texto (fragmento) de Paulo Sérgio Barreto (1)
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A estratégia para a implantação do Museu Ferroviário em Indaiatuba – SP consistiu-se em recuperar os depoimentos, as falas e as memórias dos ferroviários aposentados da extinta Estrada de Ferro Sorocabana.
A partir destes depoimentos estruturou-se à montagem do Museu Ferroviário levando em consideração o imaginário, as trajetórias familiares, profissionais e o universo dos ferroviários da antiga Sorocabana. No total, foram entrevistados 15 (quinze) ferroviários.
Inicialmente, o trabalho consistiu em realizar entrevistas individuais e/ou em grupos, periódicas, registrando os depoimentos dos ferroviários com o auxilio de uma câmara de VHS, a partir de roteiros de perguntas semi-abertas. Algumas entrevistas foram realizadas nas casas dos próprios ferroviários. Outras numa escola pública, como uma sessão “terapêutica” com o grupo dos ferroviários, mais voluntários e curiosos, durante oito (08) meses.
A proposta metodológica era de confrontar as falas, as memórias, os sentimentos e as histórias particulares, entre os envolvidos, buscando mapear a trajetória de ingresso e a performance profissional dos ferroviários aposentados. Bem como, a partir das experiências e dos saberes visualizar o acervo e a montagem participativa do museu ferroviário. A ênfase do mesmo recaía na construção da identidade ferroviária marcada pelos percalços da sociedade brasileira, durante a segunda metade do século XX.
Em particular, os ferroviários tinham uma trajetória comum de ingresso na Sorocabana. Alguém da família ou conhecidos convidava o futuro ferroviário a ingressar na Companhia. Geralmente, estes ingressavam em plena adolescência e exerciam inicialmente atividade de aprendizes. Por lei, os adolescentes tinham restrições etárias para exercerem determinadas tarefas na Companhia Sorocabana. Mas a lei era burlada para garantir a vaga, o aprendizado e o reconhecimento do futuro trabalhador como alguém a ser incorporado como “ferroviário”. Estes teriam uma trajetória cotidiana e familiar assentada pelas constantes mudanças dos postos de trabalho e do lugar de moradia. Em virtude dessas mudanças, os ferroviários passavam alguns anos em determinadas comunidades, vivendo, nos idos dos anos 40 e 50, todas as dificuldades e carências próprias de uma Estação de Trem, no interior de uma cidadezinha qualquer, do Estado de São Paulo.
Eram comuns, nos depoimentos e nos relatos, as marcações das diferenças profissionais e de status entre os ferroviários. No imaginário popular, os ferroviários estavam associados aos maquinistas, aos chefes de estações e aos telegrafistas. Profissionais que compunham o universo dos escritórios, oficinas, locomotivas, plataformas e estações com os seus uniformes, objetos, código e linguagens próprias.
Havia outros profissionais.
Alguns mesmos estigmatizados pelos próprios colegas de trabalho, pelo tipo de tarefa e pela rotina árdua, de sol-a-sol, estafante e invisível aos olhos dos moradores e dos usuários dos trens. Os profissionais, como, “a turma da manutenção”, eram àqueles ferroviários que não eram vistos pelos pares, como ferroviários. Mas “obreiros” que mantinham a rotina diária de andanças por quilômetros para ajustar, apertar, recolocar e refazer no lugar, os trilhos e os leitos defeituosos ou acidentados. E mesmo, havia disputas simbólicas e por prestígios entre os diversos ferroviários ligados as outras companhias, como entre a Paulista, a Mogiana etc.
Alguns mesmos estigmatizados pelos próprios colegas de trabalho, pelo tipo de tarefa e pela rotina árdua, de sol-a-sol, estafante e invisível aos olhos dos moradores e dos usuários dos trens. Os profissionais, como, “a turma da manutenção”, eram àqueles ferroviários que não eram vistos pelos pares, como ferroviários. Mas “obreiros” que mantinham a rotina diária de andanças por quilômetros para ajustar, apertar, recolocar e refazer no lugar, os trilhos e os leitos defeituosos ou acidentados. E mesmo, havia disputas simbólicas e por prestígios entre os diversos ferroviários ligados as outras companhias, como entre a Paulista, a Mogiana etc.
Ser ferroviário era estar possuído de um reconhecido legítimo e eficaz que dotava o indivíduo de saberes, experiências e distinções sociais. Era para as moças solteiras, dos anos 30 a 50, um “bom partido”. O chefe de Estação compartilhava, junto com o padre, o delegado e o prefeito o exercício da autoridade e das prerrogativas públicas, dentro de uma sociedade limitada pelo machismo que socialmente reconhecia os mesmos, como possuidores de emblemas e de referencias profissionais que os diferenciava e os qualificava perante os outros.
Até os idos dos anos 60 e 70, os ferroviários que eram considerados como uma categoria profissional possuidora de prestígios sociais, passaram desde então a serem considerados como uma profissão menor e destituída de espíritos aguerridos, emblemáticos e de distinção. Não resistindo às novas lógicas econômicas e sociais, a categoria profissional vai se proletarizando devido à ausência de investimentos e de ampliação da malha ferroviária pelas companhias privadas.
A partir dos anos 50, ocorreu um processo de desqualificação dos mesmos, após a incorporação das companhias privadas pelo Estado e pelo advento das novas modalidades de lazer e de transporte individual, como o automóvel particular. Dos anos 70 para cá, começou um processo paulatino de sucateamento das malhas ferroviárias com o vandalismo e o abandono de algumas estações, trens, vagões e materiais de rodagem.
Concomitante à isso, os ferroviários são recolocados pelo Estado em funções que os desqualificaram mais ainda, ou, quando muitos, alguns, foram aposentados compulsoriamente. Alguns relatam que, os chefes de estações, tornaram-se “bedéis”, de escolas públicas, ou, mesmo, contínuos, perdidos numa repartição pública qualquer.
Neste sentido os saberes, as experiências, as práticas de vida foram se perdendo e as frustrações, as descrenças e desencantos dominavam este pequeno grupos de aposentados.
A proposta do Museu era em trabalhar a identidade ferroviária buscando pelas falas, pelos objetos expostos e os painéis “plotados” recuperar a trajetória profissional e trabalhar com o imaginário, o simbólico e o patrimônio intangível que estão presentes nos indivíduos, grupos e comunidades. Ao mesmo tempo, categorizar um museu a partir de um fazer e de uma prática cotidiana que marcou, em particular, o Estado de São Paulo, com o advento do café, desde o século XIX até hoje.
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(1) Paulo Sérgio Barreto é mestre em Sociologia da Cultura pela UNICAMP e Especialização em Ecoturismo - Senac e trabalhou na implementação do Museu Ferroviário de Indaiatuba. Este texto é um fragmento de um trabalho apresentado no I Fórum Nacional de Conselhos do Patrimônio Cultural.
Oi Eliane, seu blog está magnífico. Muito interessante mesmo. siga nosso blog também:
ResponderExcluirhttp://mirianemislene.blogspot.com/
beijos
Mirian e Mislene