Fernando Stein
Indaiatuba não é conservadora e nem tem vocação para manter
os móveis, imóveis e objetos que marcaram os acontecimentos mais expressivos.
Por uma razão muito simples: as ondas migratórias dominaram
a cidade e ela passou a abraçar o presente com vigor, com os olhos voltados
para o futuro, sem referências no passado.
Basta olharmos um pouco para trás, no seu passado escasso e
escondido, para percebermos que dele pouco restou
.
As sedes que a administração municipal já teve, por
exemplo, onde as questões sobre o destino da cidade foram discutidas e
decididas, desaparecem sem deixar vestígio.
Com a criação da cidade de Indaiatuba pela Lei Paulista nº
12 de 24 de março de 1859, e a eleição dos primeiros vereadores, a Câmara Municipal
de Indaiatuba sentiu necessidade de ter a sua sede própria para as reuniões dos
representantes da nova unidade urbana. Não convinha mais se reunirem nas casas
dos próprios vereadores.
Em 1869 a
Câmara Municipal (que também desempenhava as funções executivas) comprou
finalmente um prédio na rua Pedro de Toledo para sua sede, e ali passou a
funcionar. O prédio ficava à esquerda de quem sobe a rua Pedro de Toledo, entre
as ruas Augusto de Oliveira Camargo e Sete de Setembro.
Mas esse primeiro prédio que abrigou a Câmara Municipal foi
demolido; no local, hoje (1) só existe um grande terreno baldio,
onde se preparam os alicerces para a construção de um prédio de apartamentos,
não restando nenhum vestígio do passado.
No início do século passado, já na República, a Intendência
(que desempenhava as funções executivas na administração da cidade) passou em
novo prédio construído no centro da Praça Prudente de Morais. Ali funcionava
também a Câmara de Vereadores e a Cadeia Pública.
Antigo prédio da Câmara (na frente) e Cadeia (no fundo)
Mas esse prédio, de uma arquitetura singular, também foi
demolido, em 1963, pelo próprio prefeito municipal da época. No seu lugar, uma
daquelas decantadas “fontes luminosas”, inutilidades de época, que brotaram nas
praças centrais de tantas cidade interioranas.
Assim, a Administração e a Câmara Municipal foram
transferidas provisoriamente para um salão alugado, localizado na rua
Bernardino de Campos, entre as ruas Candelária e Pedro Gonçalves, e ali
funcionaram pouco mais de três anos.
Mas esse imóvel também foi demolido. Foi demolido e reconstruído,
recebendo o nº 360, ao lado do Clube 9 de Julho.
A prefeitura e a Câmara Municipal passaram a funcionar na praça Prudente de Morais, nº 155, em prédio inaugurado em 17 de dezembro de 1966, na esquina da rua Cerqueira César com a rua 15 de Novembro.
Passaram-se 36 anos! Inúmeros prefeitos ali cumpriram seus
mandatos, nesse período.
Mas nada é pra sempre!
O prédio tornou-se obsoleto em meio à fúria progressista,
ao desenvolvimento urbano acelerado, às modernas exigências de um novo tempo.
E Prefeitura e Câmara se mudam novamente, em épocas
diferentes. E a velha “Brasilinha”, como então era conhecida por alguns,
não foi ao chão, mas foi completamente desfigurada por reformas radicais, em
2003, para ceder lugar à avalanche comercial que dominou o centro urbano. Hoje
não passa de uma vistosa sapataria, sob nº 837.
36 anos! Passei-os todos lá, subindo diariamente aquela
escadaria estreita que ligava o pavimento térreo ao superior, com seus degraus
e seu guarda-corpo revestidos de granilite.
Vi-me obrigado a, de saída, organizar, em poucos meses, uma
biblioteca pública, sem nunca ter me preparado para essa tarefa.
Depois, quantos projetos! Quantos sonhos e deveres
administrados por mais de três décadas, em meio a uma burocracia incipiente que
foi se alastrando.
Mas nada é pra sempre!
O que sobrou?
O que ficou?
Alguém se lembra?
Quase tudo se transformou em fumaça, que aos poucos se
esvaziou da mente de todos, e periclitou na minha memória.
Quase tudo foi varrido pela ânsia do futuro, pelas novas
ondas presente.
Bem visível mesmo, restou o cálice gigante e altaneiro da
Vila Avaí (2), no ponto mais alto da cidade.
O novo paço, plantado no outro lado do córrego do Barnabé,
também terá seu tempo. Muito longo, com certeza, mas seus dias também estão
contados, porque nada é pra sempre!
Os próprios administradores do Município sempre se esforçam
no sentido de apagar as pegadas de seus antecessores, na tentativa de realçar
os seus próprios feitos.
O resgate do passado, por tudo isso, é uma tarefa hercúlea
e inglória. É como a garimpagem de uma mina exaurida.
Porque a cultura que predomina nesta urbe não tem qualquer
parentesco com as lições do passado, e poucos, muito poucos se interessam em
preservar os vestígios de ontem, pois a grande maioria abdicou de seu passado e
veio para cá fazer futuro.
Por isso mesmo temos uma comunidade sem marcos, sem
memória, sem raízes, onde ninguém conhece, pois somos como uma correnteza que
segue sempre em frente, onde quase não há espaço nem tempo para evocação das
tradições de outras épocas.
Tudo porque, na nossa realidade, vale relembrar: nada é pra
sempre!
1. Este texto foi escrito em 2006.
2. O autor refere-se ao Reservatório Elevado da Vila Avaí,
que abastece a Zona Norte do município, com captação de água do Rio
Capivari-Mirim, Represa Cupini e Represa Morungaba, sob operação do SAAE –
Serviço Autônomo de Água e Esgotos de Indaiatuba.
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