Denise Stein Rezende da Silva
Dizem que a memória retém os fatos mais marcantes em nossa vida, aqueles que nos deixaram marcas, portanto, os mais felizes e agradáveis e (ou) os mais desagradáveis e tristes. É por isso que dizemos “Não quero nem lembrar” quando nos referimos a uma lembrança triste; e dizemos “É inesquecível” ao nos referirmos a um momento alegre.
É assim que me lembro do Bar do Nato: lembranças boas, agradáveis, alegres, inesquecíveis. Eu era menina ainda e freqüentava o bar de vez em quando juntamente com meus pais e irmãos, quando saíamos do cinema.
“Bar Dom Pedro II” – nome pomposo, de imperador! Porém, era popular e carinhosamente conhecido como Bar do Nato e ficava na rua XV de Novembro esquina com a Padre Bento Pacheco. Eram seus proprietários os senhores Fortunato Deltreggia, o Nato e Antônio Farinello, o Toninho.
Tudo começou por volta de 1943, quando o Sr. Fortunato comprou um pequeno bar e quitanda do Sr. José Luis Fonseca. Na ocasião, o Sr. José Lima era seu sócio, sendo substituído anos mais tarde pelo Sr. Toninho. Ficaram juntos até 1962, quando foi vendido para o Sr. Pedro Tomitake.
O Bar do Nato era um local gostoso e divertido e obteve seu auge na década de 1950. A cidade não possuía clube e o bar era um excelente lugar para ir com a namorada ou namorado, encontrar amigos e jogar conversa fora, ou mesmo discutir sobre futebol ou política. Era bem freqüentado, tanto no sentido de estar sempre lotado, como no sentido de pessoas de bem: eram conhecidos, amigos, torcedores do Primavera, casais, famílias, políticos – sobretudo vereadores. E até artistas, uma vez ou outra. Como pessoas famosas que passaram por lá, lembramos Mazzaropi, Costinha, Jânio Quadros. No dia em que Mazzaropi ali esteve, acomodou-se no reservado do bar mais ao fundo e começou a contar anedotas. A sala foi se enchendo, enchendo e de repente estava lotada!
Era assim: por um motivo ou por outro, sempre estava lotado, mesmo que fosse simplesmente para tomar um sorvete! E que sorvete! Não existia nenhum outro lugar onde se fizesse sorvete tão delicioso. O meu picolé preferido (dizia-se na época ‘sorvete de palito’) era o de coco-queimado, e o de massa, era o de ameixa. Mas havia outros sabores, como coco, milho verde, abacaxi, flocos, esquimo – este era novidade (coco branco envolto em casca de chocolate, e detalhe... o dobro do preço !). Os sorvetes eram incomparáveis!
E quem não se lembra do lombinho? E do famoso bauru? E da bisteca na chapa servida com arroz, ou do lanche de lingüiça? E do churrasquinho... da caipirinha ... É tudo inesquecível! Com o lanche de linguiça na chapa inaugurava-se o primeiro lanche quente na cidade. Era um sucesso! Aos sábados, os espetinhos para churrasco eram preparados no quintal, no fundo do bar e o freguês tinha a liberdade de se dirigir até lá e escolher o seu.
Dos quitutes servidos no bar, o mais famoso era o bauru. O Nato e o seo Toninho adquiriram um aparelho elétrico próprio para preparar bauru: era uma caixa de metal com quatro aberturas; o queijo e o presunto eram arrumados sobre uma espátula comprida, e esta era introduzida na abertura; ali eles eram esquentados, meio torrados. O bauru tinha um sabor especial, exclusivo e soberbo.
Lá pelo ano de 1954 ou 1955, surgiu o chamado liquidificador, sim, o eletrodoméstico! Era algo desconhecido até então, ausente totalmente nos lares brasileiros. Um dia, meu irmão chegou em casa dizendo: “Mãe, no Bar do Nato, tem um aparelho novo que tritura as frutas, misturadas com leite e dá um refresco delicioso!” Era a vitamina de frutas, que finalmente estávamos conhecendo ! Foi um sucesso! Ali se fazia o melhor suco de frutas ou vitamina. Inigualável!
Mas não era só por causa dessas peculiaridades que o bar era um sucesso... A maior causa desse sucesso vinha dos próprios proprietários, que eram simpáticos, gentis, corteses e alegres, inspirando satisfação e deleite aos seus fregueses. Também existia uma amizade fraterna, amizade verdadeira entre eles e nós, os fregueses e clientes. Uma simpatia que irradiava alegria no ambiente.
Era assim o Bar do Nato: bonito, gostoso, simpático, alegre e prazeroso! Era assim!...
(*) texto originalmente publicado no livro "Um Olhar sobre Indaiatuba", da Fundação Pró-Memória de Indaiatuba, a venda no Casarão do Pau Preto.
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