quinta-feira, 8 de outubro de 2009

Chico Preto e uma Eleição Muito Animada

Melânia Estevam Pires Rodrigues[1] .


Conhecido popularmente como Chico Preto, seu nome verdadeiro era Cândido Sampaio.
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Nos idos anos da década de 1960 tivemos em Indaiatuba um período politicamente muito tumultuado, reflexo do momento político que vivia nosso país e Chico Preto foi um dos indaiatubanos que participou – de um modo muito próprio – de uma eleição que entrou para a história de nossa cidade.

Foram candidatos a prefeito os senhores José Narciso Monteiro Netto popularmente conhecido como Zico, cujo vice era Waldemar Giomi e Ivan Corrêa de Toledo, cujo vice era Romeu Zerbini.

Crédito da imagem: Dinossauros de Indaiá
(grupo no Facebook)
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Essa eleição foi tão conturbada que até o resultado surpreendeu: por apenas um voto (!), o candidato Ivan do partido PDC, foi eleito com a diferença de apenas um voto (!) e tomou posse no dia 1º. de janeiro de 1964, com uma bancada de vereadores formada por cinco vereadores da situação, cinco da oposição e um do PSP que era do partido do candidato Jacob Lyra.


Havia um programa na extinta TV Tupi - canal 4 -, feito pelo jornalista Maurício Loureiro Gama, que se chamava Ponto Final. No mesmo ano de 1964 uma pessoa daqui de Indaiatuba escreveu para o programa dizendo que “havia um comunista tomando conta de nossa cidade” e após fazer essa denúncia, lembro-me que ainda perguntou “até quando aquilo seria admissível”. No dia 13 de junho do mesmo ano, Ivan teve seus direitos políticos cassados. No mesmo dia também me lembro que o mesmo jornalista disse, em rede nacional que “para aquela pessoa de Indaiatuba que havia perguntado até quando um comunista ficaria no poder, ali estava à resposta”, demonstrando que sabia que a cassação havia sido feita naquela data.[2]

. Nos fervorosos comícios da época, lá ia Chico Preto com sua banda, cujo peculiar nome já insinuava muita coisa: “Não empurra que é pior”. Não me lembro quantos integrantes tinha a trupe, mas lembro que não eram poucos, todos com seus instrumentos e todos simpatizantes do candidato Zico.

. Não era uma banda contratada, como até há pouco tempo[3], em que os comícios eram verdadeiros shows com artistas caríssimos que alavancam a vitória de candidatos que podiam gastar mais. Muito pelo contrário, a banda “Não empurra que é pior” era a primeira a chegar, última a sair e tocava de graça para animar os comícios de seu escolhido, movidos simplesmente pela opção.

. Os comícios aconteciam principalmente na praça do centro – Prudente de Moraes, no Largo da Estação e no Largo de São Benedito, chamado também de Candeias. Aconteciam também em alguns pontos estratégicos – geralmente perto de um bar – nos poucos bairros já formados na época: bairro Santa Cruz, Vila Candelária, Vila Furlan, Vila Georgina e Vila Todos os Santos.
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Onde quer que fosse lá ficava ela, tocando diversas músicas ou simplesmente fazendo aquele barulho cadenciado e contínuo que mais parecia um samba. Mas tinha muita classe: ficava imediatamente em silêncio no momento da fala dos políticos.

. E quando um terminava e outro era anunciado, o espetáculo recomeçava. A “Não empurra que é pior” bradava seus instrumentos num ritmo de apresentação e suspense, imediatamente interrompido com o início da fala do próximo orador. E a cada manifestação da banda, o povo também se manifestava, sendo ela o instrumento que dava o tom e o ritmo nos comícios. Uma verdadeira festa democrática!

. O tamanho da cidade fazia com que todos se conhecessem e por conseqüência soubessem quem era de qual candidato[4]. Nessa época, pessoas que até então conviviam civilizadamente eram vistas dando “banana” para outras, simplesmente por serem simpatizantes de adversários políticos. E nesse entusiasmo todo, sem dúvida nenhuma a tal banda era um forte elemento de atração para os que não estavam nem um pouco interessados nos discursos. Era estrela sim, mas sabia também qual era o se lugar: estava ali para atrair e manter o público não com os holofotes para si, mas para o Zico e seus correligionários. Era atração sim, mas reconhecia seu papel de coadjuvante.

. Creio que em algumas cidades pequenas ainda exista essa paixão, essa rivalidade democrática, esse conhecimento das opções políticas de todos, hoje geralmente escondidas por simples hipocrisia. Aqui em Indaiatuba todos sabiam de qual candidato o outro gostava, impossível disfarçar. E Chico Preto era Zico roxo. Defendia sua posição política abertamente, com toda a sua garra. Diziam até que houve de sua parte e dos músicos da sua banda, alguns “atentados” contra o patrimônio de rivais políticos, inclusive um espanhol que teve seu automóvel chacoalhado por ser do lado politicamente contrário.

. Chico Preto foi casado com Olinda de Almeida e era pintor de parede. Em alguns carnavais eu o vi enrolando em uma bandeira do Brasil, talvez querendo demonstrar que os assuntos de nossa terra eram mesmo sua paixão.
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Com todo aquele seu jeito irreverente e popular creio que também foi ele que germinou as primeiras sementes das escolas de samba aqui em nossa cidade.

Mas esse outro capítulo sobre esse personagem da nossa história fica para outra pessoa contar... .



Foto de Chico Preto cedida por Cidália Bernardinetti
Originalmente publicada no grupo Dinossauros de Indaiá, de Patrick Ribeiro
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.[1] Texto escrito por Eliana Belo Silva, a quem a autora narrou os fatos. Publicado originalmente no livro "Um Olhar Sobre Indaituba -2", da Fundação Pró-Memória de Indaiatuba. [2] A cassação de Ivan Corrêa de Toledo foi feita pelo marechal Humberto de Alencar Castelo Branco, primeiro presidente do regime militar instaurado pelo golpe militar de 1964. [3] Atualmente o TSE – Tribunal Superior Eleitoral não permite a presença de bandas nos comícios. [4] Segundo o IBGE, Indaiatuba tinha 19.485 habitantes no censo demográfico de 1960.

4 comentários:

  1. Muito interessante esse olhar sobre a história política de Indaiatuba.

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  2. Legal este post.... trazendo para hoje, só a última eleição em Elias Fausto onde o petista Cyro da Silva Maia venceu por 34 votos de diferença o então prefeito Dude (PSDB), que vi um fato parecido

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  3. Parabéns pelo texto,as lembranças desta época difícil que a nossa familia passou por provocações, eram rojões que soltavam encima da casa de meus avós, palavrões...etc...etc.., todos sabem que foi uma eleição manipulada pelos comunistas...que saudades da integridade do meu avô, JOSÉ NARCISO MONTEIRO NETO..... Cléber Monteiro
    cleber.monteiro@bol.com.br

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  4. Eliana, parabéns pelo post, ilustra bem como eram as eleições daquele tempo; só uma correção: no início do texto quando diz que a bancada de vereadores era formada todinha por candidatos da oposição, na verdade eram 5 da oposição, 5 da situação e 1 do PSP que era o partido do terceiro candidato (Jacob Lyra), e que por coincidência era o meu irmão Júlio Carlos Stein, ainda bem jovem e que embora não tenha sido o mais votado, foi eleito presidente da Câmara, por motivos óbvios.

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