Eliana Belo Silva
Historiadores e outros cientistas de humanidades possuem o hábito de atribuir nomes a períodos ou processos históricos, principalmente para organizar o tempo e tornar a História uma ciência mais compreensível para a maioria das pessoas, objetivo este que é difícil de alcançar. Esses títulos que possuem essa intenção didática, ajudam: (1) a identificar acontecimentos importantes diante da grandeza dos fatos (mesmo em um período ínfimo de cem dias), (2) a estudar causas, fatos e consequências de forma mais clara, na medida em que é possível expandir esses itens a partir de um ponto simbólico e (3) ajuda a facilitar a compreensão de um macro período e seus impactos aplicáveis nas mudanças políticas, sociais, econômicas e culturais a partir de um único marco.
Com base nessas premissas, eu defendo que o melhor título para os 100 primeiros dias da Legislatura 2025/2028 para a Câmara Municipal de Indaiatuba seja "R.I.P. Maestro Marcelo Antunes Martins" (1).
A morte dele é um marco simbólico, e como tal, é fundamental para entender - sem exagero - como a cidade entende a si mesma, como constrói sua identidade, como interpreta o mundo ao seu redor no período estudado (repito, mesmo que seja ínfimo como o conjunto de cem dias).
Essa perda é - como todos os marcos simbólicos como datas, monumentos, narrativas, etc. - um acontecimento que deve formar a memória coletiva e o imaginário social de nossa cidade. A morte dele não vai e não deve ser em vão. É a tragédia nomeando um capítulo de nossa história, facilitando a leitura e compreensão dos fatos, para sempre.
Produção Legislativa
- 42 Projetos de Lei foram protocolados em cem dias (até dia 10 de abril).
- O primeiro Projeto de Lei (PL) foi protocolado pelo Prefeito Custódio e derivou a Lei 8274 suspendendo aprovação de novos loteamentos e condomínios verticais familiares. Só não foi dito que havia, na data, um conjunto de mais de 60 empreendimentos desta natureza tramitando. O ex-prefeito Nilson Gaspar também sancionou lei como essa no primeiro dia do seu mandato em 2017. A justificativa dada pelo prefeito Custódio foi que a "medida é necessária para que se possa estruturar melhor as questões relativas à infraestrutura urbana, a fim de garantir que seja mantido o desenvolvimento sustentável da cidade".
- Dos 42 Projetos de Lei protocolados, 10 foram retirados pelos próprios proponentes, mas o que mais chamou a atenção é o de número 32/2025. O PL foi apresentado pelo prefeito com o objetivo de qualificar as chamadas OSS - Organizações Sociais de Saúde, que são entidades privadas sem fins lucrativos que podem gerenciar serviços de saúde do SUS em regime de parceria público-privada (PPP). Em outras palavras, a gestão do prefeito - que é dentista do SUS, e do vice - que é médico do SUS, pretende privatizar a saúde mais do que já é. A justificativa para retirar o PL foi que "novos estudos serão feitos". Por ter sido retirado, só discorrei sobre essa matéria quando e se ela voltar para legitimar que UBSs, UPAs e outras unidades de saúde passem a ser geridas por particulares.
- Dos 32 Projetos de Lei do período que tramitaram ou estão em tramitação, 7 foram para nomear ruas e outros cinco foram para criar datas ou períodos alusivos para serem inseridos no Calendário Municipal, entre eles os mais necessários - se derem resultado - foram: (1) a Semana de Prevenção à Gravidez na Adolescência (Dr. Túlio) e o (3) Férias Turquesa, da vereadora Clélia dos Santos, para promover ações contra o cerol e outras armas similares.
- Assim, dos 32 Projetos de Lei protocolados e que já tramitaram, apenas seis projetos sobraram dessas necessárias (muito necessárias!) exceções.
- Entre os seis, destaca-se apenas o de autoria do Prefeito, que repassou verbas para duas entidades: Centro de Convivência Amor Sem Limites - CECAL e Lar de Velhos Emmanuel, (2) de autoria do prefeito Custódio Tavares.
- 4 Projetos de Decreto Legislativo foram protocolados em cem dias (até dia 10 de abril).
- Três deles já tramitaram e constam no repositório da Câmara Municipal como Decretos Legislativos aprovados: (1) a homenagem que o vereador Cebolinha fará para o Sr. José Antonio Siscari, atribuindo título de Cidadão Indaiatubano, (2) a aprovação das contas do Prefeito Nilson Gaspar do ano de 2022 e a mais polêmica: (3) a aprovação da viagem do prefeito para o Reino Unido, um mês e meio após a sua posse.
- O Prefeito Custódio Tavares licenciou-se, com autorização da Câmara Municipal, entre os dias 15 a 22 de fevereiro para participar de evento sobre Mobilidade Urbana promovido pela empresa Yunex Traffic, que vende "soluções inteligentes de gerenciamento de tráfego", segundo o portfólio disponível no site dela. O prefeito anunciou, em evento no Sesi de Indaiatuba no Dia Internacional da Mulher, que a viagem foi "muito proveitosa" e que até o meio do ano a Secretaria de Transportes Mobilidade Urbana estará funcionando, "conforme compromisso de campanha". Trata-se de uma demanda urgente na cidade, pois o trânsito - item mais complexo do conjunto de ações para melhorar a mobilidade é, depois da Saúde, o serviço que mais recebe críticas da população.
- 2 Propostas de Emenda à LOMI - Lei Orgânica Municipal foram protocolados em cem dias (até dia 10 de abril).
- Uma está em tramitação e a outra já está no repositório da Câmara Municipal: é a Emenda a Lei Orgânica No. 006/2025, proposta de autoria dos vereadores Túlio José Tomass do Couto, Alexandre Carlos Peres, Hélio Alves Ribeiro e Leandro José Pinto.
- Essa Emenda 6 versa sobre o Artigo 181 da LOMI, que descreve o apoio e incentivo às práticas esportivas em caráter amador no município. Cinco incisos foram acrescidos sobre o caráter desses apoios e incentivos: (I) que será prioritariamente no âmbito educacional, (II) que inclui a formação de equipes de base e formação, (III) que haverá apoio em eventos, (IV) que incentivará o esporte com pessoas com deficiência. Até aí, os acréscimos foram claros, necessários e até óbvios do que se espera de uma Secretaria de Esportes cujo objetivo são os esportistas locais. Mas o inciso V contraria de forma literal o artigo no que tange ao foco, que é o esporte amador, legislando que a Secretaria de Esportes passará a apoiar "eventos ligados ao esporte de alto rendimento para equipes e entidades esportivas que representam o Município em competições regionais, estaduais, nacionais e internacionais". Os autores justificaram que "a nova redação pretende garantir uma estrutura mais abrangente e inclusiva, contemplando diferentes segmentos esportivos e reforçando o papel do esporte". Mas não explicitaram como aplicarão esse "aumento de abrangência" para essas equipes de alto rendimento nessas competições fora da cidade, nem como/quanto isso irá funcionar/impactar no Orçamento. Para quem conhece e valoriza a História, principalmente como meio de aprender com os erros para evitá-los e considera antiga ADI - Associação Desportiva Indaiatubana e como ela funcionou - ficam muitas questões, como por exemplo: como serão feitas as dotações orçamentárias, como serão firmados os acordos (ou algo que o valha - com nome mais adequado) e sobretudo qual retorno isso dará.
Gestão e Controle da Qualidade da Produção Legislativa
Com a palavra, os vereadores
Até agora pode-se afirmar com absoluta certeza que essa é a Legislatura mais quieta da História quanto ao uso do púlpito. Os edis usam a palavra para defender suas sugestões através das Indicações e para prover homenagens através de Moções, muitas vezes questionáveis.
Mas abdicam de justificar seus votos quando se trata de Projetos de Leis. Nem os próprios projetos eles defendem. Não justificam o motivo de optarem por aceitar os Projetos de Lei em regime de urgência, nem por não aceitarem. Se omitem e, nesses casos, nem precisam falar: o silêncio grita mais do que as palavras; mostram a subserviência e outras definições que evitarei aplicar.
Os dois vereadores da Oposição são os únicos que toam a iniciativa para usar a Palavra Livre e o Líder de Governo (Cebolinha) ou o Presidente da Mesa em exercício no momento (geralmente Alexandre Peres) respondem, geralmente de forma evasiva e sem contra-argumentarem perante conteúdos objetivamente expostos até com números rastreáveis. Partem para defender o Governo sob aplausos de suas assessorias e isso não é uma crítica, é um registro: fazem o que é obrigação. Escolheram esse papel e ponto.
De todos os debates, o de maior destaque positivo foi o que aconteceu entre o vereador da Oposição Du Tonin, que trouxe números defendendo a viabilidade de um Hospital Municipal e a resposta do Líder de Governo Cebolinha, que mostrou o gráfico ascendente dos atendimentos de pacientes com suspeita de dengue nos últimos três meses. Ambos argumentaram, mostraram números, informações sólidas e assim apresentaram o conteúdo civilizadamente, sem necessidade de competir ou ganhar, como acontecia cansativa e irritadamente na Legislatura passada. Discorrer sobre assuntos controversos é uma prática essencial em qualquer sociedade democrática. A troca de ideias divergentes, quando feita de forma civilizada, não só enriquece o debate público, mas também promove a compreensão mútua, a tolerância e a coesão social. E os presentes agradecem quando não se subestima a inteligência dos outros.
Sobre as Indicações, as sugestões dos vereadores continuam sendo, na maioria, em relação ao trânsito e, em segundo plano, um conjunto de pedidos referentes à zeladoria do município. Quando eu puder entender qual é o motivo que um vereador da Base do Governo precisa defender em púlpito que um buraco seja fechado (em vez de conversar diretamente com o Secretário), eu volto aqui, edito e explico. Por enquanto - fica só a dúvida - e isso não é uma ironia.
Ainda sobre as Indicações, não há como levantar estatísticas. O site da Câmara Municipal possui um repositório com 820 Indicações apresentadas nesses 100 dias, o que dá robustez para afirmar que há eficiência. Quanto à eficácia e efetividade, é impossível saber: segundo o site da Câmara, todas essas matérias estão paradas na porta do Gabinete do Prefeito, na Secretaria de Comunicação Institucional, sem respostas consultáveis.
Para registrar uma análise mínima as mídias dos vereadores foram consultadas, mas não é possível saber o quanto de eficácia ou efetividade há na produção de seus gabinetes. O vereador que mais demonstrou os resultados de suas Indicações (mais ainda assim poucas delas) é o vereador Índio da 12. O blog procurou o vereador para obter mais informações sobre essa prática bacana do gabinete dele, mas a assessoria informou que para entrevistá-lo teria uma fila, então a conclusão ficou inviabilizada, por conta da temporalidade do texto. E isso também não é uma ironia.
As palavras mais referenciadas pelos vereadores nestes cem dias foram CEROL e DENGUE. E é por esse motivo que termino retornando ao conteúdo da introdução deste longo registro.
O notável Maestro Marcelo Antunes Martins morreu neste verão de 2025, sua vida esvaiu-se cerca de 20 minutos após ele chegar em casa, retornando da busca por atendimento médico. Vitimado pela dengue, vídeo divulgado por uma familiar relata claramente que ele foi vítima da falta de eficiência mínima.
Ouvindo o relato, evidencia-se que ele foi subatendido, subouvido, subescutado, subpercebido, subconsiderado. O protocolo para atendimento de pacientes com suspeita de dengue não foi aplicado nele. O direito à vida foi-lhe subtraído. Ele foi negligenciado... e morreu.
Ele jaz em um Sistema falho, que superlotou as unidades de Saúde com muitas pessoas incapacitadas. Um Sistema que também é subfiscalizado, pois quem deveria fazer isso, está no conforto de sua mesa em um ambiente com ar condicionado e Wi-Fi para conferir os likes advindos do marketing pessoal.
____________________________________________________________
(1) Sobre o Maestro Marcelo Antunes Martins, você pode ler aqui, aqui e aqui.
__________________________________________________________________
ANEXO I -
Vereador Prof. Sérgio responde ao blog os motivos que o levaram a votar de forma favorável ao Projeto de Lei sobre o reajuste dos funcionários públicos municipais, inclusive em Regime de Urgência:
Prezada Eliana Belo.
É muito bom ter veículos de
comunicação sérios para que possamos esclarecer nossas ações enquanto
representantes políticos do município de Indaiatuba.
Sobre não utilizar o púlpito,
quero deixar claro, que desde 19 de fevereiro de 2025 venho em tratativa com o
executivo para analisar com cuidado e respeito a valorização ao servidor público
municipal e naquele momento a exaltação de alguns presentes atrapalhava a todos
que tentavam falar, então preferi não usar o púlpito, mas falei com vários
servidores que estavam presentes, antes e após a sessão, assim como também
conversei com vários servidores de diversas secretarias nas semanas anteriores.
Enquanto vereador, protocolei o
ofício 72/2025, solicitando ao executivo um estudo para aplicar ao menos 10% de
reajuste salarial e se possível dobrar o valor do cartão. Além de protocolar o
ofício ainda fiz algumas reuniões com a chefe de gabinete institucional,
Graziela Garcia e com o prefeito Dr. Custódio Tavares, que explicaram a real
situação.
Concomitante a essas ações, fui
acompanhando os bastidores das negociações da Apeoesp e dos Sindicato dos Servidores,
e observando a postura dos professores e demais servidores do município, tais
como saúde, segurança e outros.
A proposta do executivo foi de um
repasse no salário de 5,5% e um aumento real nocartão alimentação que passará
de R$ 504,00 para R$ 1.200,00, aumentando o poder de compra de todo servidor
municipal, sem incidência no desconto do Imposto de Renda e Seprev, e atendendo
todos os 6274 atuais servidores. Um investimento mensal de R$ 7.528.800,00, aumento
significativo de 138,90%, ou seja, investimento anual de R$ 90.345.600,00,
apenas em cartão alimentação.
Quanto ao voto em regime de
urgência, foi para que o executivo tenha o tempo hábil de organizar a folha de
pagamento e não atrasar o repasse a ninguém, ou seja, pensando no servidor ou
pelo menos na maioria deles, agilizando também o processo de liberação para que
a prefeitura realize licitação da empresa que fornecerá os cartões, visto que
as negociações já haviam sido tratadas anteriormente e que em uma assembleia de
um dos sindicatos, de acordo com informações de alguns que participaram da
assembleia, a aprovação pela proposta do executivo foi de mais de 70% dos
presentes.
Alegar desconhecimento das
negociações é algo surreal e oportunista, visto que durante o mês de fevereiro
os sindicatos se pronunciaram, protocolei o ofício citado acima e divulguei em
minhas redes sociais, além de muitos servidores comentarem sobre as tratativas
em diversos lugares e eventos que nos encontrávamos.
Claro que desejamos também um
aumento real nos salários e essa foi uma das minhas solicitações no ofício, mas
como deixei claro, as negociações devem ser entre executivo e servidores,
representados por seus respectivos sindicatos, e mesmo assim consegui com que 50%
do que estava no ofício fosse atendido, ou seja, dobrar o valor do cartão, que
na verdade mais que dobrou. Ontem após a sessão e em conversa calorosa por
parte de alguns integrantes do sindicato e de alguns servidores, sugeri, assim
como fiz ao executivo, que as negociações para 2026 iniciem ainda no ano de
2025, proporcionando maior debate, elaboração e planejamento.
Sempre me coloquei à disposição
de todos e continuarei me mantendo assim, à disposição.
ANEXO 2 -
Vereador Alexandre Peres responde ao blog os motivos que o levaram a votar de forma favorável ao Projeto de Lei sobre o reajuste dos funcionários públicos municipais, inclusive em Regime de Urgência:
Bom dia Eliana
Segue resposta:
Na verdade, eu queria muito ir à tribuna para defender principalmente o ganho no valor do cartão cesta, que foi de 138%. Uma luta que iniciamos juntos e uma grande conquista para os servidores públicos. No entanto, o tumulto gerado durante a sessão de ontem impossibilitou qualquer defesa, foi lamentável.
Com relação ao dissídio, o reajuste para os servidores públicos aprovado ontem, de 5,5%, foi favorável, pois está acima dos índices inflacionários apurados, cuja média é de 4,87%:
- Ufesp para 2025, variação de 4,69%;
- IPCA (março de 2024 a fevereiro de 2025) 5,06%;
- INPC (março de 2024 a fevereiro de 2025): 4,87%.
Nenhum comentário:
Postar um comentário