segunda-feira, 25 de abril de 2011

O muro de taipa da frente do Casarão - Fatos e Questões

          A expansão urbana aliada à industrialização têm provocado o crescimento desordenado de cidades como Indaiatuba e, consequentemente, a destruição de áreas com edificações antigas, cuja importância arquitetônica ou histórica - muitas vezes, infelizmente,  passa despercebida pela maioria da população.

          Em Indaiatuba restaram tão poucos exemplares de edificações antigas, que nem sequer poderíamos pensar na possibilidade de colocá-las em risco. O moderno foi tomando o lugar do antigo sem que as consequencias culturais dessa mudança fossem consideradas por aqueles que a empreenderam.

          Para que essas mudanças não continuem dessa forma inconsequente, o correto é fazer o tombamento de imóveis declarados de interesse para a preservação, quer seja por sua importância arquitetônica, histórica, artística, arqueológia ou ambiental. Com leis que garantam o tombamento, está garantida a preservação da cultura material.

          Mas não é bem essa teoria que estamos vendo sendo colocada em prática em nossa Indaiatuba, já dita tão carente de sua memória edificada. Refiro-me ao muro de taipa construído na frente do Casarão do Pau Preto.

          O muro está bem no meio de nosso centro velho: na frente do Casarão do Pau Preto (aquele, que eu já escrevi que CHOVE DENTRO*), do lado da matriz Nossa Senhora da Candelária (que mesmo tombada, foi reformada), no quintal da Casa número 1 (essa, a Norma cuida) perto do Busto do Dom José e na mesma quadra da Casa Paroquial. Também próximo da Rua Augusto de Oliveira Camargo e os poucos casarões que ali restam, da Estação de Trem onde está a locomotiva número 1, a nascente  do Córrego Belchior e o Hospital Augusto de Oliveira Camargo.

          Essa área encaixa-se perfeitamente no conceito do artigo 216 da Constituição federal que define patrimônio cultural como "bens de natureza material e imaterial, tomados individualmente ou em conjunto, portadores de referência à identidade, à ação, à memória dos diferentes grupo formadores da sociedade brasileira, nos quais incluem: (....) V - os conjuntos urbanos e sítios de valor histórico, paisagístico, arqueológico, paleontológico, ecológico e científico."

          É nesta área que está construído o muro de taipa. Só que ele está em um terreno vazio, de inquestionável valor imobiliário que pertence há muito tempo à iniciativa privada e onde está sendo construído um arranha-céu de 17 andares. A construção encontra-se- na fase de execução da fundação. O empreendimento já foi lançado em mídias escritas, tem um logotipo que remete à formas antigas (históricas, melhor explicando) e recebe o nome de "Casarão". Em uma primeira análise, obviamente surpreende-se com o oportunismo da construtora, ou da empreendedora (não sei se é a mesma empresa) ou melhor, dos responsáveis pela obra, que utilizam descaradamente a área que deve ser preservada (sua história, sua imagem e até o nome de um de seus logradouros) em alusão à um interesse privado. Mas não vou me ater nesse nível de discussão. A iniciativa privada é livre para definir e propagar o produto como bem entender, mesmo que fique esse oportunismo gritantemente agressivo à pessoas que interpretam o fato como eu, os chamados preservacionistas, memorialistas, historiadores formados ou não ou vítimas em geral desse amor que temos incondicionalmente por nossa Indaiatuba. E pelo pouco de patrimônio edificado que lhe resta.

          O primeiro ponto em que se deve se ater de verdade, é o do risco a que todos esses logradouros vizinhos correm, principalmente o Casarão, que já TREPIDA QUANDO PASSA CAMINHÕES E ONIBUS** na frente. Imaginem quando habitantes de 17 andares entrarem e saírem de lá com seus carros e motos. Muitas cidades fazem o exatamente o contrário: proíbem o trânsito em áreas definidas como de preservação e fazem calçadões. Lá passam caminhões e ônibus da Guaianazes toda hora. E também todos os carros que desviam do calçadão da Matriz; ou seja; já é um corredor de fluxo inadequado.



          Essa questão da trepidação é até anterior ao futuro e mais intenso fluxo. Passa também pelos riscos que os próprios processos de construção contêm. Esses, os responsáveis pela obra já assumiram que não existirão. Quero confiar que a Análise de Riscos feitas por eles conseguiu mapear (identificar, mensurar e tratar) todos eles, e conseguirá fazer uma gestão desses riscos de forma eficaz, sem nenhuma não-conformidade como algo ou alguém (credo!) que despenque em cima do muro. O fato é que, se na construção, o muro for abalado, será obviamente reconstruído ou reformado, afinal ninguém colocará sua marca em risco. Nesse ponto confio no "abraço" que os responsáveis estão fazendo em torno do muro, comprometendo-se à preservá-lo.

          Por último, deve-se destacar também outro importante item´, este sim, também de muita importância para se atear em uma análise: a visibilidade. Como não concordar que não há coerência em se cravar 17 andares na área de preservação mais antiga e importante do nosso centro urbano? Alguns responderão rapidamente que já existem outros prédios nos arredores. Para estes, respondo com dois argumentos: sim, mas nenhum está na frente do Casarão (e usando seu próprio nome) e nem foi construído após OS BENS JÁ TEREM SIDO TOMBAAAAAAAAAAAAADOS!!!!!***
         
  • A prefeitura aprovou a construção?
  • Se sim, como é que a Prefeitura aprova uma construção de 17 andares em uma área de preservação?
  • ... Onde os bens do entorno já  estão tombados?
Para que meus argumentos não sejam reduzidos a um texto feito simplesmente por quem ama Indaiatuba desvairadamente e por isso está cega de subjetividade, lanço mão mais uma vez de uma referência legal e legítima:

 Diz a lei: é necessária a prévia avaliação e autorização do órgão competente para a liberação de construção nas áreas do entorno de patrimônio histórico e cultural, objetivando resguardar a visibilidade do bem tombado.

  •           Um prédio de 17 andares resguarda a visibilidade dos bens tombados da área?
Para uma obra desse porte em um local como esse, também diz a lei que é obrigatória a elaboração de um Estudo de Impacto na Vizinhança (EIV), cujas diretrizes teóricas apontam que ele deve ser realizado de forma objetiva, sem "subjetividades" que beneficiem  o interesse privado a despeito do interesse da coletividade.

  • Foi feito um Estudo de Impacto na Vizinhança antes da aprovação da construção do prédio?
  • Quem analisou e aprovou esse Estudo?
São questões que precisam de respostas.

A preservação do nosso patrimônio edificado não é tarefa apenas de uma instituição. É, também, responsabilidade de todos nós, legítimos proprietários que somos dos bens coletivos. (Caramba, gente! Isso tudo é nosso!). Por responsabilidade, além dos deveres definidos e aqui citados na Constituição e  também presentes em nossas leis (inclusive municipais) referentes aos patrimônios já tombados também compreende-se ações individuais e coletivas consonantes com a prática cotidiana de resguardar a memória daqueles que nos procederam na História. 

Todos os cidadãos são guardiões do passado a fim de que seja testemunhado pelas gerações futuras. 

.....oooooOooooo.....

* Desculpem-me os leitores pelas letras maiúsculas, sei que na etiqueta da web significa que estou gritanto, mas estou mesmo. Perdão.

** Perdão, mil perdões. Gritei de novo. É a insistência, a vontade de ser ouvida.

*** Agora eu perdi a classe de uma vez por todas e nem vou mais pedir perdão.

3 comentários:

  1. Parabéns por mais esta matéria Eliana.
    Também fico bastante chateado com o modo que as coisas são tratadas. Acho lógico e necessário que em Indaiatuba sejam construídos grandes condominios verticais, ou prédios comerciais porém é ainda mais necessário preservar a história da nossa cidade. Existem tantos locais para construir prédios novos não ?
    Ainda mais tenho certeza que um prédio deste porte não vai ficar bonito no local. É uma pena.
    Tenho a certeza que alguns estão ganhando dinheiro ilegal com o negócio...para variar.
    Abraço.

    ps. vou repassar o post por ai...

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  2. Parabéns

    De fato em Indaiatuba assistimos uma verdadeira omissão em relação a preservação histórica e ambiental. E essa é uma luta que vale a pena porque é da memória coletiva, do direito de não esquecer é que vamos nos humanizando formando o que somos e o que seremos. Sendo assim dependemos da sustentabilidade histórica e ambiental.

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  3. gostei do blog, estou seguindo... siga-nos

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    obrigado

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