Pedro Gonçalves Meira
Reflexões sobre o "fundador oficial" de Indaiatuba
Eliana Belo Silva
Publicado originalmente no jornal TRIBUNA DE INDAIÁ
Até onde a documentação histórica conhecida até hoje nos aponta, foi o
latifundiário escravocrata Tenente Pedro Gonçalves Meira, dono da fazenda
açucareira Pau Preto, que idealizou, já em 1793, a construção de uma capela nos
limites de sua propriedade na paragem de “Indayatuva”, doando um pedaço
dessas suas terras ao padre Joaquim Gomes Escobar, para constituição de seu
patrimônio sacerdotal e também para que fosse capelão da então chamada Capela
de Nossa Senhora da Conceição; planejamento que não vingou, pois o padre
Escobar foi nomeado para a freguesia de Lages antes da viabilização.
Antes desse documento, conhece-se apenas um outro registro que cita
Indaiatuba, de 1768, uma lista militar de “Indaiatyba” feita pelo
governador da então província de São Paulo, que nos leva a concluir que havia
vários “fogos” no pequeno arraial, (onde havia morado certo José da Costa) caso
contrário, uma lista (mesmo que pequena) não seria viável. Indaiatuba era,
então, um bairro rural de Itu, que pela condição de acesso – cruzamento de rota
entre Itu e São Carlos (Campinas), tropeiros paravam para descansar e
provavelmente reabastecer - mesmo que de maneira rudimentar, uma vez que
o quadro urbano era de escassez para aglomerados urbanos até muito maiores do
que era a então também chamada Vila de Cocaes, nome advindo da abundância das
palmeiras de indaiá.
Certo Pedro
Gonçalves Meira foi registrado pelo cronista Francisco Nardy Filho que conta
ter sido este procurador da Câmara da então Villa de Ytu em 1740, tendo, neste
ano, solicitado uma casa para onde as vítimas de uma forte epidemia de bexiga
(muito comum na época) fossem isolados. Esse Pedro Gonçalves Meira é o mesmo
que fora casado com Maria de Godóy Simões e que tiveram o filho Jeronymo Gonçalves Meira
em 1692. Cerca de 100 anos separam esse primeiro do qual queremos referenciar
como "fundador oficial de Indaiatuba", o tenente Pedro Gonçalves Meira, que foi
batizado em 1743 e que se casou com Ana de Campos Penteado em 1776, irmão de
Joaquim Gonçalves Bicudo, que já havia casado com com Maria de Campos Penteado
em 1775 (dois irmãos casados com duas irmãs). O primeiro é avô do segundo. (Ver genealogia também aqui).
É provável que a fazenda Pau Preto do Tenente Pedro Gonçalves Meira
fizesse limites com esse arraial, que segundo a lenda, teria nascido de
dissidentes, ou melhor, sobreviventes do suposto povoado Votura, quase dizimado
por uma epidemia de varíola (que aguarda pesquisas arqueológicas para
comprovação de autenticidade), por sua vez fundado pelo lendário (pelo menos
até agora lendário) José da Costa às margens do Ribeirão Votura (ou ainda Córrego do Barnabé e por alguns também chamado de "Córrego do Caldeira") - nesses tempos remotos também
chamado de Ribeirão Indaiatuba.
Não se pode deixar de citar que, segundo fontes também documentadas, o
proprietário da Sesmaria de Cocaes, uma subdivisão da Capitania Hereditária de
São Vicente, era Joaquim Gonçalves Bicudo, irmão de Pedro Gonçalves Meira. O
filho dele, João de Campos Bicudo – procurado por inúmeros fazendeiros da época
pelas habilidades em agrimensura e mecânica, foi o responsável por fazer o
arruamento das ruas de Indaiatuba no entorno da capela que seu pai construíra,
a Capela de Cocaes. Por essa razão as ruas mais antigas de Indaiatuba
apresentam delineamento e larguras iguais: elas foram planejadas.
Voltando à lenda (talvez ainda lenda), essa capela teria sido inicialmente construída pelo até agora “mítico” José da Costa há tempos idos. Seguindo as pistas, nesta época Pedro Gonçalves morava em Campinas, de onde saiu desgostoso - após brigar com um padre por causa da construção do primeiro sobrado daquela cidade, ao lado da igreja - e veio morar em Indaiatuba, ocupando por aqui o “primeiro carro de passeio puxado a quatro burros”.
Voltando à lenda (talvez ainda lenda), essa capela teria sido inicialmente construída pelo até agora “mítico” José da Costa há tempos idos. Seguindo as pistas, nesta época Pedro Gonçalves morava em Campinas, de onde saiu desgostoso - após brigar com um padre por causa da construção do primeiro sobrado daquela cidade, ao lado da igreja - e veio morar em Indaiatuba, ocupando por aqui o “primeiro carro de passeio puxado a quatro burros”.
Sem tantas suposições e com mais certeza podemos afirmar que o tenente
Pedro Gonçalves Meira escolheu cuidar melhor da capela do arraial (construída
pelo até agora mítico José da Costa ou pelo seu irmão Joaquim ou pelos dois?)
com muitos propósitos, a começar pelo próprio local em que foi erigida. Em
primeiro lugar, reforcemos a afirmação que a ocupação do entorno da capela, surgiu antes
da instituição da capela pelo nível de sociabilidade, pelo movimento de
tropeiros, pelos povoadores já citados: um cruzamento de rotas, uma passagem
obrigatória onde, pelas condições de acesso, já existiam “fogos”.
Em 1792, pouco antes de Pedro Gonçalves planejar a doação de parte de seu
patrimônio para construir a capela para o padre Escobar (que aconteceu em 1793)
- havia sido aberta a primeira estrada provincial entre Itu e Campinas, ou
seja, embora outros caminhos houvessem, sob responsabilidade da Câmara
Municipal de Itu e mesmo dos fazendeiros - estradinhas particulares arranhando
suas propriedades para escoar suas produções - esse patrimônio público
demarcava a presença de uma nova realidade em um espaço onde até agora as
relações de poder eram demarcadas exclusivamente entre os latifundiários, sendo
ele um dos mais proeminentes deles.
Documentos da Cúria Metropolitana de Campinas pesquisados por Nilson
Cardoso de Carvalho contam o que fez o tenente Pedro Gonçalves Meira, ao
edificar (ou reformar?) e instituir e doar patrimônio para a capela onde hoje é
a Matriz Nossa Senhora da Candelária de Indaiatuba, no ponto mais alto da
paisagem da região: quis inserir ao então arraial - agora margeado por uma
estrada provincial, de acordo com as circunscrições eclesiásticas do período,
a categoria onde ele pudesse ser reconhecido como administrador/patrono ou
padroeiro do local - na categoria de arraial com capela curada.
Isso era muito comum no Brasil, desde o período Colonial até a Proclamação da República, onde o reconhecimento oficial de um povoado implicava a integração dos poderes do Estado e da Igreja: se existisse uma capela com um patrimônio, onde celebrações eram realizadas regularmente, este local era chamado Capela Curada ou Curato.
Se tomarmos como exemplo o que aconteceu em outros lugarejos, com o aumento da população no entorno de ‘sua’ capela curada seria, ele, o Tenente Pedro Gonçalves - quem pediria à Assembleia Provincial à instalação da Freguesia (na época, sinônimo de paróquia).
Isso era muito comum no Brasil, desde o período Colonial até a Proclamação da República, onde o reconhecimento oficial de um povoado implicava a integração dos poderes do Estado e da Igreja: se existisse uma capela com um patrimônio, onde celebrações eram realizadas regularmente, este local era chamado Capela Curada ou Curato.
Se tomarmos como exemplo o que aconteceu em outros lugarejos, com o aumento da população no entorno de ‘sua’ capela curada seria, ele, o Tenente Pedro Gonçalves - quem pediria à Assembleia Provincial à instalação da Freguesia (na época, sinônimo de paróquia).
O PRESTÍGIO DE UM TENENTE CURADOR DE UMA CAPELA
As capelas eram a materialização do poder e das riquezas dos Senhores e desde
os primeiros engenhos coloniais a presença de uma, nem se fosse um oratório,
era obrigatória. Como tantos outros Senhores, Pedro Gonçalves Meira empenhou-se
em erigir a capela e associar seu nome ao empreendimento. Como instituidor (e
sua família) ele seria reconhecido pelo Bispo e pela Coroa, obtendo vários
privilégios do padroado local, além do prestígio e posição de destaque
nos arredores. Por lei, ele teria o direito de controlar os rendimentos da
capela e, no caso de necessidade ou de pobreza (que ele mesmo avaliaria, nessa
tal qualidade de patrono) de fazer uso dos rendimentos da capela, servindo
esta, dessa maneira, de reserva material. Um capital simbólico também lhe foi
agregado: ele e sua família passariam a ter assentos especiais nos cultos e à
precedência em cerimônias e procissões e, quando mortos, teriam jazigos perpétuos na
capela.
Pedro Gonçalves Meira está sepultado na Matriz Nossa Senhora da
Candelária, como patrono da capela, foi honrado em vida e ganhou direito às preces rezadas em seu nome.
A então capela de Nossa Senhora da Candelária transformou-se em capela reconhecidamente curada e, portanto, em Freguesia, nodia 9 de dezembro de 1830. Ser uma freguesia significa que Indaiatuba passou a
ter uma paróquia, com um pároco residente. Na década de 1970, por uma
iniciativa do Rotary Clube de Indaiatuba, após um longo confronto, essa data do
“nascimento” da igreja Nossa Senhora da Candelária como “paróquia” foi
escolhida como sendo também o “nascimento” do aniversário de Indaiatuba.
Assim, principalmente por influência do pesquisador Nilson Cardoso de Carvalho, com base nos documentos até então por ele pesquisados e divulgados, Pedro Gonçalves Meira é o “fundador oficial de Indaiatuba” por ter doado o patrimônio que possibilitou que a capela fosse "curada|". Já José da Costa e Joaquim Gonçalves Bicudo, por hora, aguardam mais estudos para ganharem mais visibilidade nessa história, ou perderem de uma vez por todas.
Assim, principalmente por influência do pesquisador Nilson Cardoso de Carvalho, com base nos documentos até então por ele pesquisados e divulgados, Pedro Gonçalves Meira é o “fundador oficial de Indaiatuba” por ter doado o patrimônio que possibilitou que a capela fosse "curada|". Já José da Costa e Joaquim Gonçalves Bicudo, por hora, aguardam mais estudos para ganharem mais visibilidade nessa história, ou perderem de uma vez por todas.
Afinal, a
História é de quem se apropria dela.
Allmanach Literário Paulista (1875 a 1884):
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Correio de São Paulo, 16 de abril de 1937:
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