terça-feira, 31 de outubro de 2023

Discurso de Alexandre Guedes na Cerimônia de 40 anos da Guarda Civil Municipal de Indaiatuba

O texto abaixo é uma cópia autorizada do discurso proferido por Alexandre Guedes Pinto, que foi Secretário de Segurança Pública de Indaiatuba por muitos anos. O discurso foi feito na ocasião em que a Guarda Civil Municipal fez 40 anos, em uma Cerimônia feita na Câmara Municipal de Indaiatuba, no dia 31 de outubro de 2023

Não se trata de um post como os demais, mas o conteúdo é relevante para pesquisas futuras sobre a História da Segurança Pública em Indaiatuba, do ponto de vista de uma autoridade como Alexandre Guedes. É um texto que não pode se perder como referência e fonte.


Alexandre Guedes
Crédito: Anselmo - Câmara Municipal de Indaiatuba


    Gostaria de cumprimentar o Presidente da Câmara, vereador Jorge Luiz Lepinsk "Pepo" e a Primeira Secretária vereadora Silene, em nome dos quais cumprimento os demais vereadores e vereadoras e a todos os servidores desta Casa de Leis e agradeço ao Sr. Presidente o convite. Cumprimento o Sr. Prefeito Nilson Gaspar; o ex e sempre prefeito Reinaldo Nogueira; o ex-prefeito José Carlos Tonin; o Secretário de Segurança Lima e em seu nome cumprimentar os funcionários da Secretaria de Segurança; o Diretor da Guarda Civil Subinspetor Massaiolli; a Chefe de Gabinete do Prefeito, minha amiga Claudia Tanaka Beraldo e, em seu nome, cumprimentar os meus colegas Secretários Municipais. Cumprimento também os Delegados da Policia Civil Dr. Danilo e Dr. Clésio; o Comandante da PM, Capitão Magalhães; em nome do Inspetor Chefe Bueno e do Inspetor Chefe Zombine, cumprimento a todos os nossos guardas aposentados, da nossa reserva; em nome o Inspetor Chefe Gomes, Coordenador Operacional, um paizão para a nossa tropa e da Inspetora Chefe Marilsa, a todos os Guardas Civis da Ativa; e em especial, cumprimentar e parabenizar a todos os homenageados desta noite!

Hoje estamos comemorando o aniversário da nossa Guarda Civil, que completa 40 anos de muita luta, sonhos e realizações. Ao longo de sua história, ela conquistou o carinho, respeito e admiração de todos e se transformou em uma polícia moderna, treinada, atuante e respeitada. Uma referência entre as Guardas Civis em todo o Brasil.

Mas a sua história, é feita por cada um de nós aqui presentes e por aqueles que já passaram pela nossa Guarda; que dedicaram boa parte das suas vidas à essa Corporação, ao bem-estar da população e à segurança pública de Indaiatuba. Estamos aqui para agradecer a vocês, senhores e senhoras Guardas Civis, pela dedicação, profissionalismo e amor com que trilharam e construíram juntos essa bela história.

Pelo menos 25 desses 40 anos, tive a oportunidade e honra de acompanhar de perto a trajetória da nossa Guarda, seja como assessor no Gabinete do Prefeito desde 1998, e ao lado dos nossos Guardas como Secretário de Segurança por mais de 11 anos.

Lembro, Senhor Presidente, que em 1997 a Guarda passava por dificuldades, viaturas sem condições de uso, a tropa sem fardamento, enfim, uma situação crítica e o Prefeito Reinaldo começou ali a reestruturar a nossa Guarda. Passamos por tempos difíceis, como o assalto ao Banco Itaú, mas a Guarda sempre foi forte e superou na sua trajetória, todos os seus obstáculos.

Após 8 anos, o Prefeito Reinaldo foi eleito Deputado Federal e mesmo não sendo da área de Segurança, teve como prioridade no seu mandato a defesa das Guardas Civis. Lembro que no Congresso já existiam vários projetos de leis, referente às Guardas, engavetados. O Deputado Reinaldo se uniu a outros deputados para que se apressasse todos esses projetos para viabilizar a aprovação, concentrando os esforços no projeto do Dep. Arnaldo Faria de Sá, que culminou mais tarde na aprovação do Estatuto das Guardas, Lei 13.022 de 2014, que não era o ideal, mas que, mesmo assim, foi um marco no ordenamento jurídico das nossas Guardas.

Já em 2008, no seu plano de Governo, a Segurança tinha prioridade total e ainda antes de assumir, criou uma Comissão, da qual fiz parte, liderada pelo então Vice-Prefeito Dr. Pinheiro e pelo empresário Sr. Baldomero Barbará, com o objetivo de conhecer experiências de sucesso na área de Segurança Pública.

Lembro que nos primeiros dias de janeiro, assim que assumi a Chefia de Gabinete e a Secretaria de Segurança, fui convocado por esta Câmara Municipal, para a CPI da Segurança Pública, tamanha era a preocupação da nossa população com os índices de criminalidade, crescentes em nossa cidade e região. Aproveito aqui, para registrar o apoio importante e firme que sempre tivemos desta Casa de Leis, através dos senhores e senhoras vereadoras.

Ser Secretário de Segurança foi a mais importante missão da minha vida profissional, fiz isso com muita honra e humildade, sabendo da importância e responsabilidade dessa missão.

Nesse período, nos dedicamos na defesa e desenvolvimento da Guarda Civil, não só de Indaiatuba, mas da Região e do Estado de São Paulo.  Priorizamos os investimentos em treinamento, organização, tecnologia e inteligência. Mudamos o modo de pensar e agir - e na transformação da nossa Guarda - no que ela é hoje.

Considero importante destacar algumas das conquistas alcançadas nesses últimos anos:

  • Aumento em 2009, do adicional de periculosidade de 30 para 100 %;
  • Reforma e ampliação da Base da Guarda, da área administrativa, sala de treinamento, pavimentação do pátio e drenagem da água da chuva, acabando assim com o alagamento;
  • Construção de um novo refeitório, oficina e área de lazer, academia de ginástica e um novo vestiário;
  • Criação do Setor de Psicologia da Guarda, de extrema importância para o apoio aos nossos agentes no seu trabalho diário;
  • Divisão de Ensino da Guarda, para formação, treinamentos e requalificação contínua;
  • COESP (Curso de Operações Especiais), com a participação de inúmeras Guardas da região;
  • Implantação das Condecorações da Guarda Civil, com medalhas, barretas e premiações, além da Guarda de Honra, adoção do Hino Oficial da Guarda e do Ato Cívico Semanal;
  • Implantação de novo padrão de fardamento, o qual vem mudando com as novas tecnologias;
  • Reestruturação de todo o Organograma da Secretaria de Segurança e da Guarda Civil;
  • Criação do GEAC - Grupo Especial de Análise Criminal;
  • Disponibilização de um Setor de TI (Tecnologia da Informação) especialmente para atender a Guarda Civil, com qual conseguimos desenvolver diversas soluções e uma eficiente Gestão tecnológica. Quero parabenizar os Três Mosqueteiros desse setor: o Junior, Welton e Thiago Brito. Vocês tiraram leite de pedra. Obrigado!
  • Implantação do Setor de Comunicação Social, que colocou de forma definitiva a nossa Guarda nas redes sociais e hoje é referência na nossa região e no Estado de São Paulo, parabéns ao CE Turatti, pelo seu brilhante trabalho, feito com dedicação e competência;
  • Reestruturamos os Setores de Estatística, Desenvolvimento e Planejamento Operacional;
  • Implantamos, através do Setor de Desenvolvimento, um sistema de Gestão próprio da nossa Guarda, hoje chamado de SINCAD. Esse sistema trouxe agilidade, controle e excelência no trabalho da nossa Guarda, gerando economia ao município, diminuição no tempo de atendimento à população e maior segurança aos nossos Agentes. Tudo isso desenvolvido e implantado por nossos próprios Guardas. Eles foram responsáveis também, na Administração do Prefeito Gaspar, pelo desenvolvimento dos Aplicativos de Botão de Pânico, com ênfase ao do Caminho das Rosas, Programa esse, que revolucionou o atendimento e combate da violência doméstica em Indaiatuba.  Deixo aqui a minha homenagem aos três integrantes desse setor, os Subinspetores Gonçalves e Hipólito e ao GC Lucas, vocês são um orgulho para nós. Parabéns!
  • Aquisição de equipamentos modernos, armamentos novos, como pistolas, armas longas e armamento menos letal, além de introduzir equipamentos de CDC. (Controle de Distúrbio Civil).
  • Modernização da armaria, considerada pela Polícia Federal e pelo Exército Brasileiro, excelência em Controle e Gestão. Passamos a recarregar as nossas munições para treinamento, o que gerou uma enorme economia aos cofres públicos. Nessa mesma linha foi implantado pelo prefeito Gaspar, o Estande de Tiro Virtual na base da Guarda, sistema moderno e que poucas instituições possuem. Quero deixar aqui a minha homenagem ao Inspetor Cossa, que é um exemplo de amor ao seu trabalho e a nossa Guarda. Parabéns!
  • Criação de vários grupamentos especializados:
  • GAP (Grupo de Ações de Policiamento Especial) com viaturas grandes;
  • Patrulhamento Tático com Motos, através da reestruturação da ROMI (Rondas Ostensivas com Motocicletas de Indaiatuba);
  • GAM (Grupamento Ambiental) com a reestruturação do Patrulhamento Rural;
  • GOC (Grupo de Operações com Cães), o CANIL, que tem como principal missão o combate às drogas;
  • Implantação da Comunicação com Rádio e Hts digitais, trazendo mais segurança às nossas equipes;
  • Aquisição de viaturas novas, várias de grande porte, sendo que atualmente a Guarda Civil possui uma frota moderna e constantemente renovada, com 70 viaturas;
  • Criação do COI (Centro de Operações e Inteligência) em 2009, com investimentos em Tecnologia Operacional, Monitoramento e Inteligência, entre eles: controle e despacho de viaturas, atendimento do Fone 153, com mais de 17.000 atendimentos por ano, Monitoramento Urbano e Veicular, formando uma muralha digital no torno de Indaiatuba, que monitoram diariamente 568 mil passagens de veículos em nosso município, todas analisadas em tempo real. O Banco de Dados da nossa Inteligência possui mais de 405 milhões de passagens armazenadas;
  • Criação da DIN (Divisão de Inteligência), que aumentou a eficiência da Guarda, resultando em mais de 2.200 casos resolvidos, com 574 pessoas presas em flagrante, sendo assim, uma parceira importante para a Policia Civil. Parabéns ao Inspetor Bauer e sua equipe que começaram do zero e hoje são referência para outras Guardas e respeitados por todas as instituições de segurança;
  • Inauguração, em 2012, com o sucesso do uso dessa tecnologia e metodologia, da CRIM (Central Regional de Inteligência e Monitoramento), que atualmente é composta por 25 cidades, com mais de 700 câmeras de alta tecnologia interligadas em tempo real;
  • Implantação do Programa Câmera Cidadã, com 950 câmeras cadastradas e o Programa Vizinhança Solidária, hoje com 90 células em funcionamento; que tem nos ajudado no esclarecimento e prevenção de diversos crimes. Em 2008 Indaiatuba possuía 17 câmeras ligadas à Segurança, atualmente entre as câmeras públicas e particulares, temos mais de 2.600;
  • Assinatura do convênio operacional e de inteligência com a Polícia Rodoviária Federal, integrando o COI com o Sistema Alerta Brasil. Já no Governo do prefeito Gaspar, firmamos outros, como o Córtex, do Ministério da Justiça, que proporcionou um grande avanço na operacionalidade da nossa Guarda Civil;

 

Devemos também um agradecimento especial ao nosso Deputado Estadual Rogério Nogueira, que sempre apoiou a nossa Guarda e a nossa cidade, junto ao Governo do Estado e vale lembrar que, com seu empenho e do Prefeito Reinaldo, conseguimos desativar a Cadeia Feminina (há mais de 40 anos no Centro da cidade). Com capacidade para 36 detentas chegou a abrigar mais de 200 e sobrecarregava as forças de segurança de nossa cidade.

Indaiatuba se tornou referência nacional em Segurança Pública. Recebemos nos últimos anos, a visita de mais de 400 cidades brasileiras, para conhecer o nosso Sistema de Segurança e quatro cidades do exterior: Miami, Buenos Aires, Dakar (Senegal) e Bengbu (China).

Recebemos também várias autoridades e organizações ligadas à Segurança, entre elas, doze Secretarias de Estado de Segurança Pública.  Além do Ministério da Defesa, técnicos da ONU, da Secretaria Nacional de Segurança Pública, Polícia Federal e Polícia Rodoviária Federal. Isso é motivo de orgulho, não só para a Guarda Civil, mas para Indaiatuba.

Importante salientar que nada disso existia em 2008. Quem conheceu a Guarda naquela época sabe muito bem da profunda transformação que ocorreu a partir de 2009.

Atualmente temos excelente índices, conquistando nos últimos anos as primeiras posições em segurança pública no Brasil.

O tráfico e uso de drogas no município, que tanto afeta a população, é o nosso principal desafio. Mas 2018 recebemos no Gabinete do Prefeito Gaspar a visita do General Basto, Comandante da 11ª. Brigada de Infantaria de Campinas, o qual nos disse que tinha um problema bom de Indaiatuba para resolver. Que as Unidades Militares de Campinas, subordinadas ao seu comando, estavam pleiteando que os jovens de Indaiatuba pudessem servir nos Quarteis de Campinas, deixando de servir na cidade de Itu. A justificativa era que, comparado com os reservistas de outras cidades da região, os nossos jovens tinham três vezes menos incidência de envolvimento com as drogas e com a violência. Ele disse que o Exército pesquisou e descobriu quatro principais motivos para os nossos jovens serem os melhores:

  • Primeiro, a qualidade do Ensino Básico da cidade;
  • A formação técnica da FIEC e oportunidades no mercado de trabalho;
  • As boas condições de Saúde frisando que isso era confirmado, pela qualidade da saúde bucal adquirida desde a infância. Então vai aqui Dr. Custódio, os parabéns ao seu trabalho e da sua equipe, por todos esses anos.
  • Por último, Capitão Magalhães, era que a maioria dos nossos jovens passaram na sua infância pelo Programa PROERD, e nos últimos 20 anos, em uma parceria entre a Policia Militar, Guarda Civil e Secretaria de Educação, formou aproximadamente 60.000 crianças e jovens, com o objetivo de dizer NÃO as Drogas e a Violência. Parabéns e obrigado por essa parceria, Capitão.

Estamos no caminho certo, prefeito Gaspar... A PREVENÇÃO; e estamos colhendo frutos plantados há vinte anos, Prefeito Reinaldo. Assim aqui vai os agradecimentos a toda a nossa equipe do PROERD, vejo aqui o Gilson e o Lopes.  Parabéns, vocês estão salvando vidas.

A nossa Guarda sempre esteve à frente, e não poderia deixar de ser quando se fala na questão das mulheres. A nossa Inspetora Chefe Marilsa, foi a primeira mulher a ser Diretora Comandante de uma Guarda Civil na RMC e uma das únicas do Estado de São Paulo. Foi uma comandante firme, mas muito querida e respeitada pelos seus comandados. Parabéns Inspetora, pela sua história de vida e pelo seu amor a nossa Guarda Civil.

Para terminar, Sr. Presidente, sempre falei para os novos integrantes que chegavam em nossa Guarda, que se eles estivessem ali para ganhar dinheiro ou para ter estabilidade de um concurso público, que estariam no lugar errado, que isso eles também poderiam conseguir em outros cargos, pois o trabalho em segurança pública é uma questão aptidão, um dom. E dizia sempre a todos... “Escolha um trabalho que você ame, assim não precisará trabalhar um único dia da sua vida”. Hoje, muitos desses guardas, postam essa frase em suas redes sociais.

E outra frase que o Inspetor Zombine diz: “A gente sai da Guarda, mas a Guarda não sai da gente. ”

Essas duas frases passaram a ser verdades para mim, o amor e orgulho de ter trabalhado para a Guarda e que ela sempre fará parte na minha vida.

Assim peço a Deus que abençoe e proteja cada um de vocês, senhores e senhoras Guardas Civis, aos seus familiares e à nossa querida Guarda Civil de Indaiatuba.

Que venham os próximos 40 anos!

Orgulho e Honra sempre! 

Recebam aqui a minha melhor continência!

Muito obrigado!

segunda-feira, 30 de outubro de 2023

PRODUÇÃO DO ESPAÇO NA CIDADE DE INDAIATUBA (SP): ANÁLISE DO PROCESSO DE VALORIZAÇÃO DA TERRA URBANA NO PERÍODO DE 2000 A 2017

O espaço urbano do município de Indaiatuba (SP) tem se transformado ao longo das últimas décadas, uma vez que é intrínseco da produção e reprodução do espaço urbano o seu dinamismo. 

Além das transformações do uso da terra, vem chamando atenção o ritmo em que estas vem ocorrendo, bem como as práticas espaciais adotadas nos últimos anos. 

A partir do final da década de 1970, com a instalação crescente de indústrias, fruto da desconcentração industrial da Região Metropolitana de São Paulo, o processo de urbanização se intensifica e consequentemente sua área urbanizada se expande.

Essa área urbanizada, ocupada de maneira desigual, cenário de conflitos de interesses entre agentes produtores do espaço urbano, como resultado apresenta diferentes valores de uso e de troca da terra urbana. 

Com fundamento nessas premissas, o objetivo principal deste trabalho é analisar a diferenciação espacial do uso residencial indaiatubano, com ênfase no período do ano 2000 ao ano de 2017, interpretando-o a partir da Teoria do Valor Trabalho, principalmente no que diz respeito ao valor de troca e do valor de uso. 

Para tanto, a metodologia utilizada compôs-se de revisão bibliográfica referente ao suporte teórico escolhido, pesquisa de documentos em órgãos públicos, trabalhos de campo para conhecimento do objeto de estudo de forma empírica, além da utilização de tecnologias de geoprocessamento para processamento de dados, que possibilitou análises quantitativas, bem como para elaboração de mapas temáticos. 

O resultado da pesquisa sobre o tema abordado indica um processo de segregação socioespacial que vem se intensificando com os inúmeros loteamentos fechados e condomínios horizontais que se instalaram no município e a especulação imobiliária associada ao discurso de qualidade de vida da cidade como um todo. 

Dessa forma, o processo de valorização do espaço tem se intensificado e acentuado as diferenças de valor da terra do espaço intraurbano. 

Ademais, identifica-se um movimento no qual o valor de troca toma maior importância no processo de produção do espaço urbano em detrimento do valor de uso. 

Palavras-chave: Valor (Economia), Urbanização, Geoprocessamento, Terra – Uso, Indaiatuba (SP)

Para ler o texto completo, clique aqui: https://repositorio.unicamp.br/acervo/detalhe/1093915


domingo, 29 de outubro de 2023

Pai Pirá - o bandeirante de Itaici

Quer conhecer uma parte da história do bandeirante de Itaici Pai Pirá?

Leia este excelente texto da pesquisadora ESTEFANY AMORIM VIANA DE CASTRO, publicado em 2023, neste link: https://repositorio.ufu.br/bitstream/123456789/36866/1/Negocia%c3%a7%c3%b5esAgencimentosAldeamentos.pdf


NEGOCIAÇÕES E AGENCIAMENTOS NOS ALDEAMENTOS DE RIO DAS PEDRAS E SANTANA DO RIO DAS VELHAS NO TRIÂNGULO MINEIRO ENTRE OS ANOS DE 1742 E 1751 

RESUMO:

Este trabalho busca compreender as relações entre o sertanista Antônio Pires de Campos e os indígenas Bororo por ele aldeados na região do atual Triângulo Mineiro, e como essa política indigenista dos aldeamentos entrou em choque e em acomodação com a política dos indígenas. O objetivo é analisar parte de uma documentação histórica do século XVIII, com destaque para o período entre 1742 e 1751, tendo em vista desvelar os processos de negociação dos índios aldeados com a estrutura da administração colonial. Colocando em diálogo duas áreas, História e Antropologia, os documentos históricos e a bibliografia sobre o tema foram analisados a partir da perspectiva da alteridade, tendo como base o paradigma indiciário do historiador Carlo Ginzburg. O trabalho também se apoiou na perspectiva da chamada Nova História Indígena. Por meio das fontes documentais e bibliográficas já escrita sobre a temática, foi possível perceber que os indígenas Bororo aldeados na região negociaram sua existência e participação de acordo com seus próprios interesses e signos. 

Palavras-chave: História Indígena; Política Indigenista; Política dos Indígenas; aldeamentos; Triângulo Mineiro




terça-feira, 24 de outubro de 2023

Engenheira Luci é a décima vereadora em um total de apenas dez mulheres na História

GALERIA DE MULHERES VEREADORAS É ATUALIZADA HOJE, 

COM A DÉCIMA MULHER DA HISTÓRIA: ENGENHEIRA LUCi


 

(
(crédito da imagem: Anselmo, da Câmara Municipal de Indaiatuba)

Engenheira Luci do SAAE (à esquerda), como é conhecida por todos, do lado da sua foto na Galeria de Mulheres da Câmara Municipal de Indaiatuba,  ao lado do Presidente da Casa, Jorge Luiz Lepinsk Pepo, que fez questão de construir essa galeria homenagenado o gênero feminino na Casa de Leis, em sua gestão.



Na manhã de hoje, 24/10/2023 o Departamento de Comunicação da Câmara Municipal de Indaiatuba inaugurou, na Galeria de Mulheres, a foto da décima vereadora da história de Indaiatuba, a engenheira Lucidalva Luz dos Santos que assumiu a vaga há três meses, com a tranferência do vereador Arthur Spíndola para a Secretaria de Governo, como secretário adjunto.

A primeira legislatura de Indaiatuba foi formada em 1836 e desde então, do total de mais de 290 vereadoresapenas sete foram eleitas e três assumiram como suplentes (no total de dez) foram do gênero feminino, sendo que na atual vereança havia, até a posse da engenheira Luci, apenas duas mulheres: Ana Maria dos Santos e Silene Silvana Carvalini. No total de vereadores cuja lista você pode ver aqui apenas pouco mais de 2% de vereadores foram (são) do gênero feminino na história da Câmara Municipal em nossa cidade.



Quem é a engenheira Lucy, a decima vereadora da nossa história

Lucidalva Luz dos Santos, mais conhecida como engenheira Luci, nasceu em Presidente Prudente e reside em Indaiatuba desde a adolescência. Cursou Engenharia Civil na Universidade São Francisco (USF), em Itatiba, e desde 1997 trabalha na autarquia municipal SAAE – Serviço Autônomo de Água e Esgoto, onde ocupa uma de suas diretorias. É pós-graduada pela Universidade de São Paulo e pela Unicamp em Engenharia de Saneamento Básico e em Direito Ambiental pela Faculdade de Itu. Atualmente, cursa Pós-Graduação em Restauração Arquitetônica pela Faculdade Unyleya, em Brasília. 

Nesses 26 anos de atuação como diretora de Engenharia do Saae, Luci foi responsável pela supervisão de obras de saneamento de importância vital para garantir que Indaiatuba seja considerada uma das cidades brasileiras que melhor preza pela proteção de seu meio ambiente. Entre elas a construção da Estação de Tratamento de Esgoto Mario Araldo Candello, da Barragem do Parque do Mirim, da Estação de tratamento de água (ETA lll) no Bairro Pimenta e do Museu da Água. 

Por seu trabalho comunitário, foi homenageada pela "Vox Dei American University" (Flórida, EUA).

Na eleição de 2020, obteve 1537 votos, ficando com a segunda suplência do PP. Luci assume uma das 12 cadeiras da Câmara Municipal com os licenciamentos do vereador titular Adalto Missias de Oliveira e do primeiro suplente, Arthur Spíndola.

Luci diz que sua prioridade será lutar pelas igrejas, “sem denominação de placas”. “Lutarei pelas igrejas – explica -- porque entendo que é lá onde o grande trabalho social é realizado, um trabalho imprescindível que envolve os jovens, as crianças, os idosos, as mulheres, os deficientes físicos, as pessoas à procura de paz de espírito, em busca de acolhimento e da retomada da vida sem vícios e sem conflitos com a família e com a sociedade”. 

Luci presta há 15 anos apoio técnico voluntário na área de engenharia a igrejas das mais diversas denominações. Luci tem 55 anos e é solteira.


LEIA TAMBÉM O TEXTO: Por que temos tão poucas vereadoras na História de Indaiatuba?

domingo, 15 de outubro de 2023

ONDE DESCANSA O VOLUNTÁRIO JOÃO DOS SANTOS?


Video Aula de História de Indaiatuba.



CIRIOSIDADES ADICIONAIS



O obelisco de pedra do Ibirapuera mede  72m de altura e todo o monumento ao soldado constitucionalista possui 1932 m2 de construção cercados de lendas e simbologias.

Obelisco é o nome dado a este tipo de monumento de base quadrada que vai diminuindo com a altura, e é encimado por uma pirâmide, são em geral comemorativos à pessoas ou eventos. 

O obelisco do ibirapuera simboliza, pelo lado externo, a guarnição de uma espada de 72 metros, mas por dentro, a lamina é oca, representando um canhão.

Jacente é relativo ao verbo jazer, comum em epitáfios de lápides de túmulos. É descrito como jacente, a pessoa que "jaz" em seu túmulo.

Diz a lenda que o herói jacente está de olhos abertos, para disparar seu canhão e chamar seus colegas, caso necessite guardar a Constituição de qualquer ameaça. 

Guilherme de Almeida, o poeta da Revolução de 32, foi exilado.

23 de maio de 1932 foi o dia do tumulto no centro de São Paulo que levou a morte de quatro estudantes chamados de MMDC, cujas criptas estão sob o herói jacente.

São os mártires:  Martins, Miragaia, Dráusio e Camargo.

Foram cerca de 60.000 combatentes paulistas e quase 1000 mortos em contagem oficial, mas poderia chegar até ao dobro disso se contarmos os civis.

Em 1955 foi criado o mausoléu e em 1957 - em alusão aos 25 anos da Revolução - recebeu uma grande comemoração que trouxe, entre outros, os restos mortais do Voluntário João dos Santos, de Indaiatuba.

No mesmo armário de mármore onde se encontram o Voluntário João dos Santos, está também Pedro de Toledo, que governou o estado de São Paulo durante a revolução de 32. É o primeiro armário,  logo na entrada do Mausoléu.


quarta-feira, 11 de outubro de 2023

O "Engenho de Itaici" da família de João Tibiriçá Piratininga em Indaiatuba

PRÓLOGO

João de Almeida Prado Júnior - mais conhecido como João Tibiriçá Piratininga "Pai". (*1802 - †1851) comprou a Fazenda Taipas em 1851 do alferes Lourenço Xavier de Almeida Prado.

família Almeida Prado chegou ao Brasil na segunda expedição do capitão-mor Martin Afonso de Souza, que foi o primeiro donatário da Capitania Hereditária de São Vicente, mas acabaram por fazer uso de dois sobrenomes tipicamente indígenas, ambos em alusão ao Cacique Tibiriçá, considerado líder indígena do Planalto de Piratininga

Em 1857 o filho dele, o indaiatubano João Tibiriçá Piratininga ‘O Moço’ (*1829 - †1888) herdou a fazenda onde, após passar seis anos na Europa estudando disciplinas diversas relacionadas às Ciências Físicas e Naturais aplicadas à agricultura – principalmente à açucareira, que gerava riqueza para sua família – instalou um imponente engenho a vapor importado da França, que levou dois anos - com o emprego de boi, alavancas e força escrava) para chegar de Santos até Itaici. Comprou a Fazenda Tranqueiras do seu irmão José, expandindo mais ainda o local, que passou a ser conhecido como “Engenho de Itaici”, que tinha uma lavoura com sistema de afolhamento onde havia cana, algodão e feijão.

A casa grande ou sede da Fazenda Taipas, também chamada de Engenho de Itaici, após a chegada desse  atualmente recebe o nome de Vila Manresa, é um local de eventos dentro do Mosteiro de Itaici.



SEDE DA FAZENDA TAIPAS
ACERVO DA FAMÍLIA DE EDUARDO EWERT, DÉCADA DE 1920





VILA MANRESA - FOTO ATUAL


O texto abaixo conta um pouco do cotidiano do período que João Tibiriçá Piratininga "o Moço" morou na fazenda, época em que esse indaiatubano foi um notável personagem da História do Brasil, pois presidiu a Convenção de Itu, fato que iria influenciar - e muito - a Proclamação da República do Brasil.

A partir daqui, este post transcreve fragmentos do livro "Jorge Tibiriçá e sua época", publicado em 1958 pela Companhia Editora Nacional com o objetivo de divulgar uma parte da História de Indaiatuba pouco conhecida; a da região de Itaici e todo seu entorno.


ASPECTOS DO COTIDIANO NA FAZENDA ITAICI


ARQUITETURA DA CASA GRANDE

A casa de residência de João Tibiriçá na Fazenda Itaici filiava-se ao tipo das velhas moradias senhoriais do nosso primeiro período agrícola, anterior ao grande surto cafeeiro. Os olhos de um europeu naturalmente nada poderiam descobrir em tais mansões que sugerisse o esplendor dos palácios e dos castelos do velho mundo. Nem mesmo dos solares fidalgos de Portugal, nos quais se refletiam adaptações dos estilos construtivos francês e italiano, com muitos ornatos externos e valiosas e ricas decorações interiores. Das vivendas caracteristicamente portuguesas as casas de fazenda guardavam apenas a simplicidade das linhas, reduzidas a um arcabouço maciço, em feitio de quadrilátero; fachadas nuas, rasgadas de amplas janelas com rótulas e guarnecidas, por única saliência, de um beiral ultrapassando o plano dos muros totalmente vazios de enfeites e floreios.

Nada ressaltava como índice de preocupação artística, mas emanava do conjunto uma certa imponência, talvez decorrente dessa própria sobriedade de formas e linhas, comparável ao volume austero de um convento. Isenta de atrativos ornamentais, a Casa Grande de Itaici, como tantas de suas congêneres, infundia somente a impressão estética derivada dos efeitos da luz solar sobre a grande massa caiada de branco, destacando-se majestosa das construções menores espalhadas em redor e que abrangiam diversas dependências ligadas à parte produtiva, como as casas de máquinas, as senzalas, as habitações de administradores, etc.

A fachada reconhecível pela grande porta de entrada virava-se para o nascente. E uma escadaria lateral, aplicada contra a face norte, dava acesso ao pavimento superior, por intermédio de uma varanda onde habitualmente se esticavam redes e se alinhavam cadeiras. Era um posto privilegiado para a sesta e a observação de trechos da fazenda próximos da estrada. Tais melhoramentos haviam sido introduzidos aos poucos, de acordo com reformas destinadas a trazer mais conforto ao vetusto prédio de taipa, primitivamente erguido pelos escravos e ao qual se ajuntaram, com o correr dos anos, benfeitorias sucessivas de ordem prática. O embelezamento era requisito secundário, não que faltassem artífices habilitados entre os ituanos, mas tais artesãos eram contratados exclusivamente para obras de caráter religioso. Nas grandes casas das fazendas e dos engenhos, o luxo era atributo supérfluo. A família contava, isto sim, com cômodos espaçosos, mobiliados ao gosto da época, consoante as necessidades inerentes à vida do interior, onde o gôzo e as ostentações da existência dispensavam refinamentos de pura essência artística. Nas fazendas de Itaici e Tranqueiras, a primeira das quais media mais de 1. 5OO alqueires, o pai de João Tibiriçá havia iniciado, no primeiro quartel do século XIX a cultura da cana e respectiva moagem, atividade em franco progresso até as alturas de 1850, bem entendido, ao lado do corolário usual de cereais, criação de gado e porcos. De quando em quando se explorava o algodão, sob o estímulo de uma alta de preços consequente à procura dos compradores britânicos.

(...)

O LABORATÓRIO DE NHO TIBIRIÇÁ

Mandara ele instalar num dos barracões pegados ao engenho um laboratório completo, aparelhado com todos os petrechos e instrumentos necessários para análises químicas e provas físicas. Alinhavam-se sobre as prateleiras vidros de formatos diversos, garrafões bojudos, balões de ensaio, provetas, uma série de frascos contendo pós coloridos e líquidos. Sobre uma grande mesa enfileiravam-se outros aparelhos que os criados autorizados a entrar na sala estranhavam muito e achavam misteriosos: termômetros, sacarímetros, polarímetros, microscópios, ao lado de livros e cadernos cobertos de cifras e apontamentos.  Correu até em Itu o boato de que Nhô Tibiriçá se fechava num quarto para fazer cozimentos de ervas e fervuras de terras, coisa que se ligava naturalmente a práticas muito suspeitas, tanto mais que era muito comentado o ateísmo de um homem que renegara sua religião e voltara das Europas contagiado por ideias contrárias aos padres e à igreja. Esse laboratório de João Tibiriçá, conforme sussurravam certas comadres e devotas muito faladeiras de Itu, era algo de condenável e de profano que certamente tinha parte com o diabo ... É somente de lamentar que um cidadão tão inteligente e culto nos tivesse legado apenas o fruto de pesquisas de amador, pois com mais acurada e sistematizada preparação, talvez houvesse deixado um nome de maior projeção nos anais da ciência brasileira.


A INSTALAÇÃO DE UM ENGENHO IMPORTADO EM ITAICI

João Tibiriçá, à testa de seu feudo agroindustrial, encetou então a reforma que, durante muitos anos, lhe garantiria altos proventos e a possibilidade de manter um padrão de vida em consonância com as despesas a que se habituara graças à herança paterna. Até há pouco percebera fartos rendimentos no correr de viagens e estadas de luxo na Europa.

(...)

Necessário era largar de vez os aparelhamentos obsoletos dos antigos engenhos e instalar uma usina planejada para atender, quantitativa e qualitativamente, às exigências de um novo ciclo de produção e assim, João Tibiriçá passava da economia colonial para a capitalista e se abalançava, mediante importante inversão de fundos, a montar uma empresa comparável às mais adiantadas do norte da França e da Bélgica.

Estudadas devidamente as plantas e projetos que comportavam novas edificações para abrigar os maquinismos adquiridos na França, deu-se início à execução da reforma, sob a supervisão do engenheiro especialmente contratado para esse fim. Foram dois ou três meses de intensa atividade construtiva, tarefas que se achavam entregues a mestres-de-obras, pedreiros e carpinteiros vindos de Itu, nativos ou mineiros, cuja fama era de serem operários diligentes e destros.

Como de norma, os trabalhos foram bem coadjuvados pela mão-de-obra servil da própria fazenda e pelos escravos e artífices alugados de agricultores vizinhos, pessoal de certa prática e habituado a lidar nas olarias e serrarias existentes em algumas grandes propriedades. Portanto, tijolos de fabricação local e madeiras das matas próximas, nomeadamente toros de imbuia, cabreúva e peroba, forneceram material relativamente barato, dadas as possibilidades de manuseio e transporte.

Os barracões e abrigos destinados às máquinas foram pavimentados de grandes lajes destinadas a suportar o peso dos apetrechos de férreo fundido ou cobre, principalmente a máquina a vapor, que se apresentava como peça volumosíssima.

Dias a fio, um largo trecho situado nas cercanias da Casa Grande foi ocupado por dezenas de obreiros em febricitante labor, martelando peças, abrindo valetas, escavando o solo para firmar fundações, assentando tijolos e preparando as grandes massas de reboco. Zuniam as serras ao cortar os troncos e tábuas, e os ruídos das pancadas se ajuntavam ao ranger dos carros de bois em constante descarga.

Itaici e Tranqueiras foram sede, nesses dias, de um movimento e bulício de oficina, até que se concluiu a estrutura dos edifícios e se deu por acabada a montagem, definitivamente aprovada pelo técnico francês, muito satisfeito com a presteza e o andamento dos trabalhos. Finda a montagem, realizaram-se as primeiras experiências, que vieram perfeitamente corroborar as esperanças depositadas na eficiência e rendimento das máquinas modernas.

A postos todos os serventes, debaixo da supervisão do engenheiro francês, foram introduzidos nas moendas agora movidas a vapor copiosas braçadas de cana. Reboavam pela vasta sala os ruídos provenientes dos cilindros e das transmissões e o resfolegar do grande motor, que era a alma de todas essas rotações e combinações mecânicas, obedientes a um comando único. Os trabalhadores acostumados ao rodar lento do velho engenho e ao ranger das grossas peças de madeira olhavam com surpresa e quase espanto a velocidade com que se efetivavam operações, outrora dependentes do braço humano.

Agora, enquanto o pistão do motor ritmava os seus golpes à guisa de flexões de um braço de ferro, as canas esmagadas e tragadas pelas fauces dos cilindros convertiam-se instantaneamente em garapa que logo escorria para um grande reservatório metálico.

Dali era levada em canos para uma série de caldeiras, em que se formava o caldo, purificado com leite de cal para ser depois escumado e passar pelas caldeiras, chamadas de evaporação.

Estas se compunham de uma bateria de bacias hemisféricas, em que o xarope se elaborava por cozimento até alcançar o ponto necessário de limpidez e coloração. Como termo dessas operações, o líquido se assentava em amplos cochos para esfriar e cristalizar, formando espessas chapas de açúcar. 


ENGENHO É INAUGURADO COM FESTA

Bem sucedido o funcionamento inaugural, a que assistiam muitas pessoas gradas de Itu e municípios vizinhos, festejou-se o acontecimento com champanha francês, não faltando ao ato os brindes e discursos para salientar o amor ao progresso e a São Paulo demonstrado pelo benemérito cidadão.

Muitos agricultores e autoridades ituanas consagravam desta forma um tributo de admiração ao conterrâneo, de vontade firme e esclarecida, que acabava de elevar o nome da província e incentivar a indústria açucareira ameaçada de decadência, e para cujo reerguimento tanto concorria com a empresa que ora iniciava a produção. E, certamente, em vista dos engenhos então existentes na província, não restava dúvida que o de João Tibiriçá representava um empreendimento de vulto. No amplo recinto em que tinha sido instalado o equipamento, dividido em seções bem delimitadas, sobressaíam as principais unidades do maquinismo.

As pujantes moendas, o alinhamento das caldeiras sobre as armações, o aspecto geral do edifício, davam ideia de um vasto estabelecimento fabril e bem justificavam os cálculos relativos aos rendimentos esperados.

A Fazenda Itaici, emoldurada de árvores magníficas e flanqueada por espessa capoeira, ocupava de fato situação privilegiada, pois assenta sobre uma esplanada sobranceira ao rio Jundiaí e a uma vasta zona, relativamente pouco acidentada e que se estende entre Indaiatuba e Itu. O local, extremamente pitoresco, desenrola ante o observador uma paisagem soberba, que incute a mais aprazível das sensações.

Por esse tempo alternavam-se na região as culturas de cana; café, fumo, arroz, cereais diversos, que marcavam aquele trecho de São Paulo como um dos mais ricos e promissores. Na fazenda decorriam os dias entre os labores agroindustriais e os recreios que a existência do interior podia comportar numa época de comunicações dificílimas, tanto para as viagens e transportes como para a correspondência.


COATI - O MULATO QUE VALIA "COMO UM ENGENHEIRO"

Concluída a montagem das usinas açucareiras de Itaici e Tranqueiras voltara para a França o técnico incumbido de ajustar os novos processos de fabricação. Mas curiosamente se encontrou competente substituto para fazer as vezes de engenheiro e superintender os serviços. Tratava-se de um mulato, filho de escrava alforriada e que João Tibiriçá distinguia particularmente entre os demais empregados.

Esse personagem, em virtude de ser dotado de um nariz algo cirartesco, embora não descomedido ou defeituoso, fora cognominado o Coati, como alusão ao roedor de focinho cumprido. Ativo e lépido, sempre pronto para todas as tarefas e chamado para deslindar muitos casos, quer na esfera do pessoal, quer na parte mecânica do engenho, gozava de toda a confiança do senhor e em muitas questões emitia parecer judicioso e digno de acatamento.

O pequeno Jorge, filho de João Tibiriçá, via Coati em frequentes conversas com o pai, na atitude de quem discutia matérias de seu perfeito conhecimento. Examinava as canas que chegavam na usina, intervinha constantemente junto dos serventes das máquinas e das caldeiras. Na hora de um reparo urgente Coati saltava com agilidade sobre a plataforma montada junto aos rolos das moendas e, debruçado sobre as engrenagens, apertava um parafuso, lubrificava uma peça ou providenciava para uma regulagem urgente.

Com a mesma presteza assinalava qualquer embaraço inopinadamente surgido no preparo do xarope ou no ponto de cristalização do açúcar. Obreiro para todas as ocasiões e de extraordinária perícia e intuição mecânica, enfronhara-se com tal habilidade nos múltiplos e complexos detalhes do aparelhamento do engenho que ganhara merecidamente um cargo de verdadeiro diretor técnico, de acordo, aliás, com a indicação do especialista francês que dizia do inteligente mulato: "este homem vale por um engenheiro".


BIBLIOTECA 

Fora das horas consagradas às plantações e à usina, João Tibiriçá se interessava sobremaneira pelos adiantamentos da ciência, pelos grandes eventos internacionais e a marcha da vida política brasileira. Uma vez por semana chegava o correio da Capital, trazendo as cartas e jornais da província, da Corte e da Europa.

Forneciam assunto para discutir à noite, na sala que lhe servia de biblioteca e de escritório, local de repouso e meditações, onde sê entregava, ora à leitura, ora aos apontamentos sobre os trabalhos que pretendia escrever acerca das condições climatéricas de São Paulo e de várias questões relativas às culturas agrícolas. Nas estantes coalhadas de livros um curioso poderia encontrar obras de ciência, notadamente matemática, física e química e os mais conhecidos tratados de matérias concernentes à agricultura e à indústria do açúcar. Ao lado desses volumes, muitas obras de astronomia, geologia, história natural, geografia, bem como os livros que até os meados do século XIX eram considerados mais expressivos do pensamento científico ou social. Naquela bibliografia se projetavam as tendências de um espírito voltado para o materialismo e crente na primazia da técnica sobre o futuro e progresso da civilização. Cuvier, Saint-Hilaire, Gay-Lussac e Augusto Comte eram autores familiares a um homem que acompanhava a evolução intelectual do século e acreditava nos próximos efeitos da grande revolução industrial sobre as condições socioeconômicas do Brasil.

Filho de uma terra de conhecida religiosidade, João Tibiriçá, que recebera ensinamentos católicos, proclamava-se francamente ateu e materialista. Via o mundo regido totalmente pelas leis que governam a substância e se traduzem em fenômenos físicos palpáveis e mensuráveis.

Rejeitava, porém, de forma terminante, todas as crenças baseadas na aceitação de um princípio divino e todas as doutrinas místicas ou relacionadas com poderes sobrenaturais.

Esse materialismo, firmado numa intransigente convicção filosófica, projetava-se nos seus raciocínios de caráter científico ou especulativo, mas não revestia as feições de uma hostilidade declarada e agressiva à religião e aos seus adeptos, tão numerosos no meio brasileiro. O seu materialismo dispensava violências desnecessárias e quaisquer tendências de fanatismo antirreligioso. Estava contrabalançado pelo respeito às crenças alheias, desde que não tentassem forçar esse baluarte de ideias, segundo as quais ele acreditava no aperfeiçoamento da civilização pelo progresso da ciência, totalmente estranho às influências da religião e à interferência das igrejas e do clero.

Dos estudos e comentários de João Tibiriçá acerca do clima de São Paulo e dos seus efeitos sobre as nossas condições agrícolas daremos algumas amostras. Embora escritos ou dados a lume muito mais tarde, foram naturalmente o produto de observações prolongadas e de muitos anos de atentas reflexões.


O FILHO JORGE TIBIRIÇÁ

Em companhia dos pais ou de serviçais de confiança, o menino Jorge percorria quase que diariamente as principais dependências do engenho. Apreciava os canaviais intérminos, amplos tapetes de tonalidade verde-claro que, de longe, se afiguravam trigais a ondular suavemente ao sopro da brisa. Seu pai acariciava com os olhos a vasta plantação e não se cansava de levar-lhe a beleza. Comparava os extensos campos bem lavrados a uma joia de fina lapidação. Os matizes da cana conforme as estações, o odor que se evolava das planícies, serviam de pretexto para exclamações de verdadeira volúpia estética.


OS PASSEIOS EM SALTO DE ITU

(...) A família costumava fazer demorados passeios que davam ensejo a conhecer muitos recantos pitorescos. A pé ou a cavalo seguiam as trilhas e picadas abertas nas matas e capoeiras. Era a ocasião para Jorge se entregar à colheita de frutas silvestres e folgar prazerosamente junto das pequenas cascatas ou à beira dos córregos que recortavam a fazenda. Um dos passeios mais férteis em surpresas e seriações era a visita periódica ao Salto de Itu. A maravilhosa cachoeira, quando no auge da força, constituía espetáculo fascinante, ante o qual todos se detinham, subjugados pelos efeitos da imponente massa de água precipitada entre os paredões de granito.

Através de grossos blocos de rocha, sobrepostos em feitio de muralhas, a corrente do Tietê irrompia com impetuosidade, arremessava-se contra os patamares formados pelos penhascos e rolava em turbilhões cujos rugidos se ouviam a enorme distância.

Era sempre novidade fitar longamente aqueles férvidos cachões. O abismo das águas em fúria atraía irresistivelmente pela beleza empolgante da eterna luta entre as ondas e a pedra, batalha que o sol sublimava pela irisação dos vapores e o jogo de luzes refrangidas pelo cristal da torrente e a neve das espumas. A esses painéis da natureza física se associavam, no lastro das recordações a infância, os da experiência humana.


AS FESTAS RELIGIOSAS

Pela mãe praticante do catolicismo Jorge era iniciado nas doutrinas cristãs e, de tempos em tempos, ia assistir às festividades religiosas em Itu, cidade onde se cultuavam com pompa as grandes datas da Igreja. Na terra de sacerdotes de grande virtude e ilustração, como Miguel Correia Pacheco e de apóstolos caritativos e humanitários, como Antônio Pacheco e Silva, a Semana Santa, principalmente, era celebrada com vistosas consagrações. Saía então a cidade da sonolência habitual à vida do interior e se animava extraordinariamente devido ao afluxo de famílias que acudiam de todos os pontos do município e até de rincões vizinhos ou mais longínquos. As noites de Santo Antônio e, sobretudo, São João, com seus foguetórios e regozijos, herdados de Portugal, festejavam-se na fazenda com todo o rito e colorido e davam margem a uma das demonstrações mais democráticas do nosso ambiente agrário. Divertiam-se até altas horas senhores, camaradas e escravos, com fogueiras, danças e batuques africanos. Tela pitoresca e vivaz que muitos brasileiros daquela geração catalogavam entre as mais agradáveis lembranças e que inspirou a Martins Fontes no seu trabalho sobre a "Dança" uma página de extraordinário enlêvo e poder evocativo. 

Quando partir para a Europa, Jorge Tibiriçá levará as impressões típicas e profundamente brasileiras desse ambiente. Rememorará no estrangeiro a doce visão de Itaici, casa de família tantas vezes contemplada, ora alvejante sob as reverberações solares, ora esfumada pelas brumas nos dias invernosos. Casa em cujos salões mobiliados de velhos e pesados moveis portugueses, brincara ao lado da mãe. Não esquecerá nunca a figura da bondosa progenitora, perpassando entre aqueles aposentos, arrumando as estantes, florindo os vasos ou sentada ao piano para tocar valsas e gavotas ou cantar algumas doces canções da França. 

Da sala de jantar, diariamente frequentada por hóspedes da família ou pessoas de passagem que vinham a negócios, recordará a grande mesa central cercada de cadeiras de espaldar esculpido. Mesa que ficava isolada como uma ilha no meio de um lago. Da cozinha, nos fundos, as servas traziam as bandejas repletas de pratos que se depositavam fumegantes sobre a toalha, exalando os aromas dos temperos e dos quitutes caprichados. A noite os amplos dormitórios, de altos forros, em que se destacava o madeirame pesado dos soalhos e das portas, o volume das vigas, as paredes de uma espessura de fortaleza, onde se haviam socado muitas toneladas de terra. Sequência de quadros em que se urdiram as sensações primárias da vida e se associaram as percepções que vão constituir o substrato psicológico do adulto.

Não é possível deixar de lado as recordações ligadas ao paladar, o sabor tão peculiar de certos pratos e guloseimas bem brasileiros, a doçura de frutas silvestres em cujo sumo se transubstanciam as carícias solares. Essas sensações gustativas poetizam a existência na infância. Contribuem para dar uma noção sensível da pátria, e longe de serem vulgares, interferem com imagens e emoções de alto sentido espiritual.


O CIRCO, O PALHAÇO E NADA MAIS DO QUE UM ESCRAVOCRATA

Um episódio que teve por essa época bastante repercussão, até fora dos limites do município, nasceu de simples brincadeira e depois tomou um rumo de violência e por pouco não findou em tragédia. 

Muito tempo o caso foi comentado, censurado ou aplaudido, conforme as rodas em que vinha à baila. 

Um primo de João Tibiriçá, que chamavam Nhô Bento, rapaz alegre e dado de quando em quando a libações inofensivas, aproveitou-se da passagem de um circo ambulante em Itu para entrar no recinto, por baixo do pano. 

Moço rico, conhecido na cidade, bem sabiam todos que tal gesto, de pura galhofa, não implicava no intento de se furtar ao pagamento da entrada. Mas no picadeiro, um palhaço serviu-se do sucesso para inspiração de pilhérias e maior gáudio dos espectadores. Foi um número extra no programa, já que o truão, pegando na viola, pôs-se a improvisar versos chistoso? que despertaram as gargalhadas do público. 

Nhô Bento, ridicularizado e apupado pelas chufas dos espectadores, saiu do circo meio aturdido e um tanto humilhado. 

No dia seguinte corria mundo que ele fora desfeiteado e objeto de motejos insultuosos que recaíam sobre uma família de poderosas ramificações locais e onde não era de uso aturar desaforos de qualquer espécie sem revide. 

Quando a ocorrência chegou aos ouvidos de João Tibiriçá, acordaram de chôfre e impetuosamente todas as fibras do orgulho familiar. Enrubescido de cólera, sentiu ferver no sangue os impulsos da velha gente paulista, para quem o menor agravo a um membro da família atingia a coletividade inteira e reclamava pronto desforço da parte dos ofendidos, à guisa das antigas vendetas bandeirantes. 

Furioso, João Tibiriçá decidiu corrigir o atrevido palhaço e fazer-lhe engolir as chacotas que soltara inconsideradamente sobre o primo. Para a represália preparou-se verdadeira expedição punitiva. Dois dias depois, seguido de numerosos serviçais da fazenda e de um bando de escravos munidos de foices, chibatas, azorragues e até armas de fogo, o senhor paulista mandava cercar o circo e agarrar o autor das trovas humorísticas. 

Apanhado o infeliz palhaço, diante do pessoal do circo assustado e atônito pelo imprevisto da agressão, foi ele violentamente açoitado e quase linchado.

 Após a façanha, o circo em bloco, com todo o seu elenco de atores, acrobatas e funâmbulos, viu-se coagido a levantar acampamento e fugir às pressas da zona, agora debaixo das vaias e assobios do mesmo povoléu que na véspera rira das graças do palhaço. 

Bem entendido, a autoridade não interveio e até fez vistas grossas, pois o gesto de desafronta merecera a aprovação de muitos ituanos. 

Esse procedimento mostrou uma outra faceta do temperamento de João Tibiriçá, aquela que revelava, no seio da família como de outros troncos paulistas, traços de violência e impulsividade e, consoante eles próprios apregoavam, uma certa "falta de respeito humano". Não podemos omitir o fundo melancólico desse panorama, já que diz respeito ao instituto da escravidão. Os fundamentos desse odioso legado serão demoradamente discutidos em 1871, por ocasião da proposta ·de libertação dos nascituros apresentada pelo ministério Rio Branco. Mas até essa data, a propaganda abolicionista era mais considerada manifestação de demagogia do que expressão de idealismo humanitário, e os que a ela se entregavam eram olhados como uma espécie de comunistas, visto que atentavam contra o direito de propriedade sancionado pela igreja e aventavam uma reforma positivamente arruinadora para a agricultura nacional.

João Tibiriçá, não obstante a sua compreensão do aspecto social do caso, pendia, entretanto, para a manutenção da escravatura até que fosse possível extingui-la gradualmente, sem abalos profundos na estrutura agrária e na economia do país. Por isso, à falta de outros braços, utilizava duas ou três centenas de escravos nas suas fazendas.


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Nossa Indaiatuba, antes parte da cidade de Itu, e local onde João Tibiriçá nascera, perpetua sua memória com a criação da comenda “Medalha João Tibiriçá Piratininga” com a qual privilegia os seus filhos ilustres. 

Itu, por seu lado, perpetua sua memória mantendo no Museu Republicano de Itu um rico acervo sobre Tibiriçá

quarta-feira, 4 de outubro de 2023

Coleção de ensaios sobre Luiz Gushiken é lançada na Câmara Municipal

A Câmara Municipal de Indaiatuba sediou, na noite de ontem, o lançamento do livro “A nova ordem: Luiz Gushiken” organizado pela jornalista Fernanda Otero.


Fernanda Otero, 
 que também é autora do livro que biografa o Padre Xico (veja aqui).

O livro foi editado pela Fundação Perseu Abramo e pode ser acessado neste link para baixar em pdf. : https://fpabramo.org.br/publicacoes/estante/a-nova-ordem-luiz-gushiken/




O presidente da Casa de Leis, Jorge Luiz Lepinsk (Pepo) deu boas vindas à organizadora Fernanda Otero e aos convidados. Destacou a importância de Luiz Gushiken para a viabilização de programas habitacionais em nossa cidade.


O Prof. Gentil Gonçales da Sinprovales, um dos autores dos textos do livro, destacou que sentia-se  honrado em poder homenagear este grande republicano e estadista que foi Luiz Gushiken, que por anos também residiu em Indaiatuba e foi um grande mecenas das artes indaiatubanas. 



O livro é um repositório de vários textos feitos para registrar as histórias e memórias daqueles que conviveram com ele. 

O volume reúne textos de 67 autores, entre eles Luiz Inácio Lula da Silva e Dilma Rousseff, ambas lideranças do Partido dos Trabalhadores (PT), frei Betto, entre outros, que descrevem a convivência com Luiz Gushiken, que foi um notável homem público e também Cidadão Indaiatubano.

De Indaiatuba, tivemos a colaboração de artigos de Gentil Gonçales Filho, Manoel de Melo dos Santos e Marcelo Antunes Martins, todos presentes no lançamento, com palavras de homenagem e saudade.



Autoridades, amigos, familiares (irmã e esposa)
estiveram no lançamento do livro em Indaiatuba na noite de ontem.















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