosamente parou, ficando toda a parte externa sem revestimento. Mesmo parando o serviço, restou uma dívida, que o padre teve de saldar aos poucos; aos domingos meu pai recebia pequenas parcelas de dez a quinze mil réis, esmolas dadas durante a missa.

O padre, logo após mudar-se na nova casa, começou a trabalhar em seu quintal; primeiramente ajuntou todos os cargos de telhas e tijolos com as próprias mãos e atirava-os na Rua São José, por cima da taipa. A tarde inteira via-se aqueles cacos amontoarem-se na rua, vindos, um por um, do quintal da casa paroquial. Desta maneira, o padre conseguiu limpar o terreno e plantar; trabalhava arduamente com a enxada e, quando alguém o procurava, só depois de muito bater na porta é que o padre vinha atender, sem a batina e com a calça feita de dois panos diferentes.

No Largo da Matriz existia uma ‘avenida’ ladeada de palmeiras, plantadas quando da construção do largo; essas palmeiras elevavam-se a enormes alturas de mais de vinte metros, e nos dias de vento forte, desprendiam se as folhas grandes, estatelando-se no chão com um tremendo estrondo. À noite, então, a molecada aproveitava as grandes folhas para brincar e arrastavam-nas pelo Largo. O barulho, porém, era ensurdecedor e atormentava os moradores da vizinhança, principalmente uma escola noturna de adultos que havia na esquina. O mestre ficava furioso e saí a correr atrás dos moleques - mas pegar, como? Então, querendo surpreendê-los, escondia-se atrás da porta; mas nem mesmo assim conseguia o seu intento, pois a molecada era esperta por demais.

A fachada da nossa igreja defronte ao Largo era lisa. Onde agora estão as torres havia apenas quatro efeitos de cimento em forma de pião. O sino ficava mais abaixo, na janela ao lado.


IGREJA NOSSA SENHORA DA CANDELÁRIA SEM AS TORRES


No limiar de 1915, veio para cá, a fim de passar uns dias e sua terra natal, um indaiatubano muito rico e católico de nome João Bueno de Camargo. Hospedou-se no Hotel União situado à rua 7 de Setembro. O nosso padre, então, teve a ideia de ir pedir um auxílio para a paróquia. A nobre pessoa inteirou se de tudo que faltava e às suas expensas mandou meu pai construir as torres da igreja; esse serviço muito melhorou a fachada do templo católico que até hoje, desafia o tempo.

Depois, o padre trocou toda todas as imagens dos altares e a imagem de São Benedito foi transferida para a fazenda Cachoeira. Nas paredes da capela-mor colocou enormes quadros pintados a óleo, focalizando cenas sagradas. Construiu os primeiros armários embutidos na sacristia da igreja, aproveitando a grossura da parede de taipa. Ainda mais, em 1919, mandou fazer uma grande reforma na capela-mor, tirando todo o assoalho e degraus de tábuas velhas, trocando-os por degraus de mármore de Carrara e por mosaicos de diversas cores, feitos em São Paulo.

Por ocasião da primeira conflagração mundial, o padre era a favor dos alemães, mas não se manifestava abertamente e nem discutia política. Foi sempre um homem trabalhador e de pouca conversa. Seu passatempo à noite era ir à Farmácia Candelária e lá ficar com vem conversando, até que o sino da cadeia batesse a recolhida, geralmente às 21 horas. Nessa hora, porém, o padre estava recurvado e sentado ao contrário - dormia no encosto da cadeira. Nessa ocasião, o pobre homem já sofria do estômago. Com muito sacrifício, arranjou o dinheiro e, no ano de 1920, partiu para a sua terra natal a fim de fazer uma intervenção cirúrgica. Mas, em meio à viagem veio a falecer sendo sepultado no mar.

 Indaiatuba já tem uma rua dentro denominada Padre Bento Dias Pacheco e não seria demais ter outra com o nome do Padre Francisco Eduardo Paes Moreira." (2)

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No dia 12 de novembro de 2020, após Projeto de Lei apresentado pelo vereador Alexandre Peres, o então Prefeito Nilson Alcides Gaspar sancionou a Lei Municipal 7484 para homenagear o Padre Francisco Eduardo Paes Moreira, que você pode ler aqui.

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Notas de Eliana Belo Silva:

(1) O pai do autor é o italiano Cesare Zoppi, construtor que migrou da Itália para o Brasil no final do século XIX. O texto foi publicado originalmente na Tribuna de Indaiá e, em 1998, foi publicado no livro "Reminiscências de Indaiatuba", de Antônio Zoppi.

(2)  Antônio Zoppi, indaiatubano que nasceu em 23 de outubro de 1904.


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